Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Foi há um ano! Em Setembro de 2006-1ª parte

* Pacto na Justiça

Um ano volvido: Setembro foi o ano das grandes novidades.
A primeira a do «Pacto para a Justiça», assinado pelos líderes parlamentares dos partidos que costumam ser Governo. Um dos jornais enganou-se e em vez de Marques Guedes chamou-lhe Nobre Guedes. Depois foi o anúncio da alteração do Código Penal, do Código de Processo Penal e do Regime Prisional e mais o etc..
Um ano depois, continuamos a aguardar a publicação de muito disso na folha oficial. O que era urgente tornou-se ronçeiro. Para quem quer aceleração na Justiça, o exemplo não é brilhante. Mas na altura era a «Primavera na Justiça a florir n'O Inverno do Nosso Descontentamento», como com humor anotou uma «bloguista» compulsiva.
Tratando-se de um «acordo secreto», Patrícia Agostinho diria mais tarde, com risonha inteligência, no blog «Sine Die» que «o "pecado original" deste pacto é a sua restrição ao "bloco central". Vício que poderá ainda ser suprido. Veremos qual a flexibilidade dos pactuantes. Há que "ouvir" os outros partidos e também os "parceiros sociais" (chamemos-lhe assim)». Pois, Patrícia, não é um vício, é um verdadeiro «círculo vicioso».
Coutinho Ribeiro, no «Incursões», justificava, aplaudindo o pacto como ideia que já fora sua: «a prática tem demonstrado que quando um dos dois maiores partidos está no governo tende a fazer precisamente o contrário do que diz quando está na oposição. E o que fica na oposição tende a dizer tudo o que possa contrariar quem está no governo, mesmo que seja o contrário do que defendia quando estava no governo». Assim, concluo eu, ante tal posição, o acordo seria a tradução desta ideia: cada partido passa a concordar com o que discordaria. É como na aritmética: dois menos dão mais.
Desconfiada, a activista «Kamikaze», também no «Incursões», avisava os «patos» quanto ao pacto. Era só um boneco. Mas uma imagem vale mais do que mil palavras.
Feito sem consulta sequer às profissões jurídicas, o pacto marcou o início da guerra do sistema político contra o que passou a ser denominado como «as corporações». Vital Moreira, um convertido, escrevia, aplaudindo de pé: «este acordo é um compromisso entre partidos, e não um pacto misto entre Estado e as profissões jurídicas, como muitos propunham, numa promiscuidade negocial que só podia reverter em favor das segundas. Pelo contrário: como disse um dos protagonistas, este acordo é o triunfo do Estado sobre as corporações».
«Agora, primeiro assina-se e depois é que se discute?», perguntava-se Maria de Fátima Mata-Mouros, no então ainda sobrevivente «Dizpositivo», que tantas saudades deixou. «Abraçemo-nos pactuosamente», ironizava L. C., no «Grano Salis», ilustrando a graça com uma imagem de Daumier, aquele cujas gravuras sobre «Les Gens de la Justice» são decoração barata de escritórios de advogados, à antiga.

Obras pias: entretanto, num momento de distração, «o ministro da Justiça, Alberto Costa, reconheceu ontem ao DN que grande parte da reforma do sistema judicial ontem acordada entre o PS e o PSD foi guiada pela experiência de um caso judicial concreto. Por sinal, um processo que envolveu a cúpula do PS - o então líder, Ferro Rodrigues, e o seu número dois, Paulo Pedroso, que chegou a estar quatro meses em prisão preventiva - ou seja, o processo Casa Pia», informou, não vá a coisa não se ter percebido, o circunspecto Diário de Notícias, a 10. Mas alguém duvidava?

É preciso que alguma coisa mude: o novo regime processual penal, o Código Penal, alteração do mapa judiciário, tabela de custas e uma nova lei de execução de penas são peças do acordo político parlamentar que Governo e PSD assumiram para a tão falada e pedida reforma da Justiça, informou, entrementes, o «Diário Económico», a 8. «A lei de execução de penas está a ser feita com base no estudo de Freitas do Amaral feito para o Governo PSD/CDS», esclarece fonte governamental, fazendo desconfiar sobre se mudança não é a evolução na continuidade.

Afirma Pedro: a «assim chamada affirmative action, que é apanágio do pensamento politicamente correcto, é concretizada, aqui, pelo meio mais agressivo que a comunidade político-juridicamente organizada conhece: a criminalização (ou alargamento de criminalizações preexistentes, tanto monta) das condutas que na visão monolítica dos designados (pelos estudiosos da política criminal) “gestores atípicos da moral colectiva” (ecologistas, feministas, homossexuais, pacifistas, de entre outros) são susceptíveis de constituir entrave ao programa ideológico que estabeleceram para todos nós», escreveu, a 5, no blog «Sine Die», Pedro Soares de Albergaria sobre as medidas de alteração ao Código Penal. Livra, que quem assim fala não é gago!

*Férias

A paragem: o ano abriu com o ministro Alberto Costa a declarar enfaticamente que «milhares de diligências judiciais e julgamentos vão ter lugar» num período que, no passado e durante décadas, era de «paragem» dos tribunais».
Eis-nos agora nessas férias, e cá estamos para ver as milhares de diligências e julgamentos a ter lugar.
O que ouvi dizer é que logo a partir de meados de Julho já não foi possível formar colectivos em muitos tribunais e por aí vamos em diante, em Agosto e depois disso. Devo estar mal informado pela certa.
Na altura já o o presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais (SFJ), Fernando Jorge, afirmou que, «apesar do encurtamento das férias judiciais, já deu para perceber que nos últimos 15 dias de Julho «praticamente não se realizaram julgamentos» nos tribunais. Devia estar mal informado também.

* Processo penal

E já vão quinze: «o Conselho de Ministros reunido a 07 de Setembro de 2006 aprovou a Proposta de Lei que procede à décima quinta alteração ao Código Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro».
Vinte anos, quinze reformas, quase uma por ano. O carro pode não andar, mas não é à falta de oficina!

* Advocacia

Parecer bem, saber melhor: o mês fechava com uma notícia publicada no Correio da Manhã: «Os ministérios da Administração Interna (MAI), da Justiça e da Defesa são os ‘campeões’ governamentais das dotações orçamentais para a realização de “estudos, pareceres, projectos e consultadoria” e “outros trabalhos especializados”, rubricas que permitem recorrer aos serviços externos de empresas e escritórios de advogados. Em conjunto, as equipas de António Costa, Alberto Costa e Nuno Severiano Teixeira têm 1,8 milhões de euros, verba que representa 41 por cento de um total de quase 4,4 milhões de euros atribuídos aos 16 ministérios e gabinete do primeiro-ministro em 2006». O mercado jurídico funciona, os números mostram, o «outsorcing» legitimava esta privatização parcerística, mau grado os auditores, os assessores, os adjuntos e os consultores do Governo.

Advogados solitários: em artigo publicado no «Diário de Notícias», edição do dia 3, João Pereira da Rosa, de quem na altura se falava para Bastonário, rebatia a opinião de Lacerda Machado, que trabalhara no Ministério da Justiça, quando este defendia um sindicato, para a "categoria dos solitários". Espécie de agremiação dos ensimesmados, felizmente a ideia não vingou. É que a solidão é uma coisa muito triste.

O assessor jurídico: No dia 6 a imprensa informava que «o assessor jurídico da Casa Civil de Jorge Sampaio admite uma eventual candidatura a bastonário para o próximo triénio, mas ressalva “que ainda é prematuro falar nisso”». Com o colega de escritório ainda no topo do poder, era prematuro de facto. A prudência manda que se dê tempo ao tempo. Magalhães e Silva esperou.

Acesso ao Direito: ao resumir as mudanças na lei sobre o acesso ao Direito, a Ordem dos Advogados explica que ela prevê a «possibilidade de nomeação para lotes de processos de geometria variável com preços pré-determinados». No sistema de geometria não-euclidiana, a menor distância entre dois pontos é uma curva. O país forense desconfiou que, ante esta conversa, estivesse a ser levado numa.
* STJ

Pompa e circunstância: o Supremo, saindo do seu cinzentismo conformista, abriu as hostilidades com o poder Executivo, através das palavras de Nunes da Cruz, o seu Presidente: «sempre disse com frontalidade que o Supremo não pode ser uma reforma para políticos em fim de carreira”».
A frase era pomposa. Meses depois a pompa andava sob investigação. Um embaraço.

* Conselho Superior das Magistratura

Les uns et les autres: em artigo não assinado, o Diário de Notícias escrevia a 4, a 24 dias das eleições, que «As divisões entre os juízes vão revelar-se. Não são partidárias, nem filosóficas, nem religiosas. Mas, sim, entre apoiantes de Noronha Nascimento e os outros». Perderam «os outros». É a vida!

* Carreiras judiciárias

O medo dos planadores:
Os juízes, pela voz de António Martins, da Associação Sindical dos Juízes, tornaram público a 5 que «temem que os tribunais superiores passem para as mãos de juristas de mérito e de professores universitários se o Governo introduzir o chamado princípio da carreira plana». Penso que o Governo, ante isso, arrendondou o sistema. Os juristas que não são de mérito tiveram o seu lugar salvo.

Juízes a concurso: «a obrigação de os juízes fazerem provas públicas para o acesso aos tribunais superiores», eis o que o Governo anunciou, a 8, ir fazer constar do novo Estatuto Judiciário. A ver vamos como!

Falta de júbilo na jubilação: dizia o Diário de Notícias, a 10: «a partir de Março de 2007, os magistrados judiciais e do Ministério Público vão ver as suas pensões reduzidas, além de perderem o direito ao subsídio de habitação de 700 euros e o acesso gratuito aos transportes públicos quando passarem à jubilação ou à aposentação». A magistratura nesta altura temia o pior dos políticos! Mas o reverso da medalha estaria para vir...

* Penas alternativas

Calças criminosas: a Lusa informava o mundo lusófono que «o rei Bingo Bingo, a autoridade tradicional da região do Cuito Cuanavale, no leste de Angola, proibiu as mulheres de usarem calças, sob pena de pagarem uma multa de dois cabritos ou 10 mil cuanzas (cerca de 100 euros)».
Rui Pereira não terá reparado na ideia. Nos crimes económicos era a solucção: quem cabritos vende cabras não tem, Bingo!...

* Eficácia das leis

Direito acelerativo: a Agência Finanaceira dava conta que «o Governo tem como meta reduzir as velocidades praticadas nas auto-estradas dos actuais 120 para 118 quilómetros/hora». Vê-se. Basta dar uma voltinha por aí. Meses depois um ministro era filado na brasa. Safou-se nem sei como.

* Sistema prisional

Reformar debalde: logo no dia 1, o Diário Ecomómico dava conta que «no final de 2007, prevê-se que o balde higiénico estará completamente erradicado dos 55 estabelecimentos prisionais portugueses, em consequência do plano de intervenção lançado e actualmente em curso». Atenção às agendas das redacções, pois. Urge verificar se em vez do balde não se abriu um buraco na latrina.

* Acção executiva

A maquilhagem necrológica: com o seu estilo irónico e sorridente, Rogério Alves explicou a quem não tinha ainda percebido que um dos objectivos do Governo era «a reforma da acção executiva, "moribunda"».
Tal como na série «Sete Palmos de Terra», se o morto está desfeito, reconstrói-se e maquilha-se. Enterrado com olheiras é que não!