Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




A fortaleza da reformatio in pejus

Estabelece o artigo 409º do CPP: «Interposto recurso de decisão final somente pelo arguido, pelo Ministério Público, no exclusivo interesse daquele, ou pelo arguido e pelo Ministério Público no exclusivo interesse do primeiro, o tribunal superior não pode modificar, na sua espécie ou medida, as sanções constantes da decisão recorrida, em prejuízo de qualquer dos arguidos, ainda que não recorrentes». É o que se chama o princípio da reformatio in peius, a proibição, aliás constitucional, de agravamento por via do recurso, a fortaleza dos direitos fundamentais do arguido. O problema são os limites das muralhas.
A questão que se colocou consiste em saber se esse regime se aplica para os casos em que se opera novo julgamento por via da devolução pelo tribunal de recurso para novo julgamento no quadro de um reenvio. 
O Supremo Tribunal de Justiça já havia definido que sim. Outras instâncias haviam-no seguido. 
Ora é esta a doutrina sufragada pelo Tribunal da Relação de Lisboa no seu Acórdão de 21.12.12 [relator João Carrola, texto completo aqui]. Reconhece tal decisão que «o texto citado parece inculcar a ideia que a aplicação deste principio se encontra reservada para o tribunal superior aquando da apreciação de recurso ou recursos interpostos por e no interesse do arguido». 
Mas, louvando-se no que fora enunciado pela Relação do Porto, num seu Acórdão de 14.10.09, considera, citando: «A proibição da reformatio in pejus não é absoluta, mas consagra tanto a decisão do tribunal de recurso como a que venha a ser proferida em novo julgamento determinado por anterior decisão que reenvia o processo para novo julgamento. Tal entendimento, digamos assim, mais lato que o que aparentemente resulta da letra da lei (artº 409º do CPP), da lei, encontra-se devidamente desenvolvido e fundamentado de forma clara e cristalina no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 236/2007 [...]o qual, (…), sufragamos, destacando aqui, apenas este pequeno passo: “Na verdade é igualmente inibidora do exercício do direito de recurso a possibilidade de, embora por via indirecta (na sequência de anulação do primeiro julgamento), o arguido, em situações em que é o único recorrente (ou na situação equiparada de o Ministério Público interpor recurso no exclusivo interesse da defesa), ver, a final, a sua posição agravada com uma condenação mais pesada do que a inicialmente infligida, apesar de o Ministério Público se haver conformado com esta”».

Aliás, e assim se escreve neste aresto «como já se referia no acórdão do STJ de 27-11-2003 proferido no P.º 03P3393, em que foi relator o Exmo. Juiz Conselheiro Simas Santos [...]“(…) vem entendendo recentemente este mesmo Tribunal (cfr. Jorge Dias Duarte, Proibição de reformatio in pejus. Consequências processuais, Maia Jurídica, ano I, nº. 2 págs. 205-220), decorre do princípio da proibição da reformatio in pejus que, se em recurso só trazido pelo arguido, for ordenada a devolução do processo, não poderá a instância vir a condenar o recorrente em pena mais grave do que a infligida anteriormente».

E mais, como também se cita no mesmo: «O recurso estabelece, assim, um limite à actividade jurisdicional, constituído pelos termos e pela medida da condenação do arguido (único) recorrente, mesmo se o arguido tenha pedido no recurso a anulação do julgamento ou o reenvio para outro tribunal, por se postularem as mesmas razões, sendo que a solução contrária se traduziria em atribuir ao tribunal do reenvio (ou do novo julgamento ou da devolução) poderes que não estavam cometidos ao tribunal de recurso (cfr. neste sentido o voto de vencido do Conselheiro Henriques Gaspar, no Ac. de 9.4.03, proc. nº. 4628/03-3 e os Acs. de 29.4.03, proc nº. 768/03-5 , relatado pelo Conselheiro Carmona da Mota e de 8.7.2003, proc. nº. 2616/03-5, do mesmo Relator)».

P. S. Questão problemática que não vejo considerada no aresto em causa: e se tiver lugar o reenvio total? Fica delimitada a liberdade de julgar do novo tribunal? Ou prevalece a tese de objecto delimitado? Será um novo caso ou um aperfeiçoamento do caso pré-existente.