Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




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As virtudes e os pecados da contra-instância

 
É uma arte a do cross-examination, o contra-interrogatório ou a contra-instância. Através dela aprende-se a virtude do contraditório, a demonstração de que nos aproximamos tanto mais da verdade quanto se garanta o direito de réplica, uma das vertentes do contraditório.
Quem teve experiência de vida forense sabe que é assim, aquele para quem a Justiça é uma função pública para o preenchimento de formulários rotineiros de acção, duvida, é claro, que não se esteja a perder tempo numa maçadoria. Ademais, há aqueles que pensam que o depoimento credível é só aquele que foi prestado ante si, e nem se dignam ouvir as respostas dadas a outros, a juntar àqueles que treplicam sempre ante o fruto das réplicas que alteraram o sentido obtido pela primitiva instância, os que teimam sempre em inutilizar a verdade que não lhes convém à tranquilidade do adquirido.
Vale por isso a pena passar os olhos por este artigo aqui. Escrito a pensar em advogados e a tentar poupá-los a tristes figuras no foro como se denota por esta máxima: «Nunca faça uma pergunta cuja resposta você não saiba com antecedência». Mas há para todos. São coisas simples, mas a vida é a complexidade de muitas coisas simples.

O contraditório, essa formalidade

Um destes dias explicava a um leigo a importância do princípio do contraditório no processo penal como tradutora de uma regra de civilidade e de respeito pelo outro. Vi-o hoje louvavelmente expresso num dos últimos acórdãos que a Relação de Lisboa proferiu antes das férias judiciais. Vou citar-lhe o sumário. [Foi proferido no processo n.º 2914/10.0TXLSB, relator João Lee Ferreira]:

«I. A particular relevância da decisão judicial de revogação do regime de cumprimento em dias livres da pena de prisão aplicada ao arguido e as previsíveis consequências dessa apreciação de incumprimento, impõe uma interpretação normativa do artº 125º do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade que pressuponha, necessariamente, a participação eficaz, directa e presencial do condenado.
«II. Nessa medida, torna-se indispensável que ao condenado e defensor seja facultada a possibilidade de exposição dos argumentos e de comprovação dos motivos de eventual justificação de faltas, em diligência presencia perante o juiz do Tribunal de Execução das Penas (cfr. artº176º, aplicável ex vi do artº234º do CEPMPL)
«III. No caso, esse direito à audiência foi preterido atendendo a que, antes da prolação da decisão, não se deu possibilidade ao defensor de apresentar os meios de defesa, nem se viabilizou a realização de uma audição presencial do condenado. A preterição do mencionado direito à audiência integra a nulidade insanável prevista no artº 119º, al.c) do CPP».

Ante a minha explicação sobre o essencial do contraditório e da audiência prévia dos arguidos em relação às decisões que lhe dizem respeito e o afectam, o meu interlocutor, leigo nas coisas do Direito, atirou-me com esta que deixa uma pessoa de rastos: «mas que interessa que o juiz tenha de ouvir o arguido se depois decide como quiser? Não é uma perda de tempo?». Com cidadãos destes, a Constituição é puro papel de embrulho: são um perigo permanente para as liberdades públicas.