Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Advogados, oferecem-se

«Por cada consulta são devidos honorários no valor de € 20,00, com IVA incluído, a pagar, antes do envio da resposta, por cheque, transferência bancária ou paypal». São advogados a oferecerem os seus serviços através da Internet. Uns entre tantos!
Li isto, casualmente esta manhã. Não mais eu me queixarei de ter muito trabalho. Passarei a ter vergonha de o ter, quando tantos o procuram! A proletarização da advocacia é isto mesmo. Como se chegou aqui e como se sairá daqui? Não sei. Não há pior inimigo dos operários sindicalizados, do que os trabalhadores no desemprego. O primeiro demagogo vendedor se sonhos ou a primeira organização de associados, prometedora de ilusões, leva-os atrás.
Um dia a Ordem, essa máquina de cobrar dinheiro e de o fazer gastar consigo, acorda como se acordou no Palácio de Versailles, no dia em que se tomou a Bastilha.

Diz negativo

Quando eu comecei na Advocacia ainda havia papel selado. Cada petição obrigava a uma folha para o tribunal, uma para cada uma das partes que não vivesse em economia comum, mais uma folha de papel almaço, para a reforma dos autos e mais uma cópia em papel comum ou de seda, para o nosso arquivo.
As cópias eram tiradas a papel químico, que sujava as mãos.
A cada documento junto tinha que se colar um selo fiscal.
Alguns afortunados tinham telex. O fax nem se sonhava com ele. As fotocopiadoaras eram um pesadelo
Cada engano, cada troca de letra, cada gralha obrigava a apagar com borracha cada uma das folhas.
Nessa altura eu tinha tempo para trabalhar, para estudar Direito, para ler e para ter vida privada.
Hoje que tenho todo o mundo teconólogico ao meu dispor, estou cada vez mais um animal de carga, sem tempo para nada, nem para vir aqui com regularidade.
Qualquer coisa está profundamente errada nisto tudo. É um mundo sem emenda, o meu ou aquele em que vivo.
Só hoje dei conta de que o «dizpositivo» tinha acabado! Fiquei envergonhado, como quem sabe da morte de um amigo por acaso.

Anémico de optimismo

Acossado de trabalho, a ponto de já nem restar tempo sequer para o mínimo descanso, não tenho escrito, nem lido. Ainda por cima ando agora à mercê de insultos anónimos.
Um antigo aluno meu publicou um livro chamado e cito de memória «Cartas a um jovem Advogado». São conselhos. Se eu me desse para uma tal coisa, o livro teria uma só linha: «não venham para esta profissão». Acrescentaria, talvez, mais uma vírgula e um «salvo se quiserem passar uma vida a sofrer».
Tudo isto radica em duas coisas.
Primeiro, na realidade do vivido, que nada tem a ver com o mito do carro do triunfo, os louros da vitória, a conucópia da riqueza com que muitos fantasiam os advogados, se não a mim próprio.
Segundo, no desejo do viver, que a escravidão da profissão impede, bestializando-nos aos prazos, ao receio de errar, às consequências e incompreensão quanto ao que fazemos.
Claro que eu não vim aqui falar do que fiz da minha vida nem do que ela é. Prezo demais a minha privacidade e a dos meus, para me vir expor em trajes menores, até para não desiludir os que me julgam um advogado aliciantemente feliz.
Vim aqui apenas falar da vida que gostava de viver. Mas isso, o que poderia ter sido, foi tudo há muitos, muitos anos, quando, a gatinhar na comarca de Sintra, ainda podia escolher.
Hoje, agrilhoado a deveres e anémico de optimismo, resta-me esperar que aconteça qualquer coisa inesperada que interrompa este ciclo infernal. Os advogados costumam ter essa sorte. Deus tem pena das duas almas perdidas e faz-lhes o favor de os despachar para o inferno, de repente!

O gaginho de dentro do sistema

Este é o nível a que andamos em matéria de comentários a blogs:
«Ó senhorito Josézinho Antoninho Barreirinhos:Nós já sabemos da tua ética (muito apreciada pelos teus fãs - gajas, na maioria, não?) porque também sabemos que tu és um gajinho de "dentro" do sistema que, ainda que os "magistrados" façam as maiores tropelias, tu não te opões (a não ser com humor refinado - e que se "lixe" o cliente!) e vá de fazer mais um requerimentozinho (mais 200 contitos, não?)para "argumentar" que a tropelia do tal de "magistrado" é legítima mas não legal (tu lá sabes dessas coisas desde que despediste o Alberto Costa em Macau, tu, armado em "honesto" e "imparcial" - e que o governador anulou - mas manteve - e que o Tribunal Administrativo anulou, de vez, mas que tu, contumaz, nunca aceitaste).».
Lendo o que nele se diz, adivinha-se de onde vem. Com um pouco mais de esforço e algum saber, consegue-se uma certeza.

O ollho da rua

Eu tenho dois princípios éticos, a que espero não ter falhado nunca.
Primeiro, assinar todos os blogs que mantenho, ainda que alguns tenham cunho mais íntimo.
Segundo, nunca usar este blog ou qualquer outro para falar de processos ou casos em que esteja envolvido como advogado, que o sou e com muita honra e alguma mágoa.
Um anónimo resolveu afixar aqui um texto firmado por um jornalista que está a ser inquirido como testemunha num processo em que tenho intervenção e no qual se pronuncia sobre esse processo, sobre a sua prestação e sobre a minha pessoa.
É evidente o que vai acontecer: vou pura e simplesmente apagar esse texto. Quem estiver interessado em lê-lo, vá onde ele está. Aqui não!
Este blog é a minha casa e ainda sou dos que não hesistam em em pegar pelo braço e pôr na rua quem não quero que a frequente.

Ainda o Vice-PGR, já sem ironia nem sumo de limão

Porque o blog «Câmara Corporativa» teve a gentileza de citar o meu post sobre o Vice-PGR, fazendo-me pensar sobre o que contestam ser a minha interpretação da lei, deixei lá um pequeno comentário complementar, que, passe a imodéstia, aqui deixo anotado. Fica dito que isso «não tem a ver com o Dr. Gomes Dias, pessoa que mal conheço. Tem a ver sim que o evitar o vexame de o titular de um cargo tão fundamental como o de Vice-PGR não passar à primeira nem à segunda e só conseguir chegar ao lugar por prescrição aquisitiva, começando logo diminuído com isso».

A nomeação do Vice

Sobre a nomeação do Vice-PGR, por se tratar de um problema de cidadania, escrevi isto aqui, revoltado.

O candidato que nunca o foi

Confesso que me sinto um pouco ridículo a escrever isto, mas tornou-se necessário, ante o que vejo estar a suceder. Meus queridos Colegas de profissão, fica escrito, e não se volta ao assunto: eu não sou candidato a lugar algum na Ordem dos Advogados. Farão o favor de compreender que nem tenha de explicar porquê. Aí sim, passaria do ridículo ao absurdo, como se me levasse tão a sério e me desse tanta importância, que tivesse de me explicar e aos outros para nos convencermos todos do que não há nem é. Aliás, não sou candidato a nada que tenha a ver com poder ou mandar; pois se até já me custa ter de obedecer!

Acorda-se na corrida!

Hoje acordei com um jornal a dizer que havia um movimento «transversal» nos meios jurídicos para eu me candidatar a Bastonário da Ordem dos Advogados. Claro que a sorte dos meus colegas me preocupa e a degradação estatutária da Advocacia me confrange. Mas que eu, esgotado pelos deveres da profissão, mais apto a movimentos horizontais de ferrar a dormir, se pudesse, me sinto um pouco surpreendido com estas transversalidades, e com elas confuso, isso é um facto tão certo quanto acabarem hoje dois prazos, eu ter pela frente três reuniões e, milagre!, não ter de estar todo o dia em tribunal! E, além disso, num mundo em que tudo parece político e todos andam interessados pela política, que faz o meu nome, eu que nada represento e nem por interesse me movo? Podem os meus amigos explicar-me? Se não for directamente, aceito que seja transversalmente.

O homem que não se consegue enforcar

Há uma velha lei, que penso virá dos tempos da pirataria, de que um homem que não se consiga enforcar à terceira tem que ser liberto. Hei-de atentar ver isso melhor, para descobrir se o objectivo de um tal princípio é poupar o carrasco à vergonha da inépcia ou o executado ao opróbio de nem a morte o querer.

A ratoeira

A propósito de um comentário meu sobre um texto de Paulo Dá Mesquita, em que vinha à colacção o problema das injunções na suspensão provisória do processo, surgiu-me a necessidade de colocar aqui uma questão.
Tenho visto e haverá mais quem tenha, que o Ministério Público, antes de levar o processo ao juiz, para ele concordar ou não com a suspensão, impõe ao arguido que faça a prova do cumprimento da injunção proposta, nomeadamente se pecuniária. Eu sei que o sistema da lei não é este. Mas sei também que há dois fenómenos que tornam esta prática possível:
- primeiro, o estar o arguido e o seu defensor na pressuposição da boa-fé geral do sistema e dos seus agentes e de que, ao sacrifício patrimonial efectivo que um procurador lhe exige corresponde um acto de corroboração judicial;
- segundo, que no tenso ambiente do "pegar ou largar" em que o arguido se encontra, entre o risco de se ver acusado e o risco de vir a ser ludibriado, desconsidera o segundo com medo do primeiro.
O resultado percebe-se: basta o juiz não concordar com a suspensão e o arguido não só não beneficia dela, como ainda é acusado e terá que passar pela vergonha de andar a pedir que lhe devolvam, muitas vezes a instituições de caridade, aquilo que lhes doou.

A política dos montes

Li com grave preocupação o «esboço», ou lá o que seja, da futura Lei de Política Criminal. E curiosamente um pequeno pormenor chamou-me a atenção, o vir nela, entre as prioridades, a «mutilação genital feminina».
Claro que toda a gente sabe que um crime desses é praticamente inexistente no nosso país.Por isso, ao vir entre as prioridades da política criminal, surgem-me três perguntas.
Primeira: será que se não houvese uma lei destas, a haver um caso de mutilação genital feminina, não seria investigado com prioridade?
Segunda: será que na óptica do Governo os procuradores são uns mandaretes acéfalos, a tal ponto que será preciso impôr-lhes por lei que investiguem uma enormidade destas que, de outra forma, ficava no armário?
Terceira: será que realmente, a partir desta lei, nas procuradorias vão passar a fazer-se montes e montinhos de processos, em cumprimento da lei da política criminal, sendo uns os processos de primeira, outros os de segundo, os últimos os do quando calhar?
Será que toda esta estupidez se fica a dever a eu ser de facto muito estúpido? Talvez. Mas lá que de ora em diante vai haver quem fique para as «sobras», isso eu já perecebi, ao ler isto aqui.

Esboçando um sorriso

Tive na faculdade um amigo que era cego, de uma inteligência superior, que estudava a partir da gravação das aulas, na altura ainda com um enorme gravador de bobinas. Estudávamos juntos algumas vezes. Ele pedia-me para abrir o Código Civil num artigo determinado e dando indicações de mais para a frente mais para trás, lá chegava sempre ao preceito certo e aplicável. Sempre me surpreendeu a sua memória não diria fotográfica, pois vivia em eterna câmara escura. Um dia, estudávamos nós «Finanças Públicas», cadeira do lendário professor Pedro Mário Soares Martinez quando ele soube por mim que havia um livro que fazia falta, um fascículo editado pela «Ciência e Técnica Fiscal», chamado «Esboço de uma Teoria das Despesas Públicas». Vai daí pede-me que telefone para casa e fale com um irmãozito mais novo para que ele escrevesse num papel o nome do livro e passasse depois por uma livraria da Baixa a comprar. Risota foi quando o papel foi lido pelos da casa: «Geboço da uma Teoria das Despesas Públicas». Tal qual. Lembrei-me desta a propósito do que li aqui. Depois falo disto mais a sério. Agora não. Dormi oito horas até o dia me parece sorrir.

Vestido para matar

Porque hei-de eu andar de incómodo fatinho a amarrotar-se-me após tantas horas de sentada monotonia e de ridícula gravatinha a apertar-me o pescoço, garrotando-me a vontade de gritar basta, se vejo à minha volta, magistrados até, de insolentes gangas e descuidadas sapatilhas, que a toga mal disfarça? Porque haverei eu de inferiorizar-me na subserviente indumentária domingueira quando todos os dias me sabem, sanguinolentos, a uma raivosa segunda-feira?

O presidente do STJ

Eu coloquei uma questão para a qual não tive resposta: tem a ver com o presidente do STJ e como se diz, mas não só. Por isso voltei à carga. Achei que este blog devia ser poupado a tais calores. É que já vi por aí blogs jurídicos que começaram por ser de pés frios e que hoje estão como o aquecimento global do planeta Terra, a caminho da catástrofe de os seus autores se afundarem, ainda por cima, desanimados. Um bom dia de descanso para os que não têem prazos a correr, mesmo ao domingo, como sucede aos que são advogados. Para esses, um abraço de solidariedade fraterna e de amiga compreensão.

Assistente: recurso da acusação pública rejeitada

É interessante, porque problemático, saber-se da legitimidade do assistente penal para recorrer, direito que a lei lhe reconhece, mesmo quando o MP não recorre. O CPP refere, como que a enunciar o interesse em agir que lhe cabe, o direito ao recurso face às decisões contra si proferidas [artigo 400º, n.º 1, alínea b)] ou que o afectem [artigo 69º, n.º 2, alínea c)]. Ora nem sempre é claro o que pode integrar tais situações.
Eis pois porque tem interesse o Acórdão de 28.09.06 do Tribunal da Relação de Lisboa [proferido no processo n.º 4499/06, da 9ª Secção, relator Carlos Benido]: «I- A acusação pública foi rejeitada por ser manifestamente infundada, por os factos narrados não constituírem crime, mas apenas responsabilidade civil, nos termos do n. 3 do artº 311º CPP. II- O assistente quando foi notificado da acusação deduzida pelo MPº não tomou posição (não deduziu libelo autónomo nem expressou acompanhar a firmada pelo MPº) - como lhe competia (alínea d) do n. 2 do artº 69º CPP) -, antes se limitou a formular pedido civil. III- Preceitua a alínea b) do n. 1 do artº 401º do CPP que 'têm legitimidade para recorrer... o assistente, de decisões contra eles proferidas.' IV- Ora, no caso, não tendo o assistente deduzido acusação nem indicado que 'acompanhava' a publica, e conformando-se o MPº com a decisão de rejeição respectiva (ora sob recurso), há que entender que tal decisão não foi proferida contra o assistente, pelo que, carece de legitimidade para recorrer desacompahado do Ministério Público».

As cassetes e o prazo

«I- Quando legitimamente seja pedia cópia do registo das gravações (cassetes) da prova oralmente prestada em audiência de julgamento, o prazo que estiver em curso para interpor recurso suspende-se, voltando a correr logo que o recorrente tenha acesso a ela. II- No caso, tendo o requerente solicitado aquela cópia, oferecendo, de imediato suportes (cassetes) em branco a fim de que se proceda ao registo da gravação da prova, impunha-se que a secção o notificasse, por qualquer meio, fax ou outra via (posto que o contacto telefónico não fora possível), informando-o de que a gravação já estava disponível no tribunal. III- É que só com tal notificação se pode aceitar que findara a suspensão do prazo para recorrer. Esta é a interpretação correcta das disposições legais que concretizam a garantia constitucional do direito ao recurso em matéria de facto.- Decisão da Vice-presidente da Relação de Lisboa, em Reclamação», eis a decisão proferida, em reclamação, no 6974/06, da 9ª Secção, pela Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, Filomena Clemente Lima.
Não comento esta meritória decisão, até por viver, em processsos pendentes em que tenho intervenção, exactamente o mesmo problema. Mas sempre digo: todos nós, os pedestres do Direito, os que fazemos advocacia de tribunal criminal, sabemos quanta angústia está por detrás do agora decidido. Chegava-se ao ponto de receber as indispensáveis cassetes com a prova oral produzida em audiência nos últimos dias do prazo para recorrer, sem a certeza de que os tribunais de recurso não consideressem isso absolutamente indiferente.

As devassas gerais

Pedro da Fonseca Serrão Veloso compilou a COLLECÇÃO DE LISTAS, QUE CONTEM OS NOMES DAS PESSOAS QUE FICARÃO. PRONUNCIADAS NAS DEVASSAS, E SUMMARIOS a que mandou proceder o Governo Usurpador depois da heroica contra revolução, que arrebentou na mui nobre, e leal Cidade do Porto em 16 de Maio de 1828, nas quaes se faz menção do destino que a Alçada, creada pelo mesmo Governo para ao julgar, deu a cada uma dellas... Pelo... Porto. Foi impresso na tipografia de Viuva Alvares Ribeiro & Filho em 1833. Diz o alfarrabista que é in-4º gr. de lV-lV-235-40 págs.

Credo!

Confesso que de repente me assustei ao ver que fazia parte de um «grande debate», no caso sobre a reforma penal. Credo!

Túmulos caiados

«Ai de vós, doutores da Lei e fariseus hipócritas, porque sois semelhantes a túmulos caiados: formosos por fora, mas por dentro, cheios de ossos de mortos e de toda a espécie de imundície». Não, não sou eu a insultar, é o Evangelho segundo São Mateus, 23, 27-28. Está aqui citado por causa disto que ali escrevi.

Recados ao PGR

Ainda nem sequer tomou posse, o novo Procurador-Geral da República, antes de abrir a boca, já começou a receber «recados». É assim que as coisas funcionam em Portugal. As pessoas aparecem na imprensa a opinar, porque são candidatos a qualquer coisa, providas no lugar da candidadura passam a viver em função dos recados dos outros, enviados através da imprensa. É isto a imprensa, tarefa do moço de recados?.

PGR e DCIAP

Há quem ande a sugerir que o pacto sobre a Justiça foi arrematado em conjunto com a escolha do novo PGR. Talvez tenha sido. Mas o que me preocupa é se a escolha política do novo PGR foi feita levando desde já em conta uma nova direcção para o DCIAP. Não porque não deva haver mudanças. O problema é o a propósito de elas virem. É que importa mais saber quem manda no operacional DCIAP do que fazer futurologia sobre quem vai ser o próximo habitante do aveludado Palácio de Palmela.

Advogados e notários: os homens de pouca fé!

As boas maneiras do Comunicado da Ordem dos Advogados de resposta à resposta do Bastonário da Ordem dos Notários tenta, enluvadamente, esconder aquilo que, afinal, é o que está em causa. O representante dos notários terá recomendado a toda a classe dos notários que «recuse, nos respectivos cartórios, públicos ou privados, documentos autenticados por advogados e solicitadores, por considerar que estes não são “oficiais públicos providos de fé pública”». O Conselho Geral da Ordem dos Advogados, em comunicado da noite passada, argumenta, em suma, dizendo que «a competência dos Notários para a prática destes mesmos actos, não resulta de nenhuma alegada fé pública imanente à sua condição profissional, mas tem exactamente a mesma fonte de legitimidade dos Advogados, ou seja, a lei».
Reconhece-se uma pega de cernelha, por impossibilidade de o corpulento boi ser pegado de caras. Um aconselha a que se esqueça a lei, outro lembra-lhe a lei. Ora nada disto que se discute é o que há para se discutir. É que das duas uma: ou o Bastonário dos Notários fala para lutar contra a perda de rendimentos dos seus, ante a «concorrência» que o Governo lhes criou, ao abrir aos advogados esta fatia do «mercado» [tudo respeitosamente entre aspas] ou aquilo de que o Conselho Geral da Ordem dos Advogados se veio defender foi da suspeita de que os advogados, porque não são dignos de «confiança», não podem, por «rebaixamento moral», merecer fé pública [mais aspas e o mesmo respeito]. Num caso, por falar em legalidade, é um caso de Direito Comercial, no outro, de Direito Penal.
Mas, se é assim, porque é que não dizem a verdade e põem as cartas na mesa: são os advogados concorrentes desleais ou são os advogados uns imorais?
Não precisamos, na polémica deliquodoce entre notários e advogados, de chegar ao ponto de se chamarem entre si ladrões nem mentirosos, mas será interessante, já que a romaria está no adro, que estalem alguns foguetes. «Jesuitismos» argumentativos, isso é que não! [ainda mais aspas com todo o respeito pela Sociedade de Jesus!].

Quando o consenso se quer, alcança-se

No seu tempo, em 1987, o Código de Processo Penal era um tema «fracturante», embora nós na altura não soubéssesmos que essa palavra existia. Começou a ser preparado no tempo do Bloco Central, sendo ministro da Justiça o Dr. Rui Machete e Primeiro-Ministro o Dr. Mário Soares. Foi aprovado na Assembleia da República, já o PSD governava só, com o Prof. Cavaco Silva como primeiro-ministro e sendo ministro da Justiça o Dr. Mário Raposo. Passou no Parlamento com os votos do PS e do PSD. Mais: tendo baixado à primeira comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da AR, nela, o deputado, então comunista, Dr. José Magalhães, que presidia, teve um papel notável na redacção final, que assim ajudou a viabilizar. Toda a gente de todos os sectores do Direito teve a oportunidade de opinar. O próprio TC foi chamado a intervir preventivamente e o texto final foi aperfeiçoado em função disso. Eu repito: no seu tempo, o CPP que ainda hoje resiste a todos os ministros que quiseram legislar sobre ele, era um tema fracturante. Conseguiram-se todos os consensos políticos e corporativos necessários para o aprovar, à luz do dia, com ampla participação. É preciso dizer mais?

Execução de sentença penal estrangeira

«Mesmo no âmbito do regime instituído pelo mandado de detenção europeu, para ter lugar em Portugal a execução de uma sentença penal estrangeira que imponha uma pena, a mesma não pode deixar de estar dependente da revisão e confirmação. II. Com efeito, nenhuma excepção ao disposto nos arts. 275.º e ss. do C.P.P. foi efectuada pelo legislador pela Lei n.º 65/03, de 23/8, a qual apenas regula a entrega de detido, ao abrigo de um mandado de detenção europeu. III. Se, nos termos do n.º 1 do art. 31.º desta Lei, se decidiu por esta entrega, mas tendo sido a mesma suspensa, a fim do detido cumprir a pena em Portugal, é de declarar cessada esta suspensão, caso a autoridade judiciária estrangeira não venha a transmitir certidão da sentença condenatória, a qual se mostra necessária a instruir aquele pedido de revisão», eis a opinião do Procurador-Geral Adjunto Paulo Antunes, junto da Relação de Lisboa [emitido em 30.08.06 no processo n.º 6752/06, da 9ª Secção].

Uma nova razão para fundamentar

Há neste acórdão da Relação de Lisboa de 07.09.06 [proferido no processo n.º 5973/06, da 9ª Secção, relator João Carrola] um passo muito interessante: «Dispõe o artº 97°, n. 4, do C.P.P. que "os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão." III- A motivação da decisão é imprescindível, entre outras razões, para favorecer o auto-controle dos juízes, designadamente, obrigando-os a analisar, à luz da razão, as impressões recolhidas no decurso da produção da prova, bem como para estimular a recolha jurisprudencial de regras objectivas de experiência e o respeito pela lógica e pelas leis da psicologia judiciária na apreciação das mesmas».
Eis a ideia: a motivação [fundamentação] das decisões é também uma forma de a magistratura judicial, em regime de auto-controlo encontrar as regras objectivas de experiência e o respeito pela lógica e pelas leis da psicologia judiciária na apreciação das mesmas. Oxalá! Para que haja, enfim, uniformidade de critério, ao menos na aferição da prova.

Arguido ausente e a questão do depósito da sentença

Por despacho da Vice-presidente da Relação Lisboa, Filomena Lima, proferido em sede de reclamação [Processo n.º 6943/06 9ª Secção]: «quando o arguido está presente às sessões de julgamento, faltando apenas à da leitura da sentença (para o que fora notificado), comparecendo o seu defensor a esta, não tem o arguido de ser notificado pessoalmente da sentença, iniciando-se o prazo de recurso com o depósito da mesma, nos termos conjuntos dos artºs 411º, n. 1 113º, n. 9 e 373º, n. 3 do CPP. A constitucionalidade deste entendimento foi sufragada pelo Ac. T. Constitucional nº 429/03, de 2003-09-24, in DR II série, de 2003-11-21)».
Nada temos a dizer a este respeito. O problema que se suscita vem a propósito da leitura deste trecho. É que é inadmissível que um acto em que não ocorre notificação [o depósito da sentença], que pode ocorrer muitas vezes bastante tempo depois da leitura da decisão, faça nascer [de modo inesperado e descontrolado] algo de tão grave como um prazo para recorrer. Ou seja, pode o juiz ler hoje uma sentença condenatória, depositá-la na secretaria no dia que lhe aprouver e os advogados, pois que ao contrário do MP estão fora do edifício do tribunal, têm de andar em constante contacto com a secção para saber qual o dia em que começa a correr-lhes o prazo para recorrerm. Ou então, têem de agradecer à gentileza dos funcionários, o favor de um telefonema a avisar. É isto justo? É isto leal? É isto digno de um sistema jurídico que não queira rasteirar a defesa?
Note-se: eu não imputo à subscritora da decisão referida o concordar com isto e sei que isto é o efeito de uma lei que, descuidada, gerou tal possibilidade. Talvez o TC possa intervir um dia sobre isto. Resta saber será qual o entendimento.

Contagem da pena: o MP sem controlo?

Um acórdão Relação de Guimãrães de 27.04.06 [relator Ricardo Silva] que agora vi num site que os promete publicar determina que o despacho vulgarmente chamado de homologação da contagem da pena «é um típico despacho de mero expediente»!!. E justifica-o por esta forma: «A lei incumbe, hoje, ao MP da tarefa da liquidação da pena e correspondente comunicação, nos termos do disposto no art. 477.º, n.os 1 e 3, do CPP. Assim, o despacho impropriamente chamado de homologação – designação correspondente a uma praxe judicial sem tradução legal – não expressa mais do que a manifestação de concordância com a contagem da pena lavrada pelo MP, não tendo outro efeito útil que não seja o de fazer constar que o Juiz titular do processo faz sua tal contagem, para os efeitos da sua competência, nomeadamente os que lhe são conferidos pelos artigos 470.º e 475.º do CPP. Na realidade, se o dito despacho de homologação não constasse do processo isso não determinaria qualquer nulidade ou irregularidade, podendo o Juiz ordenar as decisões relativas à execução da pena mediante despachos específicos. Isto, para dizer que o despacho recorrido não interfere com quaisquer direitos da recorrente, nem a constitui em quaisquer deveres».
Devo dizer que, ao ler este sumário, concordei plenamente com a dúvida de um comentário de L.C. «tenho dúvidas sobre a bondade desta fundamentação, nomeadamente quando refere que “o despacho recorrido não interfere com quaisquer direitos da recorrente”.Então, e se o MP se engana na liquidação da pena? E se surgem questões sobre o método de contagem da pena? Quem as dirime?». Precisamente! Numa matéria com esta gravidade...

MP na PGDL: quem é quem

A revelação pública dos critérios internos de distribuição de serviço no MP e o assumir esta magistratura um rosto é uma demonstração de transparência, pilar essencial de um Estado de Direito. Saúdo pois que o site da PGD venha publicando a distribuição de serviço dos magistrados do MP na PGD.

De acordo com esse site da Procuradoria Geral Distrital de Lisboa:

(1) Exercem funções nas secções criminais(3ª., 5ª. e 9ª.) do TRL, sob a coordenação da Dra. Paula Figueiredo, os seguintes magistrados:

3ª. Secção

Dr. Gomes Pereira
Dr. João Vieira
Dr.ªMaria José Morgado, coordenadora
Dr. João Ramos / Dr.ª Paula Figueiredo

5ª. Secção

Dr.ªFátima Barata, coordenadora
Dr.ªAnisabel Miranda
Dr. Gilberto Seabra
Dr.ª Lucília Gago

9ª.Secção

Dr.Rodrigues Marques
Dr.ªIsilda Aragão
Dr. João Parracho, coordenador
Dr. Paulo Antunes

A cooperação internacional penal que vinham cabendo a três magistrados, um por cada secção (Dr.ª Maria José Morgado-3ª, Dr. Gilberto Seabra-5ª e Dr. Paulo Antunes-9ª), serão reedistribuídos.

A superintendência e coordenação de outros círculos judiciais e procuradorias fica assim distribuída na área criminal:

* Varas Criminais e TEP de Lisboa - Dr.ª M.ª José Morgado
* Juízos Criminais de Lisboa - Dr.ª Helena Faim
* Círculo de Almada - Dr. Paulo Antunes
* Círculo de Angra do Heroísmo - Dr.ª Isilda Aragão
* Círculo do Barreiro - Dr. Rodrigues Marques
* Círculo das Caldas da Rainha - Dr. Gomes Pereira
* Círculo de Cascais - Dr. João Ramos
* Círculo do Funchal - Dr.ª. Fátima Barata
* Círculo de Loures - Dr. João Vieira
* Círculo de Oeiras - Dr. Carlos Gago
* Círculo de Ponta Delgada - Dr. Gilberto Seabra
* Círculo de Sintra - Dr.ª. Anisabel Miranda
* Círculo de Torres Vedras - Dr. Gomes Pereira
* Círculo de Vila Franca de Xira - Dr. João Parracho