Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Urgente, muito urgente identificação

O Ministro da Administração Interna homologou em 13 de Dezembro de 2007 o Parecer da PGR, votado na sessão do Conselho Consultivo de 3 de Fevereiro de 2005 [sim, 2005!], o qual vem, por isso, publicado no Diário da República de 11 de Janeiro de 2008.
Segundo o dito parecer: «acolhendo proposta da Inspecção -Geral da Administração Interna (1) e sugestão da Auditoria Jurídica do Ministério (2), dignou -se Vossa Excelência solicitar que «seja emitido, com carácter de urgência, parecer do Conselho Consultivo da PGR, sobre a questão de saber se a Lei n.º 5/95, de 21 de Fevereiro, se encontra em vigor e, na afirmativa, sobre a sua articulação com o artigo 250.º do Código de Processo Penal (3)».
O ofício do Inspector -Geral da Administração Interna, foi emitido em 13 de Julho de 2004 [2004!], acompanhado de parecer de 12 de Novembro do Subinspector--Geral.
Ou seja uma matéria urgente para o Governo em Julho de 2004 foi objecto de parecer da PGR em Fevereiro de 2005 e homologada, enfim, pelo Ministro em Dezembro de 2007, para ser conhecida em Janeiro de 2008. Extraordinária celeridade, magnífico Direito, superlativa administração da Justiça!
Já agora a conclusão arqueologicamente interessante:

«1.ª — A Lei n.º 5/95, de 21 de Fevereiro, foi tacitamente revogada pelo artigo 250.º do Código de Processo Penal, na redacção da Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto;2.ª — A identificação por órgãos de polícia criminal — de qualquer pessoa encontrada em lugar público, aberto ao público ou sujeito a vi-gilância policial, sobre quem recaiam fundadas suspeitas da prática de crimes, da pendência de processo de extradição ou de expulsão, de que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional ou de haver contra si mandado de detenção — e, bem assim, a possibilidade de condução e permanência do identificando em posto policial obedecem ao disposto no artigo 250.º do Código de Processo Penal;3.ª — A obrigação de identificação perante autoridade competente é uma medida de polícia e a sua aplicação está subordinada aos pressupostos e limites que condicionam a actividade de polícia, com relevo para o princípio da proibição do excesso;4.ª — Em conformidade com este princípio, a permanência de suspeito em posto policial para efeito de identificação deve, nos termos da lei (artigo 250.º, n.º 6, do Código de Processo Penal), restringir -se ao «tempo estritamente indispensável à identificação, em caso algum superior a seis horas».

Recurso não assinado por defensor

Comprende-se que «o direito que assiste ao arguido de formular requerimentos, e embora admissíveis mesmo que não assinados pelo advogado do arguido, não abrange os actos que carecem da intervenção obrigatória do defensor, pois que, sendo de natureza técnico-jurídica, como o é a peça recursória, só por este podem ser praticados. Improcede, assim, a reclamação do despacho que, com tais fundamentos, não admitiu o recurso» Acórdão da Relação de Lisboa de 21.12.07, proferido no processo n.º 10034/07 , 9ª Secção, relator Filomena Clemente Lima]
Mas, independentemente de ser a solução legal, impressona que da lei decorra que «não pode ser admitido o recurso interposto pelo arguido, que só ele subscreveu, por ser um acto processualmente nulo (artº 119º, c) do CPP)», sobretudo naquilo em que tal orientação suponha que não há sequer a possibilidade legal de ordenar a notificação ao defensor - necessariamente designado - para que ele ratifique o acto - porventura desesperado - pratica pelo arguido.
Claro que há a necessidade de garantir a defesa técnica, para que os tribunais conheçam processos acompanhados por quem saiba ou deva saber o mínimo de Direito; mas claro também que ante uma ânsia de Justiça, muitas vezes reclamada por quem não encontrou acompanhamento suficiente no defensor que lhe coube - não sei se será o caso! - a rejeição do recurso tem um amargo sabor a denegação. Dura lex, talvez!

Causas da corrupção

A SEDES vai realizar uma conferência sobre as “Causas da corrrupção”, nas suas instalações, sitas na Rua Duque de Palmela, n. 2, 4º Dt., em Lisboa, no dia 24 de Janeiro de 2008 (Quinta-feira) às 21:30 horas.

A Conferência será proferida pelo Dr. Paulo Morgado, Presidente da Capgemini Portugal, autor de vários livros e artigos sobre o tema, destacando-se o mais recente livro “O Corrupto e o Diabo”. Seguir-se-á um debate moderado pelo Dr. Amílcar Theias, presidente do grupo de trabalho da SEDES “Cidadãos Contra a Corrupção”.

De novo o artigo 30º: a directiva do «particular cuidado»

Ante a polémica suscitada a propósito do artigo 30º do Código Penal, o PGR emitiu a seguinte directiva, a qual visa, no essencial, evitar o automatismo da aplicação da figura mitigadora da continuação criminoso a casos em que, mau grado a unidade de vítima, não estejam, em concreto reunidos os pressupostos que justifiquem a atenuação da responsabilidade penal. Eis o texto da louvável circular:
«1­ A eventual subsunção jurídica dos factos apurados à figura do crime continuado, prevista pelos n.º s 2 e 3 do art.º 30º do Código Penal, quando se verifique a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, dependerá sempre, nos termos da lei, da verificação de circunstâncias de facto que, em concreto, devam considerar­se como aptas a justificar um juízo de considerável diminuição da culpa do arguido;
«2­ Sendo assim, quando no inquérito se suscite a eventual verificação de uma situação de continuação criminosa, deverá proceder-­se ao rigoroso apuramento, em concreto, dos pressupostos de facto de que depende a imputação da prática de crime continuado, quer no que se refere à exigível “homogeneidade da actuação” do arguido quer no que respeita à existência de uma “mesma situação exterior”, susceptível de diminuir consideravelmente a respectiva culpa;
«3­ Subsequentemente, se tais pressupostos estiverem inequivocamente apurados, os factos integradores da “continuação criminosa” deverão ser rigorosamente descritos na acusação, não podendo esta limitar-­se à afirmação conclusiva da sua alegada verificação;
«4­ Caso não se revele possível, no momento do encerramento do inquérito, fundamentar, em factos concretos, a imputação da prática de crime continuado, nos termos atrás expostos, deverão os senhores Magistrados do Ministério Público abster­-se de invocar esta figura jurídica, no âmbito das acusações que vierem a ser deduzidas».
Do preâmbulo da dita directiva respiga-se o seguinte elucidativo trecho:
«(...) Ora, sem entrar aqui em elaborações doutrinais mais aprofundadas, no âmbito duma matéria que integra os próprios princípios estruturais do sistema punitivo, há que reconhecer que a mera possibilidade da atenuação da punição em casos que poderiam ser punidos de acordo com as regras do concurso de crimes, justificará um particular cuidado na avaliação e valoração das circunstâncias factuais cuja verificação, no caso concreto, poderá implicar a punição a título de crime continuado».
Valeu afinal a pena ter suscitado o problema! Mau grado quantos tentaram desvalorizar as críticas, afinal, havia mesmo problema... E de tal modo que o PGR circula à estrutura do Ministério Público para que tenham, nesta matéria, um «particular cuidado». Em nome das vítimas, bem haja por isso!

Indultos

Estarão lembrados de que o ano passado os indultos deram polémica, por causa de um erro na sua concessão. Este ano, seis indultos apenas foram publicados!
Sabe-se que o indulto é, na sua simbologia, um acto de graça magnânima, símbolo da Majestade. Na República a sua justificação já é mais complexa, intervenção do Supremo Magistrado na área reservada de todas as magistraturas.
Mas não é de justificação que se trata, sim de entender como se passou de tanto a tão pouco. Seguramente não haverá sido o medo de errar.

Mais claro não é possível

«O certificado de incapacidade temporária para o trabalho por estado de doença (CIT) que ateste o período de incapacidade temporária para o trabalho para prestar assistência a descendentes dos beneficiários ou equiparados substitui o requerimento para atribuição do subsídio para assistência na doença a descendentes menores ou deficientes, previsto no artigo 19.º do Decreto -Lei n.º 154/88, de 29 de Abril, com a redacção que lhe foi dada pelos Decretos -Leis n.os 333/95, de 23 de Dezembro, 347/98, de 9 de Novembro, 77/2000, de 9 de Maio, e 77/2005, de 13 de Abril». O que, aliás, se compreende!

Especial complexidade

Há um problema jurídico consistente em saber qual o conteúdo material do conceito de especial complexidade.
Isto resulta do facto de o legislador ter previsto a figura como uma situação que fundamenta a elevação do prazo da prisão preventiva e, em muitos casos, parecer que a invocação da mesma surge como um mero expediente: processos há que, nunca tendo conhecido qualquer espécie de complexidade, de súbito a ganham, só porque o prazo de prisão preventiva se está a esgotar.
As coisas chegaram a um tal modo que o legislador foi obrigado a intervir, na última revisão do CPP, decretando que tal especial complexidade apenas pode ser decretada em primeira instância. Já alertei aqui que, perante uma tal norma, há quem a entenda - esvaziando-lhe o âmbito de garantia - que ela obriga apenas a que, burocraticamente, o processo que está na segunda instância baixe à primeira, para o efeito de ali ser proferido o despacho que permite, enfim, tornear o esgotamento do prazo de prisão.
Eis pois porque são úteis definições jurisprudenciais pelas quais se dê um conteúdo àquilo que corre o risco de se degradar a nível de um conceito vazio, de alcance meramente pretextual.
Eis o caso do Acórdão proferido no processo n.º 9412/07 de 9ª Secção do Tribunal da Relação se Lisboa, segundo o qual: ««1. A descrição da norma a que se refere o art. 215.º n.º 3 do CPP não apresenta a noção de 'especial complexidade' com um círculo de referências objectivamene marcadas. Apenas, a título de exemplo ( como é função de advérbio nomeadamente ), alude a circunstãncias susceptíveis de traduzir a especial complexidade do procedimento. (...) A noção está, pois, em larga medida referenciada a espaços indeterminados pressupondo uma integração densificada pela análise de todos os elementos do procedimento. 2. Resulta preenchida, se a matéria sujeita a julgamento é vasta e complexa, cabendo ao tribunal apreciar um enorme acervo probatório constituído, entre outros elementos, por dezoito testemunhas indicadas na acusação e por uma grande quantidade de documentos juntos aos autos».

Subida diferida

Acórdão n.º 476/2007, D.R. n.º 2, Série II de 2008-01-03 - Tribunal Constitucional - Não julga inconstitucional a interpretação do artigo 407.º, n.º 2, do Código de Processo Penal no sentido de que não deve subir imediatamente o recurso interposto da decisão, proferida em audiência de julgamento, que recusa declarar prescrito o procedimento criminal

Conselho Superior

No próximo dia 8, pelas 21:00, ocorrerá na Ordem dos Advogados, no Largo de São Domingos, em Lisboa, o acto de posse do Conselho Superior, para o qual fui eleito Presidente.
Não me sendo possível fazê-lo por outra forma, convido todos os que quiserem comparecer a assistir.
A Ordem dos Advogados não é uma mera organização sindical de advogados, é sim uma associação pública que participa no Estado de Direito, mesmo quando o Estado de Direito desconsidera a Ordem dos Advogados.
No mesmo momento será empossado o Bastonário e o Conselho Geral.

Recusa de juiz: decisão sem recurso

A ideia segundo a qual há decisões dos tribunais que, definindo matérias gravemente sensíveis, o fazem sem apelo nem agravo, não impressiona o Tribunal Constitucional: eis o que se passa quanto ao incidente da recusa de juiz.
Os juízes do Palácio de Ratton proclamaram uma vez mais, agora no seu Acórdão n.º 56/07, de 03.01.08 que não são «inconstitucionais as normas constantes dos artigos 399.º, 432.º e 433.º do Código de Processo Penal, quando interpretadas no sentido de que não é admissível recurso da decisão do Tribunal da Relação proferida em incidente de recusa de juiz de 1.ª instância».
A recusa de um juiz é um acto relevante. Pode ter como fundamento, ao limite, uma suspeita sobre a idoneidade de quem julga, outras vezes é um mero colocar em causa, por razões objectivas, a sua impossibilidade de parecer imparcial. Seja como for é algo de grave, para o caso, para o juiz recusado, para a sociedade.
Permitir que um tribunal conheça tal melindrosa matéria e confirme o juiz ou o afaste sempre sem recurso, parece ferir a sensibilidade jurídica de um leigo. Para a Constituição, pelos vistos, é indiferente,e assim se elimina mais um recurso.
Ora que, todos sabemos, a maioria esmagadora das recusas de juiz são recusadas. Assim, trata-se de uma jurisprudência assente na tranquilidade de quem não tem que dar tutela constitucional ao afastamento de juízes, antes negá-la a quem pretende o seu afastamento.