Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Continua o estado de Citius...


São 14:54, daqui a pouco mais de uma hora encerram os tribunais e termina o primeiro dia do novo mapa judiciário com as novas tecnologias, o epígono da desmaterialização. Era de prever. E aconteceu: clica-se e surge a mensagem:

Página temporariamente indisponível

Deu-se início ao processo de arranque do Citius nas 23 comarcas. Estima-se que nas próximas horas o sistema esteja operacional. O Portal Citius será disponibilizado durante o dia de hoje.

Comentários para quê? Tribunais há ainda carregados de obras, de lixo, de processos amontoados, de funcionários que nem sabem para onde ir, onde sentar nem o que fazer. 

Brasil: associação criminosa


Só agora é que o Direito Criminal Brasileiro tipificou enquanto tal e de forma específica o crime de associação criminosa. Segundo se noticia no mês de Julho «foi aprovado, na madrugada desta quinta-feira (11), no Senado, o PLS 150/2006, que vai tornar mais eficaz o enfrentamento às organizações criminosas com penas de três a oito anos. Antes, apenas os crimes de quadrilha ou bando, grupos constituídos por mais três pessoas, eram tipificados com penas de até três anos.»

Em rigor dizendo, até aqui a previsão legal naquele País distinguia a organização criminosa da associação criminosa, mas esta exigia para a sua caracterização a pertença de um número mínimo de três pessoas.


De facto, o § 1º, do art. , da Lei 12.850/2013 [ver o texto integral aqui] previa que: «Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.»

Enquanto isso, o artigo 288 do CP (alterado pela Lei 12.850/2013, art. 24) trata do tipo penal da “Associação Criminosa”, onde o mínimo para a sua configuração é de 3 pessoas ou mais e é aplicado às infrações penais cujas penas máximas sejam inferiores a 4 (quatro) anos. 

Transcrevendo: «Art. 288. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes: (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013) (Vigência)
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013) (Vigência)
Parágrafo único. A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de criança ou adolescente. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013) (Vigência)»

"Escuta" a Advogados


Com o Tribunal de Estrasburgo, defensor, diga-se, dos Direitos do Homem, a viabilizar a escuta num caso de terrorismo [ver aqui], também no Brasil a questão da licitude da intercepção telefónica da conversa entre o advogado e o seu constituinte está em aberto, agora no domínio do Direito Criminal Comum. Citando:

«Recentemente, tem se observado o vazamento dessas conversas gravadas, especialmente aquelas havidas entre o investigado e seu advogado, visando macular essa relação profissional de desconfiança pela sociedade em geral. Ainda que tal prática seja extremamente imoral, esse artigo se voltará para questão correlata de maior importância: Pode a conversa gravada entre cliente e advogado ser utilizada como meio de prova no processo penal?
Recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, datado de 27 de maio de 2014, nos autos do RMS 33.677 – SP, negou provimento ao recurso interposto por um escritório de advocacia que postulava pelo desentranhamento de interceptação telefônica onde foram captados diálogos havidos entre advogados daquele escritório com um investigado, tendo o tribunal justificado a manutenção daquela interceptação nos autos do processo sob o fundamento de que “não é porque o advogado defendia o investigado que sua comunicação com eles foi interceptada, mas tão somente porque era um dos interlocutores, não havendo, assim, nenhuma violação ao sigilo profissional”.Com a devida vênia, ousamos discordar da decisão proferida por aquela Egrégia Corte, uma vez que (...) [ler o texto integral aqui]

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Fonte da imagem: aqui

França: a Cour d'Asises

Para que se saiba o que é e como funciona. Texto aqui.

Como no Animal Farm, há uns mais iguais do que outros


Claro que as alterações aos grandes diplomas, como o Código Penal, poderiam não ser feitas aos poucos, uma de cada vez. 
Ainda na terça-feira falava na 32ª segunda alteração ao Código Penal, pela qual se alterou o seu artigo 132º, assim qualificando o homicídio e as ofensas à integridade física de solicitadores, agentes de execução e administradores judiciais e já surge a 33ª alteração, desta feita relativa a maus tratos a animais de companhia. Está aqui, sendo a Lei n.º 69/2014, de 29 de Agosto.
Lendo o preceituado em primeira leitura fica-se com estas controversas ideias. Ou eu estarei errado.
Primeira, de que a regra de que o definido não entra na definição é pura e simplesmente esquecida por este descuidado legislador para quem animal de companhia é o «detido ou destinado a ser detidos por seres humanos, designadamente no seu lar, para seu entretenimento e companhia». Em suma, animal de companhia é o que serve para fazer companhia, vício definitório que já decorria da Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro, para a protecção dos animais, com a especificidade de nesta se prever «prazer» em vez de «entretenimento».
A segunda e substancial é que o âmbito de protecção não se estende aos animais domésticos em geral e assim quem infligir dor ou privar de importante órgão ou membro animal que tenha na sua capoeira ou redil ficará impune, como se a lógica cruel de que, destinando-se a matança, podem ficar à mercê de qualquer malfeitoria imperasse com o apoio do legislador.
É aqui que ocorre a perplexidade. É que a acima citada Lei n.º 92/95, que, repete-se, pretendia a protecção aos animais e previa toda uma série de condutas lesivas dos mesmos [ver abaixo o artigo 1º], deixava em aberto a punição à violação dos seus preceitos, já que no artigo 9º estabelecia que «as sanções por infracção à presente lei serão objecto de lei especial», de que se ficou à espera.
Ora a dita «lei especial» acabou por ser esta que não só introduziu um título novo no Código Penal, alterando-lhe a sistemática, como, para além disso, acabou por restringir o âmbito de protecção penal aos animais ditos de companhia, com esquecimento dos demais.
Isto é, quando desde 1995 se aguardou uma legislação criminal que desse execução à lei de protecção a animais, com esta lei hoje publicada acabou por manter-se aquela lei geral sem protecção penal e deliberadamente criou-se por cima dela um articulado que, pela nova redacção ao artigo 9º - que agora trata ade outra matéria, concretamente dos poderes de intervenção das associações zoófilas - dá um sinal de que relativamente aos animais que não sejam os de companhia o Direito Penal os abandonou de vez. Até porque quanto aos de companhia já existia outro diploma o Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de Outubro [ver aqui com a redacção em vigor], que procurou dar execução a uma Convenção Europeia sobre a matéria.
Como no Animal Farm, há uns animais mais iguais do que outros.

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* Artigo 1º da lei n.º 92/95


1 - São proibidas todas as violências injustificadas contra animais, considerando-se como tais os actos consistentes em, sem necessidade, se infligir a morte, o sofrimento cruel e prolongado ou graves lesões a um animal. 
2 - Os animais doentes, feridos ou em perigo devem, na medida do possível, ser socorridos. 
3 - São também proibidos os actos consistentes em: 
a) Exigir a um animal, em casos que não sejam de emergência, esforços ou actuações que, em virtude da sua condição, ele seja obviamente incapaz de realizar ou que estejam obviamente para além das suas possibilidades; 
b) Utilizar chicotes com nós, aguilhões com mais de 5 mm, ou outros instrumentos perfurantes, na condução de animais, com excepção dos usados na arte equestre e nas touradas autorizadas por lei; 
c) Adquirir ou dispor de um animal enfraquecido, doente, gasto ou idoso, que tenha vivido num ambiente doméstico, numa instalação comercial ou industrial ou outra, sob protecção e cuidados humanos, para qualquer fim que não seja o do seu tratamento e recuperação ou, no caso disso, a administração de uma morte imediata e condigna; 
d) Abandonar intencionalmente na via pública animais que tenham sido mantidos sob cuidado e protecção humanas, num ambiente doméstico ou numa instalação comercial ou industrial; 
e) Utilizar animais para fins didácticos, de treino, filmagens, exibições, publicidade ou actividades semelhantes, na medida em que daí resultem para eles dor ou sofrimentos consideráveis, salvo experiência científica de comprovada necessidade; 
f) Utilizar animais em treinos particularmente difíceis ou em experiências ou divertimentos consistentes em confrontar mortalmente animais uns contra os outros, salvo na prática da caça.

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Fonte da imagem [capa da primeira edição do livro de George Orwell], aqui.