Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




ASAE: branqueamento de capitais em consulta

A Autoridade de Segurança Alimentar e Económica submeteu a consulta pública, até 16 de Abril de 2018, um projeto de Regulamento dos deveres gerais e específicos de prevenção e combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo previstos na Lei n.º 83/2017, de 18 de Agosto. O texto pode ser encontrado aqui.

Luxemburgo: "amnistia fiscal" e branqueamento

O ministro das Finanças do Luxemburgo, Pierre Gramegna, informou que a amnistia fiscal que vigorou durante o ano de 21017 permitiu um encaixe financeiro da ordem dos cinquenta milhões de euros. As primeiras estimativas apontavam para um valor da ordem dos trinta e seis milhões de euros. A Directora da administração fiscal para os impostos directos, Pascale Toussing, por seu turno aproveitou para explicar que a aplicação de uma lei [a Lei n. º 7020, de 23 de Dezembro de 2016, texto integral aqui] que antecipa o teor da 4ª Directiva sobre o branqueamento de capitais [(EU) 2015/849] havia contribuído para melhorar a imagem do país face ao exterior.

Dois comentários a propósito:

-» primeiro: a criminalização e a descriminalização fiscal tornaram-se generalizadamente meios coercivos discricionários de cobrança fiscal, com o Estado a fazer avançar e recuar a linha da frente da Justiça Penal consoante as suas necessidade de meios orçamentais;

-» segundo: se bem que a avaliação GAFI tenha reconhecido [ver aqui] que o país efectuou significativos progressos desde o ano de 2011 [altura em que, sujeito a uma avaliação efectuada em 2010 [texto aqui] saiu da lista cinzenta em função do escasso controlo do branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo].

Quando o Estado se isenta do que ao País proíbe!


Que o Estado a si mesmo se permite o que aos particulares proíbe é princípio ao qual a consciência social dos portugueses já se acomodaram. Basta ver as condições de falta de segurança e insalubridade em que estavam e estão ainda muitos tribunais para não falar nas repartições públicas em geral.
Agora que o Conselho de Ministros haja aprovado um diploma pelo qual o Estado isenta a Administração Pública de pagar durante três anos as coimas que são exigidas aos cidadãos e empresas é intolerável se não fosse mais um de tantos funestos exemplos.
O princípio decorre do aprovado em sede de Regulamento Geral de Protecção de Dados no último Conselho de Ministros, quinta-feira passada.


Segundo o comunicado:

«O Governo aprovou a proposta de lei que assegura a execução do regulamento comunitário relativo à proteção das pessoas singulares sobre o tratamento de dados pessoais e sua livre circulação.
Através deste diploma, «o Governo aprova a legislação nacional necessária à execução do Regulamento Geral de Proteção de Dados, adotando as soluções que o Estado considera mais adequadas para proteger os direitos das pessoas» num contexto de crescente competitividade das empresas no quadro da União Europeia (UE), refere o comunicado do Conselho de Ministros de 22 de março.
Com entrada em vigor dia 25 de maio, o Regulamento tem como principais novidades:

• O reforço dos direitos dos titulares dos dados;
• A definição de categorias especiais de dados pessoais – como os biométricos ou os de saúde; 
• A obrigação de uma autoavaliação, pelos responsáveis do tratamento de dados pessoais e subcontratantes, cabendo-lhes a obrigação de notificação prévia à Autoridade Nacional de Controlo; 
• A criação de mecanismos de certificação para comprovar a conformidade das operações de tratamento de dados levadas a cabo pelos responsáveis e subcontratantes com o Regulamento; 
• A obrigatoriedade de notificar a Autoridade Nacional de Controlo em caso de violação de dados pessoais;
• A obrigatoriedade da existência de um Encarregado de Proteção de Dados nas entidades públicas e privadas; 
• O agravamento dos valores das coimas, em caso de violação do Regulamento.»


Mas, como informou a ministra da Presidência, citada pela comunicação social: «“O regulamento permite que as coimas não se apliquem às administrações públicas“, anunciou a ministra, na conferência de imprensa do Conselho de Ministros, esta quinta-feira, uma vez que o Estado, ao contrário das empresas, não comercializa esses dados. A proposta do Executivo prevê que a isenção “aconteça por três anos e que depois seja reapreciada”. É o tempo do Estado se organizar para o “novo paradigma”, diz Maria Manuel Leitão Marques.»

Naturalmente, Senhora ministra. É caso para sorrir. Sem mais comentários.

Suspensão provisória do processo: relatório de síntese da PGR/2017

A PGR publicou o relatório de síntese referente ao ano de 2017 [texto integral, aqui] em matéria de suspensão provisória do processo penal.

A justificar a relevância e actualidade do instituto, escreve-se nesse documento de 26 páginas:

«O relevo que o instituto da Suspensão Provisória do Processo, introduzido no sistema processual penal português com o Código de Processo Penal de 1987, tem assumido na resolução do conflito penal no domínio da pequena e média criminalidade justifica que se proceda à sua avaliação por referência, designadamente, às tipologias criminais em que a sua aplicação tem lugar, ao tipo de injunções e regras de conduta aplicadas e aos resultados obtidos.»

A aplicação da suspensão provisória decorre de duas Directivas da PGR, publicadas respectivamente em 2014 e 2015 {ver os textos respectivos aqui], como se cita no relatório:

«A Diretiva nº 1/14, de 15-1-2014, da Procuradora-Geral da República, posteriormente atualizada e republicada pela Diretiva 1/15, de 30-4-2015, define, para a magistratura do Ministério Público, orientações destinadas a potenciar a eficácia deste instituto e a uniformizar procedimentos e critérios, designadamente em matéria de injunções e regras de conduta, de modo a que sejam respeitados princípios de necessidade, adequação e proporcionalidade face ao caso concreto e atendidas as exigências de prevenção que o mesmo reclama.»

Em termos de centralização da informação relativa àquela figura processual:

«A aplicação do instituto é acompanhada pelas estruturas hierárquicas do Ministério Público e encontra-se sujeita a registo numa Base de Dados, legalmente prevista no DL n.º 299/99, de 04 de Agosto, alterado pela Lei n.º 27/2015, de 14/04, estando já em fase de testes um movo módulo da Base de Dados, que irá permitir registar, por comarca/departamento, todas as IPSS elegíveis e fornecer dados automáticos sobre os montantes globais já entregues a cada uma delas.»

Elucidativo da prática seguida na aplicação da suspensão, o documento esclarece, em termos estatísticos:

«No ano de 2017 a suspensão provisória do processo foi aplicada pelo Ministério Público, a nível nacional, na fase de inquérito, na fase preliminar do processo sumário e em sede de processo abreviado, em 34145 situações. 
«A diminuição da aplicação da suspensão provisória do processo em relação ao ano de 2016 (36623 casos) situou-se em cerca de 6,76%.»
«No ano de 2017 foi exercida a ação penal, com recurso às diversas formas processuais, em 97542 processos - 63397 processos por acusação nas diversas formas processuais e 34145 casos por aplicação da suspensão provisória do processo. 
«O exercício da ação penal por aplicação de suspensão provisória do processo correspondeu a uma percentagem de cerca de 35% do número total de processos em que foi exercida a ação penal. »
«Os crimes em que a aplicação da suspensão provisória do processo teve maior expressão continuaram a ser os crimes de Condução de veículo sob influência de álcool (cerca de 26,07%) e de Condução sem habilitação legal (cerca de 11,66%)»
«Em 2017, e ao contrário dos dois anos anteriores, o crime de desobediência teve um maior número de casos de suspensão provisória do processo, correspondentes a cerca de 6,90% do total de suspensões, seguido do crime de Violência doméstica contra cônjuge ou análogos, que foi objeto de suspensão provisória do processo em cerca de 5,85% do total de casos de suspensão provisória, valor ligeiramente inferior a 2016 (6,7%). 
«Foi também superior o número de suspensões provisórias do processo em casos de consumo de substâncias estupefacientes, que se cifrou numa percentagem de cerca de 5,83% face ao total de suspensões. 
«Salientam-se ainda os crimes de ofensa à integridade física voluntária simples, que constituíram cerca de 4,31% do total de suspensões provisórias, e de detenção ou tráfico de armas proibidas, que representaram cerca de 4,20%. »
«Os crimes de abuso de confiança fiscal e de abuso de confiança contra a segurança social, no seu conjunto, constituíram cerca de 3,53% dos casos de suspensão provisória durante o ano, com um total de 1208 casos (746 e 462, respetivamente). 
«Pela atualidade e evolução, designadamente face ao ano de 2015, e pese embora a ligeira diminuição verificada face a 2016 (menos 11), anotam-se ainda os 36 casos de suspensão provisória relativos ao crime de abandono de animais de companhia.»

Assembleia da República - iniciativas legislativas pendentes

Eis as iniciativas legislativas actualmente pendente na Assembleia da República com relevo para a matéria de justiça, incluindo a penal e contraordenacional:

-» Apreciação Parlamentar 50/XIII do Decreto-Lei n.º 93/2017, de 1 de agosto [PSD] - "Cria o serviço público de notificações eletrónicas associado à morada única digital" [aqui], entrada a 13.10.2017

-» Apreciação Parlamentar 47/XIII do Decreto-Lei n.º 117/2017, de 12 de setembro [PCP]- “Altera o regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de transportes coletivos de passageiros” [aqui], entrada  a 12.10.2017

-» Projeto de Lei 788/XIII-12.ª alteração à Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro [CDS/PP], que aprova o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais; criação de equipas extraordinárias de juízes administrativos e tributários  [aqui], entrado a 22.02.2018

-» Projeto de Lei 787/XIII [CDS/PP] - 45.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, que aprova a Lei Geral Tributária e 32.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro, que aprova o Código de Procedimento e Processo Tributário [aqui], entrado a 22.02.2018]

-» Projeto de Lei 785/XIII [CDS/PP] - 3.ª alteração à Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto ("Lei da Organização do Sistema Judiciário") [aqui], entrada a 22.02.2018

-» Projeto de Lei 784/XIII [CDS/PP] - 2.ª alteração à Lei n.º 78/2001, de 13 de julho ("Julgados de Paz - Competência, Organização e Funcionamento") [aqui], entrado a 22.02.2018

-» Projeto de Lei 783/XIII [CDS/PP]- 6.ª alteração ao Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho [aqui], entrado a 22.02.2018

-» Projeto de Lei 781/XIII [PS] - Altera o Código Civil, reconhecendo a possibilidade de renúncia recíproca à condição de herdeiro legal na convenção antenupcial [aqui], entrado a 20.02.2108

-» Projeto de Lei 773/XIII [BE] - Define e regula as condições em que a antecipação da morte, por decisão da própria pessoa com lesão definitiva ou doença incurável e fatal e que se encontra em sofrimento duradouro e insuportável, não é punível [aqui], entrado a 07.02.2108

-» Projeto de Lei 749/XIII [PAN] - Altera o Código Penal, criminalizando novas condutas praticadas contra pessoas especialmente vulneráveis [aqui], entrado a 26.01.2018

Branqueamento de capitais: novo Aviso do BdP em preparação

O Banco de Portugal submete a consulta pública, até 29 de março de 2018, um projeto de aviso sobre a prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo. Com este projeto de aviso, pretende-se emitir um instrumento regulamentar que, entre outros aspetos, defina: 
As condições de exercício dos deveres preventivos do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo previstos nos Capítulos IV e V da Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto;

Os meios e os mecanismos necessários ao cumprimento, pelas entidades financeiras, dos deveres previstos na Lei n.º 97/2017, de 23 de agosto, tendo em a vista aplicação e a execução de medidas restritivas aprovadas pela Organização das Nações Unidas ou pela União Europeia;

As medidas que os prestadores de serviços de pagamento devem adotar para detetar as transferências de fundos em que as informações sobre o ordenante ou o beneficiário são omissas ou incompletas e os procedimentos adequados a gerir as transferências de fundos que não sejam acompanhadas das informações requeridas pelo Regulamento (UE) 2015/847.

Pretende-se que o aviso revogue os seguintes instrumentos regulamentares: 
Aviso n.º 5/2013, de 18 de dezembro de 2013;
Aviso n.º 9/2012, de 29 de maio de 2012;

Conteúdo do projeto de aviso

Com o presente projeto de aviso, o Banco de Portugal pretende dar cumprimento aos mandatos que lhe são conferidos pela Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto, e pela Lei n.º 97/2017, de 23 de agosto. Pretende ainda contribuir para a simplificação do quadro regulamentar aplicável em matéria de prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo, sistematizando num único aviso matérias que atualmente se encontram dispersas por diferentes instrumentos regulamentares. 

O projeto de aviso não vem, em geral, onerar mais as entidades financeiras relativamente ao quadro legal vigente. De facto, o Banco de Portugal procurou, no diploma que agora submete a consulta pública, conformar os deveres e as obrigações previstos nos diplomas legais às concretas realidades operativas específicas das entidades financeiras sujeitas à sua supervisão, nomeadamente detalhando e exemplificando os meios e os procedimentos que estas entidades devem adotar em matéria de prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo.

Relativamente ao quadro legal vigente, o projeto de aviso: 

Altera o âmbito subjetivo, dado que inclui: (i) as instituições de pagamento e as instituições de moeda eletrónica com sede noutro Estado-Membro da União Europeia, quando operem em território nacional através de agentes ou distribuidores; (ii) as entidades financeiras, ou outras de natureza equivalente, que operem em Portugal em regime de livre prestação de serviços, apenas para efeitos previstos no artigo 73.º da Lei n.º 83/2017;

Elimina a diferenciação de regime para as contas de depósito bancário;

Apresenta soluções adequadas ao desenvolvimento tecnológico e ao surgimento de procedimentos alternativos;

Prevê um regime simplificado para as operações de crédito;

Unifica num mesmo reporte – o “Relatório de Prevenção do Branqueamento de Capitais e do Financiamento do Terrorismo” − a informação até aqui era transmitida ao Banco de Portugal por intermédio de dois reportes obrigatórios distintos;

Prevê um regime próprio para o Sistema Integrado do Crédito Agrícola Mútuo;

Reforça os poderes do supervisor relativamente à pessoa designada para assegurar, nas instituições financeiras, o cumprimento do quadro normativo em matéria de prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo, considerando-a explicitamente como “titular de funções essenciais”.

Resposta à consulta pública

Apenas serão considerados os contributos que, até ao dia 29 de março de 2018, sejam remetidos ao Banco de Portugal, em formato editável, através do endereço de correio eletrónico averiguacao.accao.sancionatoria@bportugal.pt, com indicação em assunto «Resposta à Consulta Pública n.º 1/2018».

O Banco de Portugal publicará os contributos recebidos ao abrigo desta consulta pública, devendo os interessados que se oponham à publicação, integral ou parcial, da sua comunicação fazer disso menção no contributo que enviem, indicando expressa e fundamentadamente quais os excertos da sua comunicação a coberto de confidencialidade.

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Fonte da imagem: aqui.

Moedas virtuais: aviso do BdP


O Banco de Portugal emitiu um alerta sobre as moedas virtuais. Copiamos abaixo o texto respectivo. 

«A Autoridade Bancária Europeia (EBA), a Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA) e a Autoridade Europeia dos Seguros e das Pensões Complementares de Reforma (EIOPA) emitiram hoje um novo alerta aos consumidores para os riscos das moedas virtuais, num contexto de elevada volatilidade dos preços destas moedas.
As autoridades de supervisão europeias alertam que as moedas virtuais apresentam um elevado risco e não oferecem qualquer grau de proteção aos consumidores na medida em que:
Não são garantidas por um banco central ou autoridade nacional;
Não são moeda com curso legal;
Não estão cobertas por nenhum ativo tangível;
Não são reguladas a nível europeu. 
Riscos a que estão sujeitos os consumidores que compram moedas virtuais

As autoridades de supervisão europeias destacam os riscos que os consumidores correm quando adquirem moedas virtuais, designadamente:
Volatilidade extrema ou risco de bolha de mercado – Os preços das moedas virtuais estão sujeitos a uma elevada volatilidade, existindo sinais claros de bolha nos mercados das diferentes moedas virtuais (Bitcoin, Ripple, Ether, etc.). Se os consumidores decidirem comprar produtos financeiros baseados em moedas virtuais, devem ter consciência de que podem perder uma grande quantidade, ou a totalidade, do dinheiro aplicado.
Inexistência de proteção – As plataformas de troca e as carteiras de moedas virtuais (wallets) não são reguladas a nível europeu. Se, por exemplo, uma plataforma de troca de moedas virtuais falir, encerrar atividade ou sofrer um ataque informático, a lei europeia não oferece qualquer proteção ou garantia aos consumidores que detenham moedas virtuais nessa plataforma.
Ausência de “opções de saída” – Quando o consumidor detém moedas virtuais arrisca-se a não conseguir transacioná-las ou trocá-las por euros durante períodos prolongados de tempo, o que pode implicar perdas.
Falta de transparência do preço – A formação dos preços das moedas virtuais não é transparente. Existe um risco bastante elevado de os consumidores não receberem o preço justo ou correto quando compram ou vendem moedas virtuais.
Interrupções operacionais – Algumas plataformas de troca de moedas virtuais têm vindo a sofrer problemas operacionais graves, tais como interrupção das trocas. Durante esses momentos, os consumidores não conseguem comprar ou vender moedas virtuais quando tencionam fazê-lo, incorrendo em perdas resultantes das enormes flutuações nos preços.
Informação enganosa – A informação disponibilizada aos consumidores, quando existe, é muitas vezes incompleta, de difícil compreensão e não apresenta adequadamente os riscos das moedas virtuais.
Inadequação das moedas virtuais para a maioria dos objetivos, incluindo para planeamento da reforma – A elevada volatilidade dos preços das moedas virtuais, a incerteza em relação ao seu futuro e a não confiança nas plataformas de troca e nas carteiras de moedas virtuais tornam-nas inadequadas para determinados fins, como sejam a aplicação de poupanças dos consumidores, designadamente no longo-prazo, como é o caso do planeamento da reforma.
Precauções a tomar pelos consumidores que adquirem moedas virtuais

As autoridades de supervisão europeias esclarecem ainda que, se decidir comprar moedas virtuais ou produtos financeiros com exposição a moedas virtuais, o consumidor deverá perceber as caraterísticas destas moedas e os riscos associados.

Deverá também ter consciência de que a compra de moedas virtuais através de empresas que sejam reguladas não mitiga os riscos referidos.

O consumidor deverá ainda tomar precauções de segurança nos equipamentos através dos quais compra, vende ou troca moedas virtuais.

Banco de Portugal reitera alertas

O Banco de Portugal já fez vários alertas públicos sobre os riscos associados às moedas virtuais. Embora as operações com moedas virtuais não sejam ilegais ou proibidas, as entidades que emitem e comercializam moedas virtuais não estão sujeitas a qualquer obrigação de autorização ou de registo junto do Banco de Portugal, pelo que a sua atividade não é sujeita a qualquer tipo de supervisão prudencial ou comportamental.

O Banco de Portugal também já recomendou às instituições de crédito, às instituições de pagamento e às instituições de moeda eletrónica sujeitas à sua supervisão que se abstenham de comprar, deter ou vender moedas virtuais.


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Fonte da imagem: aqui

In dubio pro reo


O Acórdão da Relação do Porto no seu Acórdão de 10.01.2018 [relator José Carreto, texto integral aqui] estatuiu:«O princípio in dubio pro reo não funciona perante uma dúvida emergente da falta de exercício pelo tribunal dos seus poderes de investigação.»
A justificar a asserção escreve-se ali: «Cabe isto para dizer, que o principio in dubio pro reo, não funciona perante uma dúvida emergente da falta de exercício pelo tribunal dos seus poderes de investigação.A dúvida relevante, que faz operar tal principio tem de ser uma dúvida insanável: ou seja, por não ter sido possível ultrapassar o estado de incerteza após aplicação de todo o empenho e diligência no esclarecimento dos factos; dúvida razoável: sendo uma dúvida séria, racional e argumentada; e uma dúvida objectivável: porque justificável perante terceiros excluindo as dúvidas arbitrárias ou as meras conjecturas ou suposições, o que não nos parece ser o caso, pois estando apenas em causa o acesso à plataforma ou o saber, não quanto o arguido se apropriou que esse já é sabido, mas quanto está em dívida, isso pode e devia ser apurado, sendo que, e como referido, tal não interfere com a prática do crime que se mostra consumado, nem parece constituir caus ade justificação.»

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Fonte da imagem aqui [pintura da Ralph Macdonald]

Prova por reconhecimento

O Acórdão da Relação de Évora de 09.01.2018 [relator Carlos Berguete Coelho, texto integral aqui] sentenciou que «A prova por reconhecimento é admissível no processo penal, desde que obedeça aos requisitos legais definidos no art. 147.º do CPP, sob pena de, se assim não for, não poder valer como meio de prova (n.º 7 do mesmo preceito legal), ou seja, de consubstanciar verdadeira proibição de prova, por revestir intromissão ilegal no direito à privacidade da pessoa submetida ao reconhecimento, à luz do art. 32.º, n.º 8, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do art. 126.º, n.º 3, do CPP.»

Da respectiva fundamentação consta este excerto elucidativo quanto ao sentido do decidido:

«Não se descura que o reconhecimento traduz uma modalidade muito particular de reconstrução mnemónica do passado, sujeita a numerosos factores de distorção, resultantes de perturbações que a tornam uma das mais falíveis formas de aquisição probatória, pelo que, relevo considerável, assume a escolha do método ou forma que deve seguir, nisso residindo a garantia epistemológica deste meio de prova importante (Alberto Medina de Seiça, in “A Legalidade da prova e reconhecimentos «atípicos» em processo penal”, “Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias”, Coimbra, 2003, págs. 1397, 1415 e 1416).
[...]
«Com efeito, não releva, para diferente entendimento, a circunstância da vítima não ter conseguido esclarecer quem exerceu sobre si o acto violento que se provou, na medida em que essa dificuldade se apresenta, dada a rapidez e a surpresa inerentes, como perfeitamente aceitável segundo a normalidade, a que se junta ter tido possibilidade de, anteriormente, ter visto quem eram as pessoas que o abordaram à entrada da residência.
[...]
«Arredada ficou, pois, a presunção da inocência que à recorrente antes assistia (art. 32.º, n.º 2, da CRP), não se afigurando qualquer razão para trazer à colação o princípio in dubio pro reo, uma vez que é manifesto que o tribunal, e bem, alcançou a certeza sobre a sua participação nos factos, através da motivação que presidiu à sua convicção, devidamente sustentada.»

Violência doméstica: estruturas de acolhimento

O Decreto Regulamentar n.º 2/2018, de 24 de Janeiro [texto aqui] veio regular as condições de organização e funcionamento das estruturas de atendimento, das respostas de acolhimento de emergência e das casas de abrigo que integram a rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica.
Cita-se, pois que esclarecedor, este excerto do respectivo preâmbulo:

«O Decreto Regulamentar n.º 1/2006, de 25 de janeiro, visou introduzir no ordenamento jurídico um conjunto de normas técnicas relativas às casas de abrigo para vítimas de violência doméstica, com o objetivo de conferir maior uniformidade à sua aplicação, acautelando, nomeadamente, as condições mínimas de abertura e de funcionamento, bem como a qualidade dos serviços prestados no âmbito da então Lei n.º 107/99, de 3 de agosto, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 323/2000, de 19 de dezembro, que estabeleceu o quadro geral da rede pública de casas de apoio dirigidas às mulheres vítimas de violência.

«A Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, que estabelece o regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica, à proteção e à assistência das suas vítimas, republicada em anexo à Lei n.º 129/2015, de 3 de setembro, procedeu à revogação da Lei n.º 107/99, de 3 de agosto, assim como da respetiva regulamentação, definindo as estruturas e as respostas que integram a rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica.

«Para além do organismo da Administração Pública responsável pela área da cidadania e da igualdade de género, a rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica compreende também o Instituto da Segurança Social, I. P., as casas de abrigo, as estruturas de atendimento, as respostas de acolhimento de emergência, as respostas específicas de organismos da Administração Pública, o serviço telefónico gratuito com cobertura nacional de informação a vítimas de violência doméstica e, ainda, sempre que o requeiram, os grupos de ajuda mútua de cariz comunitário que visem promover a autoajuda e o empoderamento das vítimas tendo em vista a sua autonomização.

A rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica é constituída por um conjunto de estruturas e respostas que, a par das casas de abrigo, necessitam de ser regulamentadas, agrupando todos os requisitos aplicáveis a cada uma delas, tendo em vista uma harmonização de âmbito nacional das suas regras de funcionamento e garantindo o mesmo nível de qualidade dos serviços prestados, independentemente da sua natureza jurídica.

«Por outro lado, e decorrida uma década da entrada em vigor do Decreto Regulamentar n.º 1/2006, de 25 de janeiro, constata-se que o conteúdo das suas disposições encontra-se não só desajustado às orientações de política nacional e internacional de prevenção da violência doméstica, proteção e assistência das suas vítimas, destacando-se, a este propósito, o previsto na Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica (Convenção de Istambul), como desadequado face às alterações entretanto verificadas na composição da atual rede nacional de apoio às vítimas de violência doméstica, ocorridas por via do disposto na Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, na sua redação atual.

«Com o presente decreto regulamentar, para além de se clarificarem os aspetos supra referidos, introduz-se um conjunto de regras e de procedimentos tendo em vista a melhoria e eficácia do funcionamento das estruturas de atendimento, respostas de acolhimento de emergência e casas de abrigo, permitindo quer um processo de autoavaliação das mesmas, quer a revisão, de forma sistemática, do seu desempenho, identificando as oportunidades de melhoria e a ligação entre o que se faz e os resultados que se atingem.»

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Fonte da imagem: aqui [pintura de Katerina Apostolakou]

Autodefesa penal por advogado

A Relação de Guimarães no seu Acórdão de 18.12.2017 [processo n.º 143/15.6T9PTL-B.G1, relatora Maria José Matos, texto integral aqui] reafirma a proibição da autodefesa penal por advogado, ou seja, numa variante do problema, a proibição de advogado ser defensor em causa própria. 

A questão coloca-se ante a aplicabilidade ao ordenamento nacional do estatuído na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, concretamente o seu artigo 6º, n.º 3, a), segundo o qual: «c) Defender-se a si próprio ou ter a assistência de um defensor da sua escolha e, se não tiver meios para remunerar um defensor, poder ser assistido gratuitamente por um defensor oficioso, quando os interesses da justiça o exigirem».

Segundo o sumário do aresto:

«I) No processo penal o arguido que é advogado não se pode auto-representar na prática de actos que a lei reserva ao defensor (artº 64º, nº 1, do CPP), sendo que tal orientação legal é conforme com a Lei fundamental.
II) É o que sucede no caso dos autos, em que o arguido, não obstante a sua qualidade profissional de advogado não tem capacidade, porque para tal não tem legitimidade, para se auto-representar, nomeadamente para apresentar um requerimento onde, para além do mais, suscita a invalidade da nomeação de Defensor Oficioso e, bem assim para requerer a abertura de instrução, questões que pela sua própria natureza implicam discussão de direito que, assim, tem que ser operada pelo pelo Defensor do arguido e, não já, pelo próprio.»

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Tal posição tem sido a acolhida pela jurisprudência, como o consigna o Acórdão na sua fundamentação. 
Assim, «o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12-10-2011, onde se pode ler: “No processo penal o arguido que é advogado não se pode auto-representar na prática de actos que a lei reserva ao defensor [art. 64.°, nº 1, do CPP]. Esta solução legal é conforme à CRP e não afronta as disposições constantes de instrumentos internacionais sobre a matéria, designadamente, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos”; 
E ainda do Tribunal Constitucional, o Acórdão proferido no âmbito do processo nº 58/2001, em que foi Relator Bravo Serra e onde se pode ler: “Significará isto que os direitos fundamentais consistentes no asseguramento da totalidade das garantias de defesa em processo penal e na liberdade de escolha de defensor por parte do arguido impõem que este (naquele tipo de processo), ao menos sendo advogado, se o desejar, possa defender-se a si mesmo? A esta questão responde o Tribunal negativamente. Efectivamente, a tese do recorrente só seria de aceitar se se partisse de uma posição de harmonia com a qual sendo o arguido um advogado (regularmente inscrito na respectiva Ordem), a sua «auto-representação» no processo criminal contra si instaurado representasse, de modo objectivo, um melhor meio de se alcançar a sua defesa e se a lei processual penal não reconhecesse ao arguido um conjunto de direitos processuais estatuídos, verbi gratia, no art° 61° nº 1 e 63, n° 2, quanto a este último avultando o de poder pelo mesmo arguido, ser retirada eficácia a actos processuais praticados pelo seu defensor em seu nome, se assim o declarar antes da decisão a tomar sobre tal acto. E é justamente dessa posição que se não pode partir. Não se nega que, na óptica (naturalmente subjectiva) do recorrente, este possa entender que a sua defesa em processo criminal seria melhor conseguida se fosse prosseguida pelo próprio na qualidade de «advogado de si mesmo», do que se fosse confiada a um outro advogado. Só que, como este Tribunal já teve oportunidade de salientar (cfr. citado Acórdão n° 252/97) “há respeitáveis interesses do próprio interessado, a apontar para a intervenção do advogado, mormente no processo penal», sendo certo que, «mesmo no caso de licenciados em Direito, com reconhecida categoria técnico-jurídica, a sua representação em tribunal através de advogado, em vez da auto-representação, tem a inegável vantagem de permitir que a defesa dos seus interesses seja feita de modo desapaixonada», ou, como se disse no Acórdão nº 497/89 (publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional 14° volume, 227 a 247), “mesmo relativamente aos licenciados em Direito (enquanto parte) se pode afirmar com Manuel de Andrade (in Noções Elementares de Processo Civi4 p. 85), que «às partes faltaria a serenidade desinteressada (fundamento psicológico [...] que se fazem mister à boa condução do pleito’». A opção legislativa decorrente da interpretação normativa em causa, que exige que o arguido, mesmo que advogado, seja defendido por um advogado que não ele, não se vê que seja contraditada pela Constituição. O agir desapaixonado torna-se, desta arte e de modo objectivo, uma garantia mais acrescida no processo criminal o que só poderá redundar numa mais valia para as garantias que devem ser prosseguidas pelo mesmo processo, sendo certo que, como se viu acima, ao se não poder silenciar a corte de outros direitos consagrados ao arguido pela lei adjectiva criminal, isso redunda na conclusão de que se não descortina uma diminuição constitucionalmente censurável das garantias que o processo criminal deve assegurar. De outro lado, como resulta da transcrição do acima citado comentador da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o preceituado na alínea c) do n° 3 do art. 6° não impede os Estados aderentes de imporem, por via legislativa, a obrigação da representação dos arguidos por intermédio de advogado. Sequentemente, não se vislumbra que a interpretação normativa em causa seja colidente com qualquer preceito ou princípio constante da lei Fundamental.”
Ponderando, ainda, no seguimento desta fundamentação por nós supra aduzida de que o arguido não pode representar-se a si próprio entendemos, também, que requerimento de abertura de Instrução (onde, de resto, o arguido suscitou, recorde-se, também, matéria de direito: “invalidades do Inquérito” e sustentando, por referência à Instrução que está em causa “um problema de interpretação e de aplicação do direito”), tem de ser subscrito por Advogado, permitindo-nos citar, a este específico propósito, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10-02-2009, CJ, 2009, TI, pág.164, onde se pode ler: “O requerimento de abertura da instrução carece de estar assinado pelo mandatário ou defensor do arguido, mesmo sendo este advogado constituído arguido nos autos, estando vedado que se represente a si mesmo”; nesta sequência e porquanto, apesar de instado para o efeito, o arguido e respectivo defensor oficioso não regularizaram o processado, no prazo fixado, ao abrigo da jurisprudência supra citada e ainda do art. 287.°, nº 3, do Código de Processo Penal, o tribunal decide rejeitar o requerimento de abertura de Instrução formulado nos autos pelo arguido A. P., com fundamento na inadmissibilidade legal.»

Efeito da violação do artigo 16º do CPP

Será a violação do limite estabelecido pelo artigo 16º, ns.º 3 e 4 do CPP causa de incompetência do Tribunal. A Relação de Évora entende que não, revogando, porém, a sentença que excedeu tal limite, reconduzindo-a àquele. 

Eis o decidido pelo Acórdão proferido a 21.12.2017 [162/14.0PATVR.E1, relator João Latas, texto integral aqui], cujo sumário é:

«1. Resulta com clareza do art. 16.º nºs 3 e 4 do CPP que tanto no caso de unidade criminosa como de concurso de crimes o tribunal singular não pode aplicar pena superior a 5 anos de prisão quando o MP fizer uso da possibilidade de sujeitar o arguido a julgamento por tribunal singular prevista naquele art. 16.º nº3 do CPP.
2. A preterição daquele limite não constitui, porém, violação de norma de competência do tribunal com a correspondente nulidade (al. e) do art. 119.º do CPP), contrariamente ao que parece entender o arguido recorrente, uma vez que o art. 16.º do C. Penal não prevê a competência de outro tribunal para aplicar pena superior a 5 anos de prisão, antes fixa um novo limite máximo da pena aplicável, conforme entendimento há muito estabilizado. 
3. Assim, verifica-se erro de direito por violação do limite máximo de pena legalmente estabelecido, pelo que impõe-se a revogação da sentença recorrida nesta parte, determinando-se, em substituição, a pena única a aplicar dentro da moldura legal resultante dos nºs 3 e 4 do art. 16º., de acordo com os critérios estabelecidos no art. 77.º do C. Penal.
4. Uma vez que o tribunal de julgamento não considerou provados ou não provados factos alegados pelo arguido com interesse para a determinação da sanção, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto com esse fundamento não é admissível por falta de objeto, verificando-se antes o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada previsto na al. a) do nº2 do art. 410.º do CPP que implica o reenvio do processo para novo julgamento parcial, nos termos do art. 426.º do CPP, sobre os factos invocados pelo recorrente e não apreciados pelo tribunal a quo
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Interessante também, por significar uma alteração da posição do relator relativamente a entendimento pretérito que mantinha sobre o tema, o seguinte excerto:

«[...]3.2.1. Quanto à invocada nulidade de sentença, o arguido recorrente não completara ainda 21 anos de idade à data dos factos (cfr. arts 1º e 4º do Dec.-lei 401/82 de 23 de setembro) pelo que é-lhe aplicável, em abstrato, o regime dos jovens adultos previsto naquele diploma, sendo obrigatório proferir decisão sobre a aplicação do regime dos jovens adultos pelo tribunal de julgamento sempre que se mostrem verificados os seus pressupostos formais, como acontece no caso presente, conforme entendimento jurisprudencial pacífico.
Porém, o tribunal a quo nada disse sobre a aplicação ao arguido do regime dos jovens adultos, pelo que verifica-se nulidade de sentença por omissão de pronúncia nos termos do art. 379º nº1 c) do CPP, como é entendimento comum, mas que não seguíamos (conforme reafirmado em recente acórdão de 10.10.2017), alterando a nossa posição a esse respeito por considerarmos que a relevância e autonomia da aplicação do regime dos jovens adultos ou, por exemplo, da suspensão da execução da pena ou outra pena de substituição, devem considerar-se questões que o tribunal a quo deve apreciar para efeitos do art. 379 nº 1 c) do C.P.Penal, sem prejuízo de o tribunal de recurso conhecer das questões de que o tribunal a quo deixou de conhecer, de acordo com a regra da substituição ao tribunal recorrido, caso entenda nada obstar à sua apreciação, tal como expressamente se estabelece no art. 665.º do N.C.P.Civil.
In casu, a Relação não dispõe de todos os dados para a decisão uma vez que os factos a julgar na sequência do reenvio relevam para a decisão omitida sobre a aplicação, em concreto, do regime dos jovens adultos, pelo que, verificada a apontada nulidade de sentença, cumpre ao tribunal a quo decidir a questão omitida.»

Revista "O Direito"


Publicado o número correspondente a 2017. Eis a sinopse.

DOUTRINA
-» Francisco Aguilar, Ensaio sobre o Direito penal da família
-» Hidemberg Alves da Frota, Os direitos fundamentais das minorias sexuais e de gênero: análise de viradas paradigmáticas no panorama jurídico da Índia, Paquistão e Nepal
-» Efigénia Marabuto Tavares, A (in)exigência da celebração de um acordo sobre a liquidação/partilha do património comum em sede de divórcio por mútuo consentimento ? uma análise comparativa
-» Fábio Nave Moreira, A supressão do direito ao dividendo prioritário atinente às ações preferenciais sem voto
-» José Miguel Vitorino, A conferência procedimental: estudo do regime e análise dos seus problemas
-» Arnaldo de Lima Borges Neto, Cartas de conforto: estado das questões numa perspectiva luso-brasileira
-» Miguel Alexandre Duarte Santos, O beneficiário nas operações de pagamento de transferência escritural de fundos

JURISPRUDÊNCIA ANOTADA
-» Declaração de património e rendimentos de titulares de cargos públicos e administradores da Caixa Geral de Depósitos
-» Acórdão do Tribunal Constitucional / Plenário, nº 32/2017, de 1 de fevereiro
Anotação por Jorge Miranda

RECENSÃO
Rui Marques, Estudios de Derecho Fiscal Romano, de Alfonso Agudo Ruiz, Universidade de La Rioja, Dykinson, S. L., Madrid, 2016

Pacto para a Justiça


Não sei em que termos decorreram as reuniões relativas ao Pacto par a Justiça. Li pelos jornais. Suponho que em dois dias seria difícil ter chegado a grande consenso salvo a haver um trabalho prévio de preparação e de negociação, que ignoro também se ocorreu. Além disso o que foi acordado não foi sequer publicado. Dizem que isso só depois de ser tudo apresentado ao Presidente da República. 
Por isso, remeto-me ao silêncio, quer quanto à matéria, quer quanto à metodologia, quer, enfim, quanto ao embargo da difusão da informação pública e à condição resolutiva do segredo.

Acórdãos do STJ: estagnou a publicação?


Os últimos acórdãos publicados pelo Supremo Tribunal de Justiça são de 12 de Outubro do passado ano. Que se passa? Voltámos, na era digital, ao ritmo do Boletim do Ministério da Justiça?

CNSF: reguladores e ROC's/SROC's

Foi divulgado o "Entendimento conjunto da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (“ASF”), do Banco de Portugal (“BdP”) e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (“CMVM”) relativo à articulação de competências entre estas Autoridades no que respeita à avaliação de revisor oficial de contas / sociedade de revisores oficiais de contas (“ROC/SROC”) para o exercício de funções em entidades sujeitas à supervisão da ASF ou do BdP". O texto pode ser encontrado aqui.

MiFID-II e MiFIR

Um milhão e setecentos mil parágrafos de normativos. Dois biliões de meio de dólares que custou à indústria financeira europeia adaptar-e às suas previsões. Eis o MiFID-II, a Diretiva 2014/65/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, relativa aos mercados de instrumentos financeiros e que altera a Diretiva 2002/92/CE e a Diretiva 2011/61/UE (JO L 173 de 12.6.2014, p. 349) e o Regulamento (UE) n.º 600/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho (MiFIR).
O texto essencial do primeiro está aqui, o do segundo aqui.
As orientações da ESMA [European Securities and Markets Authority] para o reporte de transações, manutenção do registo das ordens e sincronização dos relógios no âmbito da MiFID II estão aqui no site da CMVM.
Entrou tudo em vigor há dois dias. Os mercados esperavam o pior. Tudo correu bem, relógios sincronizados.
É a hiper-regulação no seu melhor. Do lado de lá do Atlântico sopram, entretanto, ventos de desregulação.

Profissões liberais e concorrência


A Autoridade da Concorrência divulgou, de acordo com os seus estatutos, os sectores que considera prioritários para o ano que agora se inicia, entre os quais as profissões liberais. Eis a lista integral:

-» Banca, Mercados Financeiros e Seguros
-» Telecomunicações e Media
-» Energia e Combustíveis
-» Saúde e Farmacêutico
-» Ensino
-» Distribuição e Alimentar
-» Ambiente e Gestão de Resíduos
-» Profissões Liberais
-» Transportes e Infraestruturas
-» Construção.

A notícia pode ser lida aqui.

Equilíbrio na multiplicação

A todos os que têm tido a paciência de visitar este espaço, aos que têm mantido a expectativa de que eu consiga manter presença regular, aos que concluem que é útil que eu mantenha a esperança nessa possibilidade, por esta ordem decrescente em qualidade e crescente em amizade,votos de um Bom Ano.
Podendo eu - o gerúndio, essa notável forma verbal, tanto lamúria de incapacidade como arfar da possibilidade - traria aqui informação actualizada sobre o que se vai passando nos vários domínios em que o Direito Criminal surge: não apenas as leis, mas as decisões que se assumem como da lei, não só as leis que vejo publicadas, mas aquelas que estão a ser produzidas e o que sobre tudo isso se escreve; e não só isso, porque quando o Direito irrompe, já antes na sociedade, em que o humano vive, na antropologia, que a este condiciona o ser, na cultura, que é a reflexão sobre o que é e o que deveria ser, algo sucedeu que merece referência e tem de ser reflectido. Mais, procuraria tornar este espaço, o das minhas próprias reflexões, assinando por baixo, porque a opinião responsabiliza.
Não ter sido assim deve-se a circunstâncias, não a questões de princípio: tem a ver com eu estar  felizmente, o digo, sobrecarregado com trabalho na profissão, com não me esgotar naquilo que apenas ao jurídico releva e também com não pretender tornar este local repositório de notícias de jornal, respeitável seja a imprensa.
O Patologia Social nasceu no dia 18 de Janeiro de 2005, ou seja, em breve vai fazer doze anos. Acompanhou as vicissitudes erráticas da minha vida e com isso se ressentiu, como, afinal, tanto mais do que me propus fazer. Durante este tempo fui sempre advogado mas tive como princípio não trazer casos meus de advocacia para aqui, nem indirectamente. 
Desde que o criei vi morrer, um após um, tantos blogs que eram leitura diária e companhia; outros tornaram-se em local de opinião política.
Aqui estamos, pois. Bom Ano a todos e que eu consiga a equação que dê lógica e equilíbrio à sucessiva multiplicação.

Informação no processo penal: Directiva da UE

A revista Julgar publica on line o texto integral de um artigo, da autoria de Júlio Barbosa e Silva sobre a Directiva 2012/13/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 22 de Maio de 2012 relativa ao direito à informação em processo penal. Ver aqui. Eis o resumo: 

Directiva 2012/13/UE de 22 de Maio de 2012, relativa ao direito à informação em processo penal, é uma das medidas do Roteiro para o Reforço dos Direitos Processuais dos Suspeitos ou Acusados em Processos Penais, estabelecendo objectivos concretos a vários níveis, (para reforço do princípio do reconhecimento mútuo), sendo evidente a influência da jurisprudência do TEDH no seu texto. Apesar de Portugal não ter transposto a Directiva, decorre das normas aqui previstas que poderá ter aplicação directa e deverá ser feita uma interpretação conforme do direito nacional, principalmente no tocante a direitos conflituantes, tentando garantir sempre um equilíbrio entre interesses da investigação e direitos de defesa, muito particularmente no campo daquilo que pode/deve ou não ser revelado ao arguido sobre factos e provas aquando dos primeiros interrogatórios, assumindo aqui o MP um papel essencial na forma como leva e constrói aqueles elementos. Procede-se, neste texto, à interpretação dos artigos que podem desencadear mais questões e, no âmbito da muita jurisprudência referida (nacional e do TEDH), suscita especial atenção (e quase duas mãos cheias de dúvidas e perplexidades), uma decisão do TC espanhol, que ensaia uma leitura e interpretação do artigo 7º, n.º 1 da Directiva, a qual dificilmente se poderá adequar ao direito português.

Palavras-chave: direito à informação em processo penal; acusação; direitos de defesa; Directiva 2012/13/UE; reconhecimento mútuo; acesso aos elementos do processo; interesses da investigação; carta de direitos; segredo de justiça.

[1. – Introdução; 2. – O Direito à informação sobre a acusação previsto no artigo 6º da Directiva; 3. – O artigo 7º da Directiva sobre o direito de acesso aos elementos do processo; 3.1. – O n.º 1 do artigo 7º da Directiva (e a leitura exagerada do TC espanhol?); 3.2. – O n.º 2 do artigo 7º da Directiva; 3.3. – O n.º 3 do artigo 7º da Directiva; 3.4. – O n.º 4 do artigo 7º da Directiva; 3.4.1. – As medidas de garantia patrimonial e o acesso aos elementos do processo no âmbito da Directiva; 4. – A Carta de Direitos; 5. – Conclusões.]

PGR: corrupção e criminalidade conexa

A PGR editou o relatório de síntese intitulado Corrupção e criminalidade conexa relativo aos anos 2014-2017. O texto integral pode ser consultado aqui. Eis alguns excertos.

Inquéritos instaurados

-» Nos anos 2014/2015 (de 01.09.2014 a 31.08.2015), 2015/2016 (de 01.09.2015 a 31.08.2016) e 2016/2017 (de 01.09.2016 a 31.08.2017) foram registados 5564 inquéritos relativos a crimes de corrupção e criminalidade conexa, nesta se compreendendo os crimes de abuso de poder, administração danosa, branqueamento, participação económica em negócio, peculato, recebimento indevido de vantagem e tráfico de influência. 

-» Numa análise comparativa, verifica-se que no período temporal em consideração o número de inquéritos registados por crime de corrupção aumentou 37,7% e o de abuso de poder 33%. Por outro lado, o número de inquéritos registados por crime de peculato, depois de um aumento de 17% no ano 2015/2016, observou um decréscimo de 7,2% no ano 2016/2017. Inversamente, no período 2016/2017 o número de inquéritos registados por crime de branqueamento de capitais sofreu um aumento de 15,8% relativamente ao ano 2014/2015, após uma inexpressiva diminuição no ano 2015/2016.

Inquéritos findos

-» No período temporal em consideração findaram 3337 inquéritos, dos quais 457 por acusação, 2734 por arquivamento e foi aplicado o instituto da suspensão provisória do processo em 146 inquéritos. O que significa que em 18,1% dos inquéritos encerrados foi exercida a ação penal pelo Ministério Público (457 acusações + 146 suspensões provisórias).

Decisões finais/condenações/por tipo de crime/2015-2016

-» Abuso de poder: prosseguiram 12 acusações. Foi proferida decisão transitada em 7 processos. 2 processos terminaram com condenação de 2 arguidos em pena de prisão suspensa na sua execução. 5 processos, envolvendo 10 arguidos, terminaram com absolvição. 2 processos, envolvendo 6 arguidos, encontram-se na fase de julgamento. 3 processos, envolvendo 5 arguidos, encontram-se na fase de recurso para tribunal superior. Nos processos findos, a taxa de condenação processual situou-se nos 28,6% e a taxa de condenação individual nos 16,7%.

-» Administração danosa: prosseguiu 1 acusação, contra 2 arguidos, encontrando-se o processo na fase de julgamento.

-» Branqueamento de capitais: prosseguiram 10 acusações. Foi proferida decisão transitada em 3 processos. 2 processos terminaram com condenação de 2 arguidos em pena de prisão suspensa na sua execução e a absolvição de 1 arguido. 1 processo, envolvendo 1 arguido, terminou com absolvição. 4 processos, envolvendo 36 arguidos, encontram-se na fase de julgamento. 3 processos, envolvendo 34 arguidos, encontram-se na fase de recurso para tribunal superior. Nos processos findos, a taxa de condenação processual situou-se nos 66,7% e a taxa de condenação individual nos 50%.

-» Corrupção: prosseguiram 22 acusações. Foi proferida decisão transitada em 13 processos. 7 processos, envolvendo 9 arguidos, terminaram com condenação de:  6 arguidos em pena de prisão suspensa na execução;  2 arguidos em pena de prisão substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade;  1 arguido em pena de multa. Foi aplicado o instituto da suspensão provisória do processo na fase da instrução em 1 processo, envolvendo 1 arguido. 5 processos, envolvendo 16 arguidos, terminaram com absolvição. 7 processos, envolvendo 78 arguidos, encontram-se na fase de julgamento. 33 2 processos, envolvendo 5 arguidos, encontram-se na fase de recurso para tribunal superior. Nos processos findos, a taxa de condenação processual situou-se nos 61,5% e a taxa de condenação individual nos 38,5%.

-» Participação económica em negócio: prosseguiram 3 acusações. 1 processo, envolvendo 1 arguido, terminou com absolvição. Num processo, envolvendo 1 arguido, foi proferido despacho de não pronúncia na fase de instrução. 1 processo, envolvendo 3 arguidos, encontra-se na fase de recurso para tribunal superior.

-» Peculato: prosseguiram 76 acusações. Foi proferida decisão transitada em 51 processos. 37 processos, envolvendo 44 arguidos, terminaram com condenação de:  37 arguidos em pena de prisão suspensa na execução;  1 arguido em pena de prisão substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade;  2 arguidos em pena de prisão substituída por multa;  1 arguido em pena de multa. Em processos em que existiu condenação foi ainda proferida absolvição relativamente a 3 arguidos. 12 processos, envolvendo 13 arguidos, terminaram com absolvição. Em 2 processos, envolvendo 3 arguidos, foi proferido despacho de não pronúncia na fase de instrução. 18 processos, envolvendo 36 arguidos, encontram-se na fase de julgamento. 7 processos, envolvendo 9 arguidos, encontram-se na fase de recurso para tribunal superior. Nos processos findos, a taxa de condenação processual situou-se nos 72,6% e a taxa de condenação individual nos 68,3%.

-» Recebimento indevido de vantagem: prosseguiram 3 acusações 3 Foi proferida decisão transitada em 2 processos, envolvendo 5 arguidos, os quais terminaram com condenação de:  1 arguido em pena de prisão suspensa na execução;  2 arguidos em pena de multa;  2 arguidos em pena de prisão substituída por proibição de exercício da profissão. 1 processo, envolvendo 3 arguidos, encontra-se na fase de julgamento.

Denúncias on line

-» No ano de 2014, foram recebidas 1941 denúncias através da aplicação “Corrupção- Denuncie aqui”, existente no Portal do Ministério Público. No mesmo período temporal, foram analisadas 1943 denúncias recebidas através da referida aplicação , as quais deram lugar à instauração de 19 inquéritos e 20 averiguações preventivas, à remessa de 597 denúncias a outras entidades e ao arquivamento de 1307 denúncias.

-» No ano de 2015, foram recebidas 1476 denúncias através da referida aplicação. No mesmo período temporal, foram analisadas 1484 denúncias ali recebidas , as quais deram lugar à instauração de 110 inquéritos e 28 averiguações preventivas, à remessa de 505 denúncias a outras entidades e ao arquivamento de 841 denúncias.

-» No ano de 2016, foram recebidas e analisadas 1482 denúncias através da mesma aplicação, as quais deram lugar à instauração de 210 inquéritos e 32 averiguações preventivas, à remessa de 434 denúncias a outras entidades e ao arquivamento de 806 denúncias. 

-» No ano de 2017, até ao dia 31 de outubro, foram recebidas e analisadas 1510 denúncias através da mesma aplicação, as quais deram lugar à instauração de 139 inquéritos e 10 averiguações preventivas, à remessa de 400 denúncias a outras entidades e ao arquivamento de 701 denúncias.

Comunicações por prevenção de branqueamento de capitais

-» Ano de 2014 – foram recebidas 2903 comunicações e, subsequentemente, instaurados 60 inquéritos. Foi ainda determinada a suspensão de 43 operações bancárias, em que estavam em causa a movimentação de 34,3 milhões de euros e 2,2 milhões de dólares americanos.

-» Ano de 2015 – foram recebidas 3865 comunicações e, subsequentemente, instaurados 63 inquéritos. Foi ainda determinada a suspensão de 64 operações bancárias, em que estavam em causa a movimentação de 47,1 milhões de euros e 9,5 milhões de dólares americanos.

-» Ano de 2016 – foram recebidas 5186 comunicações e instaurados 41 inquéritos. Foi determinada a suspensão de 41 operações bancárias, abrangendo a movimentação de 25,5 milhões de euros e 2,7 milhões de dólares americanos.

-» Ano de 2017 (até 31.10) – foram recebidas 5018 comunicações e instaurados 42 inquéritos. Foi determinada a suspensão de 42 operações bancárias, abrangendo a movimentação de 9,2 milhões de euros e 2,6 milhões de dólares americanos.

Violência doméstica: EARHVD

Foi publicado a 16 deste mês o primeiro relatório da Equipa de Análise Retrospectiva de Homicídio em Violência Doméstica foi aprovado no dia 31 de Outubro de 2017.
Reporta-se a dois crimes ocorridos no dia 27 de Setembro de 2015 (um homicídio consumado e um homicídio tentado), cuja decisão judicial definitiva foi recebida na EARHVD no dia 7 de abril de 2017.A equipa é presidida pelo Procurador da República, Rui do Carmo.
O acesso ao site e ao referido relatório pode ser obtido aqui

Prazos de inquérito: um esclarecimento

Participei na passada quinta-feira, 19 de Outubro,em Coimbra, num evento organizado pela Comissão de Direitos Humanos, Questões Sociais e da Natureza da Ordem dos Advogados dedicado ao tema dos prazos de inquérito. O tema é actual e projecta-se em processos pendentes, alguns em que tenho intervenção profissional. Procurei, por uma questão ética, explicitar essa situação e manifestar que gostaria que ficasse claro que a minha participação não tinha a ver com uma forma indirecta de fazer advocacia no espaço público. Ficam aqui algumas notas sobre o que penso sobre o assunto, até por terem surgido dúvidas quanto ao que ocorreu.

De facto, talvez pelo melindre do tema e dúvidas que vejo surgir quanto à razão do evento, se torne necessário deixar aqui, por apontamento, algumas das conclusões que exprimi.

-» afirmei que os prazos de duração do inquérito processual penal são «prazos máximos», como decorre literalmente da epígrafe do artigo 276º do CPP e se repete no corpo do mesmo;

-» permiti-me a ousadia de lembrar que, tendo sido membro na comissão de que emergiu em 1986 o projecto de lei que, por autorização legislativa, se tornou Código [comissão essa presidida pelo Doutor Figueiredo Dias] e, ante a consciência de que se estariam, sob a bandeira do Estado de Direito Democrático, a consagrar prazos de averiguação superiores aos da legislação do regime anterior, e fazendo-se isso em nome da necessária maior eficácia quanto ao combate à criminalidade, agora mais complexa e difícil de descortinar, teria de se fixar, como sucedeu com a minha aquiescência, uma duração máxima ao inquérito pré-acusatório para que àquela maior extensão do tempo de inquérito não se somasse a indeterminação do prazo;

Para a presidência de tal Comissão, criada pelo ministro da Justiça de então, Dr. Rui Machete, foi designado o Doutor Jorge de Figueiredo Dias, sendo seus membros o Dr. José Narciso da Cunha Rodrigues, que mais tarde viria a ser empossado no cargo de Procurador Geral da República, mantendo-se, no entanto, em funções na Comissão, o Dr. Manuel Maia Gonçalves, Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, o Doutor Manuel da Costa Andrade, deputado à Assembleia da República e Professor da Faculdade de Direito de Coimbra, o Dr. João Manuel Franqueira de Castro e Sousa, então Assistente da Faculdade de Direito de Lisboa, e o autor deste livro. Outras individualidades vieram a participar nos trabalhos.
O texto do Projecto de Código está publicado em suplemento ao Boletim do Ministério da Justiça de 1986; a Proposta de Lei de autorização legislativa, contendo em anexo também o texto do Projecto, foi publicado pela Assembleia da República, em separata nº 7/IV ao Diário da Assembleia da República de 12 de Maio de 1986.

-» lembrei que, em outros locais do Código, há expressão dessa mesma ideia, e é ela que deu corpo, aliás, ao novo incidente da aceleração processual que se criou e que teve de se modificar por via da rejeição parlamentar do princípio constante da lei de autorização legislativa que o consagrava, esvaziando o mesmo da eficácia prática que se pretendia, a de injunção de cumprimento dos actos em atraso, de forma a prevenir a inconstitucionalidade que de outro modo seria decretada, estando solicitada a fiscalização preventiva do diploma em sede de exame pelo Tribunal Constitucional;

O projecto de Código foi sujeito ao Parlamento, para que este concedesse ao Governo autorização para o legislar, mas acompanhado de uma proposta de Lei de autorização legislativa em que a norma sob o sentido do diploma a aprovar era de uma considerável extensão. Fui encarregado pelo ministro da Justiça no momento, o falecido Dr. Mário Raposo, Bastonário que tinha sido da Ordem dos Advogados, de redigir tal projecto, com acompanhamento da comissão de onde sairia o projecto de Código, sendo essa a minha fonte de ciência quanto ao que sucedeu.

-» admiti que não se previu, é certo, outra sanção para o incumprimento do prazo de inquérito que não fosse a que decorresse de se poder considerar invalidade [por irregularidade, artigos 119º e 123º do diploma] de acusação fundada em inquérito ilegal por duração superior ao tempo imposto pela lei [de imposição injuntiva se trata e não de mera sugestão ou recomendação] ;

-» instado a tomar posição sobre a dicotomia em que o encontro se estava a centrar [prazo ordenador ou peremptório] exprimi claramente dúvidas quanto a tratar-se de prazo peremptório de cujo incumprimento decorresse a caducidade do direito de acusação que o inquérito preparava, ironizando que, afinal, todos os prazos são "ordenadores", pois visam conferir ordem aos actos processuais [pois, a meu ver, inexiste, aliás, comando legal de onde a caducidade se possa extrair].

Indo mais longe nas considerações, e já na fase do debate, acrescentei duas opiniões, agora quanto à solução do problema.

-» depois de se ter chegado a um ponto em que a jurisprudência quase pacífica [com uma excepção que foi, aliás, lembrada em outra intervenção] consagrou a doutrina dos prazos de inquérito serem peremptórios, e dado que a questão se estava a discutir num momento em que, uma orientação diversa [no sentido da perempção e da caducidade do direito a acusar], se projectaria em processos pendentes, alguns com larga retumbância social, permiti-me supor que não seria de esperar ou exigir da magistratura judicial solução que tivesse de suportar, junto da comunidade, o preço dos efeitos de tais consequentes arquivamentos, pois tudo pareceria proteccionismo a certas situações específicas;

-» lembrei que, quando, por efeito do Acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/89, um número incontável de processos foram pura e simplesmente arquivados, constatou-se que um número imenso destes, estava pendente em inquérito há mais de dez anos e [facto extraordinário] nenhum clamor público se levantou, sendo que a dor do anónimo [sujeito à cidadania de segunda de ser investigado durante tal prazo] não aceitava que fosse menor do que a dor de figuras públicas sujeitas a demoradas pendências, ambas respeitáveis, mas tudo a demonstrar que se trata de problema irresoluto mau grado a sua vetustez; 

-» explicitei que, no meu ponto de vista a investigação criminal [enquanto tal] não tem de estar sujeita a prazos, sim o inquérito enquanto categorial processual formal e nomeadamente a partir do momento em que corre contra pessoa determinada e, por maioria de razão, quando se constitui um cidadão como arguido;

-» parecia-me, pois, enfim, e disse-o, que, neste complexo contexto, a questão teria de ser resolvida por via legislativa, pelo estabelecimento claro de normas sobre os prazos máximos de inquérito com determinação das consequências para o seu desrespeito e [já agora] quanto ao prazo de formulação do requerimento de abertura de instrução, que deveria  ter uma duração proporcionada à duração do inquérito, fixada numa percentagem desta. Mais acrescentei que uma solução possível quanto À obtenção do cumprimento de prazos de inquérito seria a entronização de uma espécie de habeas actum pelo qual se obtivesse uma injunção judicial visando a prática dos actos processuais em falta.

-» tal alteração legislativa não deveria, por previsão expressa, aplicar-se aos processos pendentes.

Eis, o que sinto ser necessário trazer a público. Está prometida a edição formal do texto. Aqui são só breves apontamentos.

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Colóquio sobre contra-ordenações: Porto, dia 18 de Setembro

Tem lugar no próximo dia 18, no Porto, um Colóquio, organizado pelo Forum Penal, sobre contra-ordenações para o qual tiveram a gentileza de me convidar. 
Escolhi como tema uma das facetas esdrúxula do regime do processo contraordenacional que se me afigura grave: a aplicabilidade, "consoante", do regime subsidiário processual penal. É a jurisprudência das conveniências na sua mais insegura expressão.