Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Prazo de recurso: revogação da suspensão da pena

O Acórdão n.º 422/2005, de 17 de Agosto de 2005 do Tribunal Constitucional «julga inconstitucionais, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, as normas constantes dos artigos 113.º, n.º 9, 411.º, n.º 1, e 335.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, conjugadas com o artigo 56.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, interpretadas no sentido de que o prazo de interposição de recurso, pelo condenado, de decisão que revo­gou a suspensão da execução de pena de prisão se conta da data em que se considera efecti­vada a sua notificação dessa decisão por via postal simples».

Reconheça-se o aburdo!

É de facto um paradoxo que na fase de inquérito o reconhecimento de alguém se deva efectuar com tantas cautelas, mormente pelo modo expresso no artigo 147º do CPP [com o uso da «fila» dos semelhantes] e, no entanto, em sede de julgamento, onde tem lugar a prova decisiva, tal possa ser efectuado limitando-se quem reconhece a apontar o dedo para aquele que, sentado no «banco dos réus», está ali, isolado, pronto para ser facilmente reconhecível. Mais do que um paradoxo, é um absurdo. E, no entanto, a lei onde se prevê o reconhecimento, não restringe o seu âmbito de previsão, pois não diz que não se aplica à audiência de julgamento. E, no entanto, na fase de instrução, ante juiz, o reconhecimento segue o rito do inquérito. Paradoxo ou absurdo, uma coisa é certa: tudo isto é constitucional. Di-lo o Acórdão n.º 425/2005 do Tribunal que «não julga inconstitucional o 147º, nos 1 e 2, do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual quando, em audiência de julgamento, a testemunha, na prestação do seu depoimento, imputa os factos que relata ao arguido, a identificação do arguido efectuada nesse depoimento não está sujeita às formalidades estabelecidas em tal preceito - , de 25 de Agosto de 2005».
Li isto e lembrei-me do julgamento em que uma simpática velhinha, a quem havia sido sacada, por esticão, a sua malinha, na Avenida de Roma, declarando em audiência ante três jovens, que estavam a ser julgados por coisas parecidas, entre as quais a da sua carteira, convidada pelo juiz, igualmente amável, a identificar quem seria o autor, plantou o dedo em direcção a um deles, logo o que negava ter tido algo a ver com aquele «assalto», e assim o manteve, alguns minutos que pareciam horas, até que, decidindo-se rematou: «este não era, senhor juiz, porque é muito novinho». Escusado será dizer que o rapaz ia tendo um ataque cardíaco, ante esta situação, sem dúvida, perfeitamente constitucional!

O senhor morgado

Primeiro, foi a intensa campanha e demolidora a atacar os privilégios. Depois foi o deitar a mão. Finalmente, foi o instalarem-se os novos senhores, banqueteando-se com o poder que os outros tinham. Foi assim quando a burguesia florescente atacou os morgados, vendo no sistema vincular a mãe de toda a miséria agrícola e o pai de todas as fomes alimentares. Num instante, estava a velha nobreza senhorial despojada das suas terras. Os famintos e os miseráveis, esses, assistiram, indiferentes, à chegada dos novos barões. Hoje, muitos magistrados não percebem porque motivo muita gente, atiçada pelo Governo, os olha como uns privilegiados. Esperem para ver. Os novos morgados já cá estão.

Magistrados: tesos mas cosmopolitas

O ministro da Justiça diz que a formação de magistrados vai passar a ter «avaliação internacional». A frase tem recorte terceiro-mundista. É a confissão tristonha de uma incapacidade própria, a rendição nacional ao estrangeiro. Além disso, num país em que nem dinheiro havia na Procuradoria-Geral para pagar traduções, estas paródias pseudo-cosmopolitas são de esbarrigar a rir. É como os países onde se passa fome: há sempre consultores da FAO para calcular o índice de subnutrição.

O reino dos pathos

Eu ia dizer que amanhã abrem os tribunais, mas depois vêm logo gregos dizer que estão sempre abertos. Depois ia dizer que lá recomeça o ano judicial, mas depois admoestam-me troianos, dizendo que o ano em causa começa no dia um de Janeiro, pois coincide com o ano civil. Ora como o primeiro de Janeiro é feriado, a conclusão única possível é que o ano judicial começa quando os tribunais estão fechados, o que, sendo lógico e verdadeiro, desagrada a gregos e troianos. Bom, no meio disto e correndo o risco de repetir a história do velho, do rapaz e do burro, na qual já só dois papéis me são possíveis, direi assim: amanhã lá voltamos para os tribunais. Na Grécia antiga, nos dias de teatro, os tribunais fechavam e os presos eram soltos. Tudo vivia na embriaguez dionísica fautora de vida. Hoje estamos mais sóbrios, mais abertos, mas mais presos. Roma chegou, imperial e decadente, com os seus generais.

Rapidinha

A Polícia Judiciária informa que: «A Polícia Judiciária, através da Direcção Central de Investigação da Corrupção e Criminalidade Económica e Financeira (DCICCEF), procedeu à detenção, em Lisboa, de dois cidadãos romenos, pela prática de crimes de contrafacção de cartões de crédito e burla informática». Até aí tudo bem. O que sobressai é que a operação teve direito a nome de código. Também não se estranha. Começa a ser um hábito, extrapolar para a acção policial esta técnica de origem militar. A questão é que às vezes o nome é algo equívoco. No caso alguém escolheu o nome «Operação Meia-Hora». Ainda há é que saber porquê.

É só fumaça!

Um dos que entende que a greve dos juízes lhe lembra a de outro órgão de soberania, a greve do Governo quando era primeiro-ministro o falecido almirante Pinheiro de Azevedo, esquece um pormenor. É que o destemido almirante, quando se decidiu a tal inesperado acto, fê-lo pois o Governo havia sido sitiado por uma manifestação, ao que ele reagiu, convocando a greve, com a lendária frase «é que a mim chateia-me ser cercado». Ora aí está um argumento que os dirigentes sindicais poderiam hoje repristinar: é que a nós, na Justiça, chateia-nos ser cercados!

O Ministério em duplicado

Não é vontade de dizer mal, é só ironia. Há dias criticávamos o «site» do Ministério da Justiça por anunciar para amanhã o que já tinha acontecido há semanas. Agora, revigorados pelas férias, lá retomaram o atraso. O que não precisavam é de exagerar. Fui lá hoje e vinha a seguinte notícia: «RECLUSOS PROMOVEM TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE O Ministério da Justiça vai assinar protocolos para o desenvolvimento do programa “Trabalho a Favor da Comunidade” no concelho do Cartaxo, numa cerimónia que contará com a presença do secretário de Estado Adjunto e da Justiça, José Conde Rodrigues, e que d». Tal e qual assim, a acabar com o «d». Interessante era, porém, a notícia a seguir: «RECLUSOS PROMOVEM TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE O Ministério da Justiça vai assinar protocolos para o desenvolvimento do programa “Trabalho a Favor da Comunidade” no concelho do Cartaxo, numa cerimónia que contará com a presença do secretário de Estado Adjunto e da Justiça, José Conde Rodrigues, e que d». Exactamente assim, duas vezes! E igualmente a acabar em «d». Ante isto estamos na dúvida: o Ministério, ante o abrir dos tribunais, já gagueja, ou será o eco?

Bloguemos, pois

Dizem os chineses que onde está a doença está a cura. Há na blogoesfera o vírus de as pessoas, por vezes, se irritarem umas com as outras. Mas há nela um antídoto fantástico, que é o de falarem umas com as outras. A epimedia dos anti-corpos é de factos uma extraordinária vacina. Bem tentam os organismos de classe que tentemos dialogar juízes, procuradores, advogados, polícias e funcionários. A falta de tempo e o excesso de interesses, impedem-no muita vez, as más experiências desaconselham-no, quase sempre. Aqui, no ciber-espaço, entre mortos e feridos, lá vamos andando. Há uns que estão à beira de desanimar, outros se lhes substituem. Para a semana começa o ano judicial para todos, ou seja, todos os tribunais de porta aberta. O Ministério que da Justiça se chama, promete novidades. Bloguemos, pois, à sua alma!

O primeiro moicano

Há no ciber-espaço um jovem «blog» chamado http://oprimeiromoicano.blogspot.com/. O seu autor, com humildade, no primeiro «post» com o qual o inaugurou escreveu: «Irei iniciar hoje uma das minhas miseráveis reflexões sobre o estado da magistratura portuguesa. Consciente de que ninguém as irá ler, sinto-me à vontade para as publicar». Ora importa que se diga: há quem leia: eu, pelo menos. E seguramente muitos outros leitores haverá, que se calhar, fingem que não. Leio e com muito interesse.