Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




A generalização encapelada

Quando um professor como este aqui escreve que «A percepção que os investidores estrangeiros têm dos advogados portugueses é que estes defendem os interesses uns dos outros à custa dos seus clientes», «bastantes intervenientes locais são sobejamente conhecidos por se locupletarem com o que podem. As acções em tribunal confirmam esta situação deplorável. Os seus advogados acham que isto é normal», «a profissão não só se alimenta da ineficácia do sistema como a promove», não mandaria a gravidade do que se afirma que individualizasse, a honradez intelectual que não generalizasse?
A generalização é uma forma demagógica de se ter sempre razão pelo modo mais fácil. Na hora da pergunta há sempre a resposta salvadora de que não se visava nem A nem B mas um indeterminado conjunto X. Vale em ambientes em que todos se sentem culpados e poucos têm coragem para perguntar.
É que a inteligência manda que se pergunte: quais investidores estrangeiros a propósito de que advogados portugueses? Que advogados é que acham «normal» que outros colegas seus se locupletem com o que é alheio? E já agora: que professores são estes que assim se permitem escrever como se fossemos todos um bando de gatunos e uma corja de idiotas que, timoratos e com má moral, vestíssemos o silêncio pesado dos comprometidos?
Professor que é o autor da Universidade Católica portuguesa talvez fosse interessante sondar os seus colegas que, simultaneamente com o ensino advogam, quantos em grandes escritórios para clientes estrangeiros, o que é acham do estilo da sua prosa e do método de a escrever. E esperar que nenhum advogado dos muitos honrados e escrupulosos, que os há, não o encontre em público para tirar dúvidas.

P. S. Acabo de saber que o senhor professor se propõe resolver não só o problema dos advogados, mas a própria «crise mundial». Li aqui. Já entendi tudo. Desculpem ter feito perder o vosso tempo.

RMP 128

Saiu o n.º 128 da Revista do Ministério Público. Pontual e sempre com interesse. O sumário pode ser visto na íntegra aqui. Dos Estudos e Reflexões menciona-se:


9 | O Regulamento (CE) n.º 1060/2009 e o problema da qualidade e da necessidade das notações de risco: o caso particular da dívida soberana
ISABEL ALEXANDRE • ANA DINIZ
[Segunda parte Artigo iniciado no nº 127]

83 | O mérito, esse objecto jurídico não identificado
COLAÇO ANTUNES

117 | O princípio nemo tenetur na Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
JOANA COSTA

185 | A prova indiciária no processo penal
MARTA SOFIA NETO MORAIS PINTO

As notícias que se dão

A notícia já tem alguns dias «Governo compra Tribunal da Boa Hora por 6,15 milhões». O que não vi noticiado é o mecanismo concreto, documentado e pormenorizado, pelo qual se percebe como é que o Estado que tinha a disponibilidade do Tribunal da Boa Hora e a perdeu e agora para a recuperar vai levar um rombo de 6,15 milhões, isto segundo se noticia também para instalar lá o CEJ, tendo o Estado edifício para o CEJ, nem o que vai suceder ao edifício do CEJ. As notícias que se dão são as notícias que se encobrem.

Gravação inaudível

Houve jurisprudência segundo a qual a deficiência das gravações nas quais se documentava a prova oralmente produzida era uma mera irregularidade que deveria ser arguida até três dias depois de ao interessado terem sido facultados os suportes respectivos. Claro que normalmente eram solicitados quando se tratava de recorrer e para o efeito de preparar o recurso. E assim se iam ouvindo, porque quantas vezes eram dias e dias de audiências gravadas. Os três dias escoavam. E quando o imperceptível surgia era tarde demais, segundo essa visão jurisprudencial das coisas, para se clamar pela audibilidade. Outros entenderam que o prazo era de dez dias mas contados à mesma do dia em que os suportes eram colocados à disposição.
Com três ou dez dias recursos sobre a matéria de facto foram assim mortos à nascença, forma célere de despachar processos.
Saúda-se pois ao constatar que a Relação de Lisboa considerou [no seu Acórdão de 26.01.12, relator João Carrola, texto integral aqui] que « Iº Face à actual redacção do art.363, do Código de Processo Penal, introduzida pela Lei nº59/98, de 25Ago., a omissão (ou deficiência) de gravação constitui uma nulidade sanável, sujeita ao regime de arguição e sanação dos arts.120, nº1 e 121, do C.P.P., em conjugação com o art.9, do Dec. Lei nº39/95, de 16Fev.; IIº Essa nulidade pode ser arguida nas próprias alegações e dentro do prazo de recurso».
Veja-se da fundamentação este [longo mas] esclarecedor excerto:

«Acontece que depois de ouvir o CD da gravação da prova junto aos autos, verificamos que as deficiências são muitas, que todos os depoimentos têm falhas profundas traduzidas ora por interferências, ora por ruídos ou mesmo, em alguns casos, de nula audibilidade, como é referido no recurso.
Tem sido vasta a jurisprudência que se tem pronunciado sobre as consequências da omissão ou deficiência da gravação da prova, e que está longe de ser pacífica, o que nos conduz a aduzir algumas considerações quanto ao seu enquadramento jurídico.
Começando pela qualificação de tal deficiência, vemos que o art.º 363º do CPP, na actual redacção que lhe foi dada pela Lei nº 48/2007 de 29/08, define a falta de documentação da prova como uma nulidade processual, dispondo, concretamente que “as declarações prestadas oralmente na audiência são sempre documentadas na acta, sob pena de nulidade” (sublinhado nosso)
Também a deficiente gravação da prova, desde que não permita percepcionar o teor dos depoimentos e apreender o sentido da prova produzida, pode, da mesma forma, constituir nulidade. Isto porque, uma e outra, equivalem-se, ou seja, encontram-se num mesmo patamar de gravidade quanto à violação ou inobservância da respectiva disposição legal na medida em que não permitem alcançar o sentido dos depoimentos. Nestas circunstâncias, a deficiente gravação da prova deve ser equiparada à situação de falta (total ou parcial) da gravação – tal tem sido o sentido da jurisprudência, mesmo antes de a lei qualificar o vício como nulidade.
Como sabemos, a nossa lei processual consagra um amplo sistema de nulidades taxativas, estabelecendo o n.º 1 do art.º 118º que “a violação ou a inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei”.
E, como já afirmámos, a falta de gravação (ou a sua deficiência) está prevista como nulidade em disposição especial da lei processual (art.º 363º), e não estando prevista expressamente como insanável, nem constando do elenco previsto no artigo 119º, trata-se de nulidade sanável, dependente de arguição, sujeita ao regime do art.º 120º, do CPP.
O legislador, através do Decreto-Lei 39/95 de 16/02, havia institucionalizado no direito processual a admissibilidade do registo das provas produzidas em audiência de discussão e julgamento, começando o art.º 363º, do CPP, na redacção que lhe foi conferida pela Lei 59/98, de 25/08, por ser uma norma programática para o futuro, estabelecendo um princípio geral de documentação das declarações orais. E começaram por ser documentadas em acta apenas as declarações orais prestadas em audiência perante tribunal singular, embora com a possibilidade de os sujeitos processuais, por acordo, prescindirem da documentação, sendo sempre obrigatória no caso de audiência realizada na ausência do arguido.
Percorrida essa experiência, o legislador acabou por tornar a documentação obrigatória guiado pelo paradigma de um modelo que assegure um efectivo 2º grau de jurisdição em matéria de facto - tal é o desiderato da documentação dos depoimentos orais prestados na audiência.
A regulamentação do modo de gravação está prevista nos art.ºs 3.º a 9º do citado DL 39/95, ressaltando-se aqui que os meios técnicos instalados têm de ser fornecidos pelo tribunal, sendo manobrados por funcionários de justiça que hão-de respeitar na sua utilização os procedimentos técnicos adequados ao efeito, e que deverão facultar cópia da gravação à parte que o requeira, dentro de 8 dias após o acto de gravação (art.º 7º n.º 2).
Por sua vez dispõe o art.º 9º do mesmo diploma que “Se, em qualquer momento, se verificar que foi omitida qualquer parte da prova ou que esta se encontra imperceptível, proceder-se-á à sua repetição sempre que for essencial ao apuramento da verdade”.
Concluímos assim que, face da actual redacção do art.º 363º, não se suscitam dúvidas de que a omissão (ou deficiência) de gravação constitui uma nulidade sanável, sujeita ao regime de arguição e de sanação dos artigos 120º, n.º 1 e 121º, do CPP, em conjugação com o art.º 9º do citado DL 39/95.
A questão que tem sido discutida e divide a Jurisprudência, prende-se com a questão do prazo de arguição desta nulidade e de que é paradigmática a resposta produzida pelo M.º P.º.
Podemos extrair da jurisprudência que se têm perfilado duas orientações:
- Uma, em que o prazo para arguição da nulidade se circunscreve a 10 dias, de acordo com o art.º 105º, do CPP, iniciando-se a contagem desse prazo i) imediatamente após o termo da audiência de julgamento; ii) a partir da data da disponibilização do registo magnético pelo tribunal ou iii) contados da data limite em que a parte poderia ter solicitado a entrega da cópia do registo da gravação, nos termos do n.º 2 do art.º 7º do DL 39/95.
Nesta orientação, os sujeitos processuais devem então diligenciar, dentro do prazo de 10 dias, pela audição dos respectivos suportes magnéticos, presumindo-se que actuam de forma negligente se o não fizerem.
- Uma outra, que entende que a nulidade pode ser arguida dentro do prazo das alegações de recurso, podendo a arguição ter lugar na própria alegação de recurso.
Do nosso ponto de vista, porque a temos por mais correcta e adequada, e se vem firmando como entendimento jurisprudencial largamente dominante, perfilhamos esta última posição.
Dizemos que nos parece mais correcta, por se mostrar mais consentânea com o objectivo da gravação da prova, qual seja o de assegurar amplamente o duplo grau de jurisdição em matéria de facto.
Acresce que independentemente de a qualificarmos, pela sua própria natureza, como sendo de conhecimento oficioso, sempre se dirá que o prazo de arguição das nulidades se encontra dependente do momento do seu conhecimento, o que sempre levaria a considerar que o prazo, neste caso, só corre quando a parte interessada ouvisse os registos da gravação.
E mesmo encontrando-se presentes na audiência em que gravação foi efectuada só posteriormente se aquilatará da respectiva deficiência, pela simples razão de que não têm possibilidades de controlar a gravação, nem se lhes pode exigir que venham de imediato arguir a nulidade, ou logo que termine a audiência.
Os sujeitos processuais não têm a obrigação de controlar as condições da gravação, ou seja, de antecipadamente ter o cuidado de ver se a prova foi correctamente gravada. Isto porque é expectável que a gravação seja efectuada em perfeitas condições de audição pelo Tribunal que tem essa incumbência legal e que tem (ou deveria ter e cuidar dos mesmos) ao seu dispor os meios técnicos e humanos para levar a cabo tal gravação, sendo, portanto, de presumir que a prova ficou registada e é perceptível tanto mais que não pode intervir em nada relativo ao sistema de gravação, não pode fiscalizar o funcionamento do mesmo e nem sequer pode fiscalizar o seu manuseamento pelos funcionários judiciais.
Extraímos daqui que os sujeitos processuais só têm possibilidade de controlar a qualidade da gravação quando, a seu requerimento, lhe são entregues os registos da gravação para poderem avaliar da necessidade e interesse de interpor recurso sobre a matéria de facto, ou seja, será durante o período que decorre entre a entrega dos registos da gravação e o termo do prazo para apresentar alegações que, necessariamente, ocorre ou deve ocorrer o conhecimento pelo recorrente da deficiente gravação.
Mas mesmo para aqueles que defendem que o prazo de arguição é de 10 dias a contar da disponibilização do registo magnético pelo tribunal, a verdade é que nem mesmo com a entrega se pode presumir o exacto momento do conhecimento da omissão ou deficiência da gravação. Nenhuma estipulação legal obriga os sujeitos processuais a tomar conhecimento da falha da gravação imediatamente após tal recebimento sendo razoável que a parte que pretende recorrer só ouça o registo da prova no período em que elabora as alegações, até mesmo num momento limite do tempo estritamente necessário à entrega atempada da motivação. Assim sendo, sempre teria de se entender, em benefício da dúvida, que o recorrente tomou conhecimento da anomalia da gravação no dia em que a comunicou ao tribunal.
Antes da alteração do art.º 363º do CPP a que acima referimos e em que vingava a doutrina expressa no Acórdão do STJ n.º 5/2002 de 27/06/2002, consagrando jurisprudência uniformizadora no sentido de que a omissão de documentação constituía uma irregularidade, sujeita ao regime estabelecido no art.º 123º do CPP, entendeu o Tribunal Constitucional ser inconstitucional “por violação do art.º 32º, nº 1 do CRP, a norma constante do art.º 123º n.º 1 do CPP, se interpretada no sentido de ela impor a arguição, no próprio acto, de irregularidade cometida em audiência, independentemente de se apurar da cognoscibilidade do vício pelo arguido” (sublinhado nosso).
Esta argumentação permite-nos concluir que, em regra, os sujeitos processuais só têm interesse em aceder aos registos da prova, quando proferida a decisão final, pois só aí estão em condições de aferir da necessidade ou da utilidade de impugnar a matéria de facto, pelo que, detectando nessa altura qualquer anomalia na gravação será então no prazo das alegações de recurso que a nulidade há-de ser suscitada.
Tal entendimento ficou expresso de uma forma cristalina no Ac. do STJ de 12.07.2007 que refere “se o recorrente dispõe de determinado prazo para minutar o recurso, e se nessa minuta pode impugnar a matéria de facto é evidente que esse direito (de pedir a repetição da prova omitida ou imperceptível) pode exercer-se até ao último dia do prazo legal em curso, porque pode bem acontecer que só nesse momento seja detectada a anomalia da gravação e só no último dia sejam entregues as alegações.
Não vemos que a parte esteja sujeita a um especial dever de diligência, que lhe imponha a audição do registo áudio da prova nos 10 dias imediatos a tê-los recebido pelo tribunal, quando é certo que ele se destina a servir de suporte a uma alegação de recurso para cuja elaboração dispõe o recorrente de 30 dias e é suposto que a cópia recebida do tribunal não enferme de qualquer anomalia”.
Assim, seguimos o entendimento de que a nulidade decorrente da omissão ou deficiência na gravação da prova produzida na audiência de julgamento pode ser suscitada até ao termo do prazo de interposição de recurso, podendo a arguição ter lugar na própria alegação de recurso. Estamos em crer que a lei, no caso de impugnação da matéria de facto, fixou para o recurso o prazo de 30 dias (nos demais casos o prazo é de 20 dias), para assim conferir ao recorrente um prazo acrescido em 10 dias para levar a efeito a tarefa acrescida de ouvir a gravação (cfr. art.º 411º, n.º 4 do CPP).
Em reforço desta interpretação o diploma que especificamente prevê a gravação, o já referido DL 39/95, não fixa qualquer prazo para a arguição desta nulidade, limitando-se a dizer, concretamente no art.º 9º, que pode ser corrigida “a todo o tempo”.
Por último, tratando-se de nulidade sanável, dependente de arguição, em termos dogmáticos significaria que a sua não arguição, ou a sua arguição não tempestiva, apagaria o desvalor da violação cometida, sanando-se o vício, produzindo como consequência a impossibilidade do recurso da matéria de facto, consequência essa intolerável do nosso ponto de vista e não querida pelo legislador na medida em que o efectivo duplo grau de jurisdição, através do mecanismo da sanação da irregularidade, por razões de ordem meramente formal, se veria definitivamente comprometido.
O vício de omissão ou deficiência da gravação da prova afecta o valor do acto de produção da prova, ou seja, o próprio julgamento, por não poder produzir os efeitos a que se destinava, pelo que, incumbindo ao Tribunal de recurso reapreciar a prova, naturalmente que pode conhecer oficiosamente do vício, nos termos do disposto no art.º 9º do citado DL 39/95 que permite que o vício, sempre que seja essencial ao apuramento da verdade, possa ser conhecido e repetido a qualquer momento.
Assim, independentemente de tal nulidade só ter sido arguida no recurso deve o tribunal ad quem poder conhecer dela oficiosamente e determinar a sua reparação.
Não podemos deixar de referir que mesmo quando à luz do Acórdão do STJ n.º 5/2002 de 27/06/2002, consagrando jurisprudência uniformizadora no sentido de que a omissão de documentação constituía uma irregularidade, já havia quem entendesse que a mesma, sendo relevante, seria de conhecimento oficioso, nos termos do n.º 2, do art.º 123º, do CPP, pelo que, sendo hoje classificada como nulidade, por maioria de razão, se tem de admitir o seu conhecimento oficioso.
E, mesmo nos casos em que o recorrente, impugnando a matéria de facto, não tenha suscitado a nulidade, por desinteresse ou desnecessidade dessa invocação, o tribunal de recurso não poderia ver-se impedido de reapreciar a prova, nunca poderia ficar diminuído na sua competência de julgar o recurso, podendo, por isso, conhecer oficiosamente da nulidade [...] Estando a gravação imperceptível e os depoimentos deficientemente gravados, como se refere na informação de fls.684, revelam-se essenciais para a descoberta da verdade, tendo em vista a impugnação que pretende a recorrente sobre a matéria de facto. A alegada deficiência da gravação da prova afecta, pois, a concreta impugnação da matéria de facto, impedindo a reapreciação da prova por parte do Tribunal, desde logo dos factos, estando assim em presença da nulidade prevista no art.º 363º, do CPP».

O discurso final

Que no nevoeiro do ideal abstracto se não esqueça a materialidade do concreto, que no formulação aglutinadora do geral se não perca a referência do individual, que na construção dos sistemas sociais se não abandone o humano, que na contabilidade aos contribuintes se não despreze o cidadão, que na valoração do indivíduo se não apouque a sua pessoa. Que na hora de julgar os outros não nos condenemos.
 

A cena de todas cenas

Tudo isto existe?

Leio isto aqui e um sentimento de estranheza como se estrangeiro na própria Pátria invade-me: «Acordos informais sobre o quantum das penas e/ou a suspensão da sua execução sempre os houve. Pelo menos, no tempo em que juízes, delegados e advogados se falavam para além do circunstancialismo de uma audiência». Leio e pergunto-me se vivi em outro mundo que tais coisas não vi, ou talvez o mundo em que tais coisas terão sempre existido me esteja a convidar para sair porque não me sabendo cúmplice não me quer sequer para testemunha.
Se é que isto existe ou existiu. Mas não comigo. Porque se tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é fado.

A personagem "inventada" e a revisão

No restritivo universo do recurso extraordinário de revisão eis uma interpretação extensiva da possibilidade respectiva: «No recurso extraordinário de revisão, quando a lei se refere a “novos” factos ou meios de prova, não pôde deixar de incluir, obviamente, aqueles que não foram considerados no julgamento porque eram desconhecidos da parte interessada em invocá-los. Mas há que acrescentar também aqueles meios de prova que, por razão relevante, a parte interessada esteve impossibilitada de apresentar». E «assim, o meio de prova apresentado neste recurso pelo recorrente deve ser considerado, efetivamente, para os efeitos legais, um “novo meio de prova”. Não porque o recorrente desconhecesse a existência da testemunha durante o decurso do processo, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, mas porque estava impossibilitado de a apresentar ou de a arrolar, pois desconhecia o seu paradeiro». Isto num contexto em que «aliás, a PJ não a conseguiu localizar e as entidades que dirigiram o processo, quer na fase do inquérito, quer na instrução, quer no julgamento, aparentemente nada mais fizeram na procura de tal pessoa, talvez porque se tenham convencido que era um personagem inventado e que servia de “desculpa” para o facto de o ora recorrente ter utilizado um telemóvel anteriormente roubado a uma das vítimas». É o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.01.12 [relator Santos Carvalho, texto integral aqui]

Surpreendente surpresa da confissão!

Agora que se discute a justiça negociada não deixa de ser curioso este acórdão da Relação de Coimbra de 10.01.12 [relatora Maria José Nogueira, texto integral aqui] que aborda uma situação em que o arguido foi «surpreendido» ao ler na sentença a menção a que tinha confessado e sem reservas!.
Ante tal situação, o Tribunal considerou que «tendo o arguido sido, pela primeira vez, surpreendido, na sentença, por uma “confissão integral e sem reservas”, com as consequências, ao nível probatório, na mesma consignadas, o que se traduz numa afectação do seu direito de defesa constitucionalmente garantido (artigo 32º, da C.R.P.), afectando, nomeadamente, o direito de, em momento oportuno, poder reagir, reequacionando a respectiva estratégia de defesa, é de julgar verificada a arguida nulidade, quer por violação do disposto no nº 1, do artigo 344º, do C. Proc. Penal (não resultando da acta de julgamento que hajam sido observadas as formalidades no mesmo exigidas), quer sobretudo, por violação do direito de defesa consagrado no artigo 32º, n.º 1, da C.R.P., o que determina a invalidade do julgamento, bem como dos actos subsequentes, onde se inclui a sentença (artigo 122º, do C. Proc. Penal)».

Multa -» Prisão -» Multa?

Por Acórdão da Relação de Lisboa de 19.01.12 [relator Carlos Benido, texto integral aqui] estatuiu-se que «o disposto no art.49, nº2, do Código Penal é aplicável, apenas, à pena de multa aplicada a título principal e não à multa de substituição» e assim «aubstituída a pena de prisão por multa e não paga esta, após o trânsito em julgado do despacho que ordena o cumprimento daquela pena de prisão, não pode o arguido evitar o seu cumprimento pagando a multa».
A apoiar este entendimento o aresto exprime-se por esta forma: «em face do regime jurídico estabelecido pelo legislador para a pena de multa de substituição, não é aplicável o normativo do artº 49º, nº 2, do C. Penal que apenas é aplicável á pena de multa aplicada a titulo principal (permitindo o cumprimento da pena de multa a todo o tempo, para evitar a prisão subsidiária), diferenciação no cumprimento da pena que se impõe e admite, como expressa Figueiredo Dias, “A Pena de Multa de Substituição”, in RLJ, Ano 125, págs. 163-165 e 206, e em “Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime”, Coimbra, 1993, págs. 368-370. Idêntica posição é defendida por Maia Gonça1ves, in “Código Penal Anotado”, Almedina, 16ª ed., 2004, págs. 184-186, referindo designadamente que “a disposição do nº 2 (do artigo 44º, do CP) significa, em primeiro lugar, que, se a multa aplicada em substituição da prisão não for paga, o condenado cumprirá, em regra, a prisão aplicada na sentença, como se esta não tivesse decretado a substituição (...)”.
A jurisprudência tem vindo a seguir os mesmos trilhos: Acs. da Relação de Coimbra de 13-11-2007, Proc. nº 2393/06.7PCCBR.C1; de 3-02-2010, Proc. nº 70/06.8TAGVA-B.C1 e de 3-03-2010, Proc. nº 129/04.6GBGVA-A.C1; Acs. da Relação de Lisboa de 15-03-2007, Proc. nº 1564/07 e de 6-10-2009, Proc. nº 7634/04.2TDLSB-A.L1-5; Acs. da Relação do Porto de 15-06-2005, Proc. nº 0543491; de 15-02-2006, Proc. nº 0516370; de 28-03-2007, Proc. nº 0647205 e de 29-04-2009, Proc. nº 117/07.0GAPFR.P1, que aqui seguimos de perto, todos acessíveis em www.dgsi.pt».

Ética e Conduta


Tal como a Constituição da República que contém normas que são horizontes a atingir e outras que são meramente programáticas, todas a perder carácter injuntivo até pela sua indeterminação, é esta a ideia que resulta da proposta de Lei-Quadro que prevê as normas de referência que devem orientar os Códigos de Conduta e Ética - note-se o e  - no sector público, nisso incluindo as associações públicas, o que quer dizer a Ordem dos Advogados. Pode ler-se aqui. Nesta existe o Estatuto com normas de natureza deontológica. Na proposta, a ser lei, supõe-se que haja um corpo normativo a ser publicado em 180 dias após 90 contados da publicação, que é o prazo previsto de início de vigência.

Justiça negociada e justiça económica

O tema foi a abertura do ano judicial. O assunto foi a ordem do dia, a justiça negociada, os custos da justiça, o economicismo e o garantismo. Fica o registo.

Coimbra: Jornadas de Processo Penal

Já no próximo mês de Fevereiro, por iniciativa do Conselho Distrital de Coimbra da Ordem dos Advogados, terão lugar Jornadas de Processo Penal - Professor Doutor Jorge Figueiredo Dias [para saber mais clique aqui].

Sexta-feira, 24:

15h15 - Abertura - Mário Diogo, advogado, Presidente do CDC;

15h30 – Conferência inaugural subordinada ao tema: “Acordos entre sujeitos processuais antes da audiência” – Jorge de Figueiredo Dias – Professor Catedrático (Jubilado) da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra;

16h15 - Debate – moderador: Mário Diogo;

16h45 - Intervalo

17h00 - Conferência – Fernando Torrão - Professor Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade Lusíada do Porto:
Tema: “Alteração substancial dos factos por imputação de crime menos grave, estratégia processual do arguido e caso julgado de consenso” (Licetne venire contra factum proprium?)

17h45 – Debate - moderadora: Paula Fernando, advogada, vogal do CDC;

18h15 - Conferência - Damião da Cunha - Professor de Direito da Escola do Porto da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa:
Tema: "Ofendido e lesado - o princípio da adesão em processo penal. Uma análise crítica"

19h00 – Debate – moderador: Jacob Simões, advogado, Presidente do Conselho de Deontologia de Coimbra

19h30 - Encerramento dos trabalhos no 1º dia.


Sábado, 25:

9h30 - Conferência – Manuel da Costa Andrade – Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
Tema: “Conhecimentos fortuitos e conhecimentos da investigação em processo penal”

10h15 - Debate – moderador: Mapril Bernardes, advogado, Presidente da delegação de Leiria da OA;

10h45 - Intervalo

11h00 - Conferência - Mário Ferreira Monte - Professor Associado da Escola de Direito da Universidade do Minho.
Tema: "O valor da palavra e do silêncio no processo penal, à margem das recentes propostas de alteração do CPP"

11h45 – Debate - moderador: João Paulo Sousa, advogado, vogal do CDC;

12h15 - Conferência – Germano Marques da Silva – Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade Católica. Advogado e Presidente do Gabinete de Estudos da Ordem dos Advogados.
Tema: “Projectos de alteração do Código de Processo Penal - arts. 64º,141º, 194º e 357º”

13h00 – Debate – moderadora: Paula Forjaz, advogada, Presidente da delegação de Coimbra da OA;

13h30 – Encerramento – Vieira Conde, advogado, vogal do CDC com o pelouro da formação.

Contra a politização da Justiça...

É anunciada para a despolitização da Justiça a eleição consensual futura dos magistrados designados por via parlamentar para o órgão máximo da gestão do poder judicial! Ah! Esqueci dizer que isso sucede...em Espanha. A ler aqui...

7 anos...

Este blog completa no final deste mês sete anos. Anos de entusiasmo, de desânimo aniquilador, de reatar teimoso, contra a adversidade pessoal, em prol por causas públicas em que estava em causa a Justiça. Entre o isolamento e a civilidade. 
Têm sido anos em que este blog se tem procurado conter ao ser um instrumento de trabalho para os que fazem do Direito uma profissão, não deixando de ser, expandindo-se, um espaço de expressão de cidadania.
Teve hiatos, teve picos de obsessão, reorganizou-se várias vezes.
Para os que julgam que o Direito é uma silogística asséptica, uma matemática indiferente, aqui demonstra-se que o Direito é a luta pelo Direito.
No mês de Janeiro de 2005 publiquei um post que dava conta que o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 686/04 [publicado no Diário da República, II, n.º 12, de 18.01.05: «decidira ser (...) inconstitucional por violação do n.º 1 do artigo 32.º da Constituição a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de ser irrecorrível uma decisão do tribunal da relação que se pronuncie pela primeira vez sobre a especial complexidade do processo, declarando-a». 
Leio e espanto-me. Por quanto caminho pedregoso se caminhou!
Pensando hoje que foi preciso o Tribunal Constitucional impor-se, invocando a Lei Fundamental, para que uma decisão com a gravidade daquela conhecesse o direito mais do que legítimo e natural a ser sindicada em recurso faz-me pensar, neste dia de aniversário, imerso em responsabilidades presentes e em projectos futuros, duas coisas: primeiro, será que não é necessário haver um órgão fora da jurisdição comum e dela estranho para que certos abusos não se consumem sob a capa de serem entendimentos legais? Segundo, será que para o alcançar não estaremos sempre a correr o risco de criar uma fonte de novas arbitrariedades, abrindo fissuras na muralha onde se as evitou, o dique do Justo sempre em riscos de ruptura, a enxurrada da injustiça em vias de se abater ?

A ASJP e o CPP: apresentação de livro

O vídeo que regista a apresentação, a 24 de Janeiro, na Biblioteca da Assembleia da República, do livro da Associação Sindical dos Juízes Portugueses com as propostas para a revisão do Código de Processo Penal, pode ser visto aqui
A matéria é da exclusiva competência do Parlamento, só podendo o Governo legislar após autorização legislativa. Ali foi discutida, até ao ínfimo pormenor, a proposta que daria a Lei n.º 78/87, a qual deu ao Governo poderes para aprovar o Código de Processo Penal que o Parlamento conheceu então como se fosse seu.

França: satisfação das vítimas

De acordo com o Portal do Ministério da Justiça de França 54% das vítimas estão satisfeitas com o tempo de duração dos processos respectivos. Ver aqui. Não seria interessante promover um inquérito semelhante em Portugal ou definitivamente não vale mesmo a pena para se concluir o que já se sabe?

Posse de substâncias explosivas

Negócios a envolver substâncias aptas a gerar explosões nucleares não haverá muitos a serem julgados em Portugal. Daí que revista interesse o Acórdão da Relação do Porto de 01.01.12 [relatora Maria do Carmo Silva Dias, texto integral aqui] segundo o qual:

«I - Quando a lei, na versão vigente à data dos factos [art. 275°, n° 2, do CP, na redacção dada pela Lei n.º 65/98, de 2/9], refere "substância capaz de produzir explosão nuclear" o que interessa é a capacidade de determinada substância ser susceptível de, por si ou manipulada de forma adequada, produzir explosão nuclear.
«II - Como crime de perigo abstracto, não se pode confundir a capacidade ou susceptibilidade de determinada substância produzir explosão nuclear, com a necessidade da existência de um perigo concreto ou de um dano directo para o bem jurídico protegido pela norma.
«III - Sendo o Urânio 235 uma substância radioactiva e sabendo o arguido que a mesma era capaz de produzir explosão nuclear (exigindo, para o efeito, uma manipulação adequada), a sua posse integra a prática de um crime de substâncias explosivas ou análogas e armas, do art. 275.º, n.º 2, do CP, na redacção dada pela Lei n.º 65/98, de 2/9, vigente à data da prática dos factos [Junho de 2001]».

O paradoxo de Zenão

O site do Ministério da Justiça está a perder velocidade. Veja-se aqui a primeira página e as datas das publicações que ali se reflectem. A aparência, moderna e personalizada, parecia prometer agilização e celeridade, a mesma que o Ministério apregoa como política para os tribunais. A verdade é que sendo, apenas um reflexo, pode ser um sintoma. 
A Justiça é para corredores de fundo, mas tal como os "sprinters", Aquiles tem de contar que só matematicamente se ganha sendo tartaruga.

Apreensão e perda de objectos do crime

«A decisão de declarar perdido a favor do Estado o objeto apreendido ou de ordenar a sua restituição a quem de direito não faz parte do objeto do processo, razão pela qual pode ser proferida mesmo depois do trânsito em julgado da sentença ou do acórdão onde deveria ter sido tomada», assim o decidiu o Acórdão da Relação do Porto de 11.01.12 [relator Alves Duarte, texto integral aqui]. 
A justificar citou um Acórdão do STJ de 13.10.2011 [proferido no processo n.º 141/06.0JALRA.C1.S1] segundo o qual a determinação sobre o destino a dar aos objectos relacionados[20] com o crime, embora deva constar do dispositivo, o certo é que «já está para além da solução da concreta questão que é submetida ao tribunal. Tal como a remessa de boletins ao registo criminal, por exemplo. Tais requisitos devem integrar a decisão (…) mas rigorosamente não fazem parte do objecto do processo».

A propósito do problema do nexo causal entre a apreensão [e perda] de objectos e o crime com o qual se relacionam, não deixa de não ser interessante esta interpretação extensiva da regra da causalidade sobre a qual, como vimos, já o STJ se pronunciou [como vimos recentemente aqui] a considerá-la exigência fundamental: «Note-se, porém, que, como se decidiu no Acórdão da Relação de Coimbra, de 12-04-2011, no processo n.º 1488/08.7GBAGD.C1, visto em www.dgsi.pt, a lei «não exige como condição do seu funcionamento que os objectos apreendidos tenham uma relação directa com o crime imputado ao arguido. A relação pode ser meramente indirecta, como sucede no caso do agente que é proprietário de arma de fogo e que ameaça dar um tiro em alguém, desde que essa ameaça seja credível ao ponto de, pelo menos, causar inquietação ao destinatário da ameaça (e portanto, constituindo crime), arrastando para o domínio de hipótese que deve ser acautelada a efectiva utilização de arma de fogo contra o visado. O facto de o agente ter na sua disponibilidade uma ou mais armas de fogo confere maior gravidade à ameaça, por a sua consumação se oferecer como plausível, reforçando as exigências cautelares tendentes a evitá-la, sendo essa circunstância suficiente, só por si, para justificar tanto a apreensão das armas como a sua ulterior perda, visto as armas de fogo constituírem por natureza objectos dotados de grande perigosidade e a sua perda não poder considerar-se desproporcionada à gravidade do ilícito cometido».

Suspensão do processo: juiz de julgamento, não!

Vem mesmo a propósito de parte das questões que se suscitam em torno do envolvimento do juiz de julgamento nos momentos em que se traduz o princípio da oportunidade. Subjaz ao que de seguida se cita uma ideia de salvaguarda da independência de quem julga, pedra fundamental do Estado de Direito. «Após as alterações introduzidas pela Lei 26/2010, de 30 de Agosto, o juiz competente para proferir o despacho a que alude o artigo 384.º, n.º1 do CPP é o juiz de instrução», decidiu a Relação de Guimarães, no seu Acórdão de 19.01.12 [relator Fernando Chaves, texto integral aqui], segundo o qual: «Antes da revisão de 2010( - Décima nona alteração ao Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro, operada pela Lei n.º 26/2010, de 30 de Agosto, que entrou em vigor no dia 29 de Outubro de 2010.), a jurisprudência dividia-se relativamente à competência para a decisão do pedido de suspensão provisória do processo pois enquanto uns consideravam que a questão era decidida pelo Mº Pº e pelo juiz de instrução, outros entendiam que tal decisão podia ser tomada pelo Mº Pº e pelo juiz de julgamento( - Sobre esta questão vide Vinício Ribeiro, Código de Processo Penal, Notas e Comentários, 2ª edição, páginas 1101 e 1102.). Agora, com a nova redacção conferida ao artigo 384.º, designadamente ao seu n.º 2, que regulamenta o processamento da suspensão provisória em sede de processo sumário, deixa de haver dúvidas sobre o juiz competente para se pronunciar acerca da suspensão provisória do processo: o juiz de instrução( - Cfr. Cruz Bucho, A Revisão de 2010 do Código de Processo Penal Português, página 102, disponível em www.dgsi.pt/jtrg/estudos; Acórdãos da Relação do Porto de 4/3/2011, 9/3/20011, 30/3/2011, 13/4/2011, 8/6/2011, 15/6/2011, 11/7/2001 e 31/10/2011, todos disponíveis em www.dgsi.pt/jtrp.). Trata-se de uma consequência do princípio do acusatório consagrado no artigo 32.º, n.º 5 da Constituição da República. A estrutura acusatória do processo supõe uma fase de investigação, secreta, sem contraditório, dominada pelo Ministério Público, em que se define o objecto do processo e uma fase de julgamento, pública, com contraditório, dominada pelo juiz, em que se julga o objecto do processo, impondo-se uma separação funcional e orgânica entre estas duas fases( - Cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 7/87, de 9/1, 23/90, de 31/1 e 581/2000, de 20/12, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt.). A suspensão provisória do processo nunca é decidida pelo “juiz do julgamento”, o qual também não tem qualquer intervenção nos procedimentos com vista à mesma, sendo a lei inequívoca ao indicar que o juiz que intervém é o de “instrução” por ser este quem, no nosso processo, profere as decisões de natureza jurisdicional antes da fase do julgamento( - Acórdão desta Relação de 29/9/2008, disponível em www.dgsi.pt/jtrg.). Aliás, tanto assim é que a lei estabelece que nenhum juiz pode intervir em julgamento relativo a processo em que tiver recusado a suspensão provisória do processo sob pena de nulidade – artigos 40.º, alínea e) e 41.º, n.º 3. A competência material para esse tipo de intervenção em toda a fase anterior ao julgamento é do juiz de instrução, tal como resulta directamente do disposto nos artigos 10.º, 17.º, 281.º, n.º 1, 307.º, n.º 2 e 384.º, n.ºs 1 e 2».

ASJP e a revisão do CPP

É hoje apresentado em livro o documento que consubstancia as linhas gerais da proposta da Associação Sindical dos Juízes Portugueses quanto à reforma do sistema processual penal. Ei-las, segundo o sumário que introduz o relatório. Teremos oportunidade de as comentar especificadamente. Agora apenas o resumo.

Inquérito

Avocação obrigatória do processo pelo superior hierárquico do magistrado do MP no termo do prazo máximo fixado na lei, precedida, se necessário, da concessão pelo superior hierárquico de prazo até 30 dias para que o titular inicial proferir despacho de encerramento do inquérito;
O superior hierárquico que avocou o inquérito deverá concluí-lo em novo prazo que não ultrapasse um terço do legalmente estabelecido ou requerer ao juiz de instrução nova prorrogação, por uma só vez, invocando e demonstrando a impossibilidade de o terminar e indicando o prazo necessário para o efeito, que não pode exceder um terço do prazo regra legalmente fixado;
O juiz de instrução depois de ouvir o arguido avaliará os fundamentos para a prorrogação do prazo, podendo conceder novo prazo pelo tempo objetivamente indispensável à conclusão da investigação mas que não pode exceder um terço do prazo regra legalmente fixado; não sendo concedida a prorrogação o MP disporá ainda de 30 dias para encerrar o inquérito;
A violação dos prazos referidos deverá ser causa de rejeição da eventual acusação que venha ainda assim a ser proferida;
O prazo do inquérito deve suspender-se, para além dos casos já previstos na lei, quando seja expedida carta rogatória e ordenada a realização de perícias ou outras diligências requeridas pela defesa, enquanto estiver pendente outro processo com relevância para o sucesso da investigação e enquanto o estiverem a decorrer diligências para a aplicação de pena por consenso;
O período total de suspensão não deverá em qualquer dos casos exceder metade do prazo que corresponder ao inquérito, acrescido de 3 meses em caso de pluralidade de causas de suspensão.

Pena consensual

A alteração que se propõe para a aplicação de pena consensual parte do modelo atual do processo sumaríssimo e assenta nos seguintes vetores fundamentais:
Com vista ao encerramento do inquérito, será obrigatória a audição pelo MP do arguido acompanhado de defensor, em diligência especialmente destinada a ponderar a aplicação da suspensão provisória do processo ou de pena consensual, de acordo com os respetivos pressupostos;
O MP, sob pena de nulidade, fundamentará, de modo conciso mas com base em factos determinados, a razão pela qual não promove a aplicação da suspensão provisória do processo ou da aplicação de pena consensual;
A aplicação de pena consensual será admissível sempre que o MP, face aos indícios recolhidos no inquérito e à respetiva qualificação jurídica, entenda dever ser aplicada no caso concreto pena que, depois de reduzida em um terço, não seja superior a 5 anos de prisão;
A pena ou medida de segurança proposta pelo MP e aceite pelo arguido será sujeita a homologação pelo juiz, que no caso de concordar condena na sanção penal respetiva;
O juiz rejeitará o requerimento quando este for manifestamente infundado, não existirem indícios suficientes da prática do crime, estiver indiciada a prática de crime mais grave ou entender que a sanção proposta é insuscetível de realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição;
Se o arguido não aceitar a sanção proposta pelo MP o processo será remetido para julgamento mas a pena aplicável não poderá ser mais gravosa na sua espécie e medida, exceto se em audiência se apurarem circunstâncias que traduzam uma maior gravidade do facto ou da culpa que não tenham sido consideradas;
Se o processo seguir para julgamento fica impedido de nele participar o juiz que tiver rejeitado a homologação do requerimento do MP ou que tiver participado na determinação da sanção não aceite pelo arguido.

Instrução

A alteração preconizada vai no sentido de reduzir a instrução facultativamente requerida pelo arguido à discussão da decisão de acusar, em diligência oral e contraditória, correspondente, nessa parte, ao atual debate instrutório, sem que haja lugar a produção de prova. A instrução requerida pelo arguido visará, pois, a discussão da acusação de forma contraditória perante o órgão independente, tribunal, de modo a que a sua sujeição a julgamento não dependa apenas e decisão do órgão comprometido com a acusação. E terá, assim, como objeto a apreciação de indícios resultantes da prova recolhida no inquérito, bem como a apreciação de nulidades e questões prévias ou incidentais que possam conduzir à não pronúncia, incluindo as proibições de prova

Sentença abreviada

Deve pois ser consagrada a permissão de em determinadas circunstâncias ser possível proferir uma sentença apenas com indicação dos factos provados e da parte dispositiva, relegando-se para ulterior momento, se necessário em função do recurso, a fundamentação exaustiva da motivação probatória da decisão.

Declarações anteriores

Defende-se, portanto, a possibilidade de valoração em audiência das declarações do arguido anteriormente prestadas, mesmo que se remeta ao silêncio ou esteja ausente, caso se verifiquem cumulativamente os seguinte requisitos:
Tiverem sido prestadas perante juiz, na presença do seu defensor;
O arguido tiver sido advertido de que as suas declarações podem ser usadas em audiência de julgamento mesmo que se remeta ao silêncio ou esteja ausente;
As declarações tiverem sido gravadas em áudio e vídeo, pelo menos em regra;
O arguido tiver sido informado por escrito, aquando da prestação de T.I.R., do efeito legalmente reconhecido às suas declarações no caso de a audiência ter lugar na sua ausência.

Recursos

O recurso para o tribunal constitucional, no âmbito da fiscalização concreta, não deve ter efeito suspensivo sobre a decisão recorrida quando esta tiver sido proferida por tribunal superior na sequência de decisão ou decisões anteriores igualmente condenatórias;
Deve tornar-se obrigatório o conhecimento e a reparação pelo tribunal recorrido dos vícios geradores de nulidade (ou efeito equivalente) total ou parcial da decisão final, evitando assim que o recurso suba ao tribunal superior, nomeadamente quando se trata de vício manifesto;
Deve tornar-se também obrigatório que o tribunal de recurso conheça e decidida todas as questões suscitadas, mesmo que haja anulação da sentença, restringindo-se o leque argumentativo dum futuro novo recuso e rentabilizando-se de forma mais coerente o trabalho do tribunal de recurso, evitando-se nova distribuição do processo e que outros juízes tenham que conhecê-lo e preparar a nova decisão.

Proibições de prova

O quadro actual impõe uma clarificação legislativa das proibições de prova em aspetos como a sua autonomização face às nulidades, a maior ou menor amplitude dos seus efeitos e respetiva base legal, as dificuldades de caracterização como proibição de prova ou nulidade de muitas das invalidades previstas.

Defesa oficiosa

Propõe-se, portanto, uma revisão que incorpora as vantagens do sistema de defesa pública mas não põe em causa a liberdade e independência que caracterizam a advocacia, obedecendo aos seguintes princípios:
A defesa deve ser assegurada por advogados independentes e não por juristas funcionários do Estado; 
Os defensores devem ser recrutados por concurso e ter maior qualificação técnica e mais disponibilidade, com um sistema de vinculação temporária ao Estado por contrato;
É necessário garantir o respeito pelo direito constitucional à escolha do defensor;
- A gestão do sistema deve ser assegurada por entidade pública autónoma do Estado e não pela Ordem dos Advogados, assente exclusivamente em critérios de interesse público;
Têm de ser criados mecanismos de remuneração adequada e digna e financeiramente comportáveis, plenamente transparentes e fiscalizados.

Terra de Lei

No dia 09 de Fevereiro de 2012, pelas 18.00 horas, no Auditório do Metropolitano de Lisboa, situado na estação Alto dos Moinhos, Benfica, Lisboa, realiza-se o lançamento da revista 'Terra de Lei', da Associação de Juristas de Pampilhosa da Serra.  O n.º 1 da 'Terra de Lei' tem o seguinte conteúdo:
 
NOTA DE ABERTURA
04 ESTATUTO EDITORIAL
05 EDITORIAL
06 NOTÍCIAS
12 ENTREVISTA - António Joaquim Piçarra, Juiz Conselheiro, ex-Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra
16 EM FOCO - Corrupção em tempo de penúria (uma réstia de esperança em mar revolto). Euclides Dâmaso / Procurador-Geral Adjunto. Presidente da PGDC
26 OPINIÃO - A Justiça como valor nas comunidades da Beira Serra. António Henriques Gaspar / Juiz Conselheiro. Vice-Presidente do STJ
34 DOUTRINA
- Medidas de obtenção e preservação de provas no âmbito dos direitos de autor e Conexos. Salvador Costa / Juiz Conselheiro (jubilado).
- Democracia e criminalidade. Entre o risco e a confiança. Anabela Miranda Rodrigues / Professora Catedrática da FDUC.
- Consentimento informado. Maria do Céu Roque /Médica e Advogada
- Breves notas sobre a arbitragem voluntária ad-hoc em Portugal. Tânia Neves / Advogada  
74 JURISPRUDÊNCIA
- Arrendamento urbano para habitação (Acórdão de 3 de Maio de 2011 no recurso de apelação do procº 1996/08.OYXLSB.L1)
86 SOCIEDADE
- Agrupamento de escolas de Pampilhosa da Serra.
Manuel Porfirio /Professor e Administrador Escolar
92 CULTURA
- Conto: O Juiz de Fajão na Relação do Porto Extraído da colectânea Contos de Fajão.

Equipas mistas

«As equipas de investigação conjunta são um instrumento de cooperação judiciária previsto em diversos instrumentos de cooperação judiciária internacional que vinculam o Estado Português, designadamente no artº 13º,nº 1 al. a) e b) da Convenção relativa ao auxílio judiciário mútuo em matéria penal entre os Estados Membros da União Europeia, de 29 de Maio de 2000, ratificada pelo Decreto do Presidente da República nº 53/2001, de 16 de Outubro (DR I Série - A nº 240) e na Decisão–Quadro (2002/465/JAI), de 13 de Junho de 2002, e, bem assim, nos artºs 145º, 145º-A e 145º –B, todos da Lei 144/99, de 31 de Agosto (Lei de cooperação judiciária internacional em matéria penal)».

Regulando o modo de formalizar a sua utilização surgiu o Despacho de 17 de Janeiro do PGR [texto integral, aqui]. No essencial encaminhamento via Eurojust e autorização pelo PGR.

A Lei 5/2002 e a mera suspeita

Reportando-se à medida prevista na Lei n.º 5/2002, de 05.01 , segundo a qual o legislador estabeleceu um regime especial de recolha de prova, de quebra do segredo profissional e perda de bens a favor do Estado, em que se integra a medida de controlo de contas bancárias, decidiu este Acórdão da Relação de Lisboa de 10.01.12 [relator Neto de Moura, texto integral aqui] decidiu que «aquela medida, sendo um instrumento de recolha de prova, não pressupõe a existência de fortes indícios da prática de um crime do catálogo, bastando que haja suspeitas da prática do crime (de catálogo) e de quem é ou são os seus agentes» e isto porque «Importa deixar claro que o recurso a tal medida não depende da existência de fortes indícios da prática de um crime do catálogo. Com efeito, sendo um instrumento de recolha de prova, não faria sentido que fosse legalmente exigida a existência dessa forte indiciação, sob pena de se contrariar, ou submeter a uma inversão intolerável, a lógica da reconstrução material da verdade factual levada a cabo pela investigação criminal. Á semelhança do que acontece com outros meios de obtenção de provas (v.g. as intercepções telefónicas), basta que haja suspeitas da prática do crime (de catálogo) e de quem é ou são os seus agentes». [sublinhado nosso, jab; a Lei n.º 5/2002, com as várias alterações sofridas pode ser encontrada aqui].

Irrecorribilidade da pronúncia e caso julgado

«O acórdão do TC referido pelo arguido - n.º 387/2008, de 22 de julho de 2008 – segundo o qual os juízos formulados no despacho de pronúncia são provisórios e devem ser reavaliados em julgamento, respeita a uma época em que certa jurisprudência interpretava a lei no sentido de considerar o despacho de pronúncia incindível e, portanto, irrecorrível na parte em que conhece das questões prévias e incidentais, nomeadamente, das nulidades, no caso de concluir pela pronúncia do arguido pelos factos constantes da acusação do M.º P.º. (...) No caso dos autos, porém, não foi essa a orientação que veio a ser seguida, pois, entretanto, o STJ, pelo Acórdão de 19 de janeiro de 2000 ("Assento n.º 6/2000", no Diário da República, I Série-A, n.º 6, de 7 de março de 2000), havia fixado jurisprudência nos seguintes termos: "A decisão instrutória que pronunciar o arguido pelos factos constantes da acusação do Ministério Público é recorrível na parte respeitante à matéria relativa às nulidades arguidas no decurso do inquérito ou da instrução e às demais questões prévias ou incidentais” e por Acórdão n. ° 7/2004, de 21 de outubro de 2004 (Diário da República, I Série-A, n. ° 282, de 2 de dezembro de2004), fixou a seguinte jurisprudência: "Sobe imediatamente o recurso da parte da decisão instrutória respeitante às nulidades arguidas no decurso do inquérito ou da instrução e às demais questões prévias ou incidentais, mesmo que o arguido seja pronunciado pelos factos constantes da acusação do Ministério Público."(...) A interpretação que aqui fazemos, de que o trânsito em julgado do acórdão da relação que julgou um recurso sobre questões incidentais do despacho de pronúncia, relativas à proibição de provas, impede um novo conhecimento das mesmas no processo, não padece de qualquer inconstitucionalidade, pois, como bem explicou o acórdão recorrido, o Tribunal Constitucional tem sempre afirmado a validade desta conceção do caso julgado formal (veja-se, entre todos, o Ac. do TC 86/2004, de 04/02/2004)».
Eis o decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça no seu Acórdão de 20.01.12 [relator Santos Carvalho, texto integral aqui, sublinhado nosso, jab]
Ora ante o carácter totalmente irrecorrível de decisão instrutória que seja obediente à acusação do Ministério Público, em que nem as questões prévias se adimite recurso, que dizer nesta mesma lógica?

Perda do automóvel...

É problemático o âmbito da expressão «instrumentos do crime» para efeitos da sua perda a favor do Estado. Tem havido por vezes tendência para interpretações extensivas do conceito em outros casos interpretações restritivas. 
Eis o que torna interessante ler que «Se o produto estupefaciente apreendido, transportado em veículo automóvel, atendendo ao seu peso e volume, era facilmente transportável, por qualquer outra forma, não sendo a utilização da viatura essencial para o cometimento do ilícito, por não ser indispensável ao transporte ou à ocultação de tal produto, constituindo apenas mero meio de transporte do arguido, seu proprietário, não pode concluir-se que tal viatura seja instrumento do crime e que exista uma relação de causalidade entre a sua utilização e a prática do crime, não havendo, por isso, lugar à declaração da perda de tal veículo a favor do Estado». Foi o decidido pelo Acórdão da Relação de Coimbra de 09.01.12 [relatora Elisa Sales, texto integral aqui].

O aresto louva-se na orientação do Supremo Tribunal de Justiça que assim resume: «Estabelece o n.º 1 do citado artigo 35º (na redacção dada pela Lei n.º 45/96, de 3.9) que «São declarados perdidos a favor do Estado os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de uma infracção prevista no presente diploma ou que por esta tiverem sido produzidos». Ora, como também vem mencionado na decisão recorrida, o STJ tem enveredado por uma interpretação do n.º 1 do artigo 35º de acordo com a qual “a perda dos objectos do crime só é admissível quando entre a utilização do objecto e a prática do crime, em si próprio ou na modalidade, com relevância penal, de que se revestiu, exista uma relação de causalidade adequada, de forma a que, sem essa utilização, a infracção em concreto não teria sido praticada ou não o teria na forma, com significação penal relevante, verificada. Trata-se de orientação que tem por fundamento a necessidade de existência ou preexistência de uma ligação funcional e instrumental entre objecto e a infracção, de sorte que a prática desta tenha sido especificadamente conformada pela utilização do objecto, jurisprudência que conforma o texto legal com os princípios constitucionais da necessidade e da adequação, orientação que sufragamos, por isso, sem esquecer que há ainda que ter em atenção o princípio constitucional da proporcionalidade - artigo 18º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa -, princípio que preside a toda a providência sancionatória - a significar que a perda só deve ser declarada, em regra, quando se mostre minimamente justificada pela gravidade do crime e não se verifique uma significativa desproporção entre o valor do objecto e a gravidade do ilícito” – cfr. Ac. STJ, de 13-12-2006, in www.dgsi.pt» [ver texto integral aqui]

A suspensão provisória e o MP

«O MP não está dispensado da verificação dos requisitos gerais da aplicação do instituto da suspensão provisória do processo, sua avaliação e concretização casuísticas, sempre que o crime for punível com prisão não superior a cinco anos ou com sanção diferente da prisão».Assim decidiu o Acórdão da Relação de Évora de 10.01.12 [relatora Ana Brito, texto integral aqui]. 
 
Justificando a sua asserção considerou: «A suspensão provisória do processo, consagrada no art. 281º do CPP, foi inicialmente vista pela doutrina como um desvio ao princípio da legalidade, porquanto se traduziria na faculdade do MP não deduzir acusação e num “mecanismo processual surgido sob o signo da oportunidade” (Pedro Caeiro, Legalidade e Oportunidade: a perseguição penal entre o mito da “justiça absoluta” e o fetiche da “gestão eficiente do sistema” Rev. MP 84, 2000, p. 39). Mas, na clara explicação de Pedro Caeiro, “a chamada `oportunidade´ consiste apenas num juízo sobre a verificação dos pressupostos legais da suspensão”, ou seja, traduz-se num “juízo cujo resultado constitui o MP num dever” (loc. cit. pp. 42-43). Recorde-se que o legislador de 2007 veio precisamente substituir a expressão “pode o MP” por “o MP determina”».

Trabalho prisional

Num País em que o trabalho prisional não é a regra, a ociosidade no cárcere um fomento à delinquência, talvez seja interessante dar conta desta ligação do sítio do Ministério da Justiça italiano referente à venda de produtos oriundos da mão de obra prisional. Terá tudo imensos defeitos não duvido. Mas o que está em causa é pensar-se no possível e necessário. «Porque é que não trabalham?», perguntei um dia. Responderam-me com direitos humanos, com a ausência de estruturas, com e com e com. Veja-se aqui. A imagem que ilustra este post é a de uma garrafa de vinho produzido numa cooperativa que funciona no interior de um estabelecimento prisional. A ver aqui.

Reforma do Processo Penal em Espanha

Também em Espanha está em curso uma modificação da lei processual penal. Quem já leu a Ley de Enjuiciamento Criminal de 1882 percebe que urgia uma reforma sistemática. Tratava-se de um diploma antiquado na formulação, jogado na casuística das previsões, sistematicamente confuso. O anteprojecto pode ler-se aqui. Quem quiser comparar, ei-lo.
Dando dele um resumo o Ministério da Justiça do país vizinho informa: «Se incorpora plenamente el derecho a la segunda instancia penal, se pone fin a la investigación indefinida, también conocida como ‘pena de banquillo’, y se regulan derechos y garantías constitucionales tan importantes para los ciudadanos como los de la persona detenida, el control judicial de las medidas que limitan la libertad, la interceptación de las comunicaciones, la entrada y registro o el derecho a no ser perseguido dos veces por los mismos hechos. Asimismo, se establece por primera vez el estatuto de las víctimas en el proceso penal y se elevan a rango orgánico aspectos vinculados al ejercicio del derecho de defensa y el secreto profesional.Se introduce un mayor control judicial. Frente al modelo actual, constituido por el juez instructor que investiga y el juez o tribunal que juzga, el nuevo modelo dispone la existencia de un juez de garantías (que controla la investigación del fiscal), un juez de la audiencia preliminar (que determina si existen elementos suficientes para sostener la acusación) y el juez o tribunal que finalmente juzgará la causa».