Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Penal porque divino...

Analisando as primeiras leis escritas encontradas pela zona do próximo Oriente, datadas de trinta mil anos antes de Cristo, basicamente leis cujos preceitos se encontravam em placas de argila redigidas em escrita cuneiforme ou em escrita suméria, verificaram os estudiosos duas realidades: a primeira, que invocavam origem divina, o que desde logo abre o problema teológico de saber da legitimidade, afinal, de todos os livros que, porque considerando-se sagrados, alegam terem sido escritos por Deus - o Corão - ou inspirados por Deus - a Biblia -; segundo, que as normas que consignam são na sua maioria de natureza penal. 
Interessante é a articulação de ambos os ângulos da questão. Federico Lara Peinado e Federico Lara González sumariam-no no seu livrinho Los Primeros Códigos de la Humanidad, a que agora voltei: «analisando as Reformas e os primeiros códigos mesopotâmicos, chama a atenção a natureza essencial penal que contém as suas normas jurídicas, confirmando-se assim a origem divina que se deu ao Direito, dado que, por princípio, as sanções religiosas deviam ser muito mais graves do que as civis, pois que estas se reduziam a penas a cumprir neste mundo.»
Já agora um dado da selvajaria contemporânea: a  zona de Nippur, onde se encontrava a mais rica colecção de textos jurídicos que as escavações iam revelando eram precisamente naquela onde, no Iraque, foi destruída e saqueada quando da invasão americana do Iraque. Horas depois do feito, a pilhagem rematou o que a mão militar havia permitido, a obliteração desse riquíssimo património cultural essencial para a História do Direito: a força a supressão da evidência da Justiça.

A inesperada definição

Há um modo de definir os conceitos não pelo enunciado das suas características essenciais, sim pela sugestão do que significam. Calhou, ao folhear o estudo Reconhecimento, do desejo ao Direito, obra conjunta de Maria Lucília Marcos e A. Reis Monteiro, tese universitária sobre essa noção transdisciplinar, encontrar do Direito esta ideia: «é a dialética pela qual o Homem se força a um melhor que ele inventa». Atribui-se a René Maheu, filósofo, que foi Director-Geral da Unesco entre 1961 e 1974.
Espantará este modo de conceber a todos quantos do Direito vêem a sua faceta repressiva, destinada a estripar o que se tem por mal e a erradicar o indesejado. E espantará ainda quantos o sentem, afinal, como floresta de regulamentos menores, por causa dos quais a liberdade contemporânea é garrotada a tal ponto que até o simples atravessar a rua está previsto e sancionado em qualquer norma que se quer lei.
Aquém do espanto, a fórmula, provinda deste amigo de Jean-Paul Satre e de Simone Beauvoir, que, porém, nem obra relevante deixou, diz mais do que muitas das tentativas feitas por ilustres jurisconsultos para acharem da noção a essência.
Está ali tudo, desde a coerção, tão cara aos positivistas, até ao optimismo legitimadora da norma justa, a que, mesmo quando edita o mal necessário o faz em nome do bem possível. 
Mas há sobretudo ali a invenção, essa expressão máxima da irrequietude de conceber, que anima todos os reformadores sociais, aqui a luta por um outro Mundo, além a luta por um novo Homem, através do Direito, isto é, com universalidade na previsão, com individualização na aplicação e sobretudo por bem fazer.

Base de dados de agressores sexuais

A existência de uma lista pública de agressores sexuais foi polémica entre nós. Existe, porém, por exemplo, nos EUA, como se vê aqui.

Só os papéis que não os princípios envelhecem...


Aos que alguma vez foram ao salão solene da Ordem dos Advogados a sua figura é familiar. Impõe-se. Ao arrumar velhos papéis, encontrei o discurso de elogio que o Advogado Arnaldo Constantino Fernandes proferiu na sessão inaugural do entretanto caducado Instituto da Conferência, a 27 de Fevereiro de 1958 sobre aquele seu Colega, que fora designado a 12 de Novembro de 1937 Bastonário da Ordem dos Advogados.
Equilibrado panegírico, enaltecendo do lembrado, que falecera em Junho de 1939, as virtudes humanas e o valor profissional, a alocução tem este passo de notável.quando o orador se apresenta: «Pessoalmente - disse - a tarefa que o Sr. Presidente da Ordem me distribuiu tem ainda o aliciante de um político do campo oposto vir fazer o elogio dum monárquico indefectível, mostrando que a minha geração ainda recebeu lições de tolerância e não compreende que os adversários políticos sejam inimigos».
Estava dada a grande lição cívica expressa em palavras que são um valor absoluto de moralidade que o tempo não pode excepcionar mesmo quando desmente.
Citando o homenageado, Constantino Fernandes lembraria, no que seria a segunda mais significativa intervenção dessa noite, uma frase que lhe escutara em amena conversação: «Em cada advogado, dizia ele, há qualquer coisa de inamovível, de inevitável, que depende do que ele é como homem. E como homem o que ele tem de ser é honesto, pois a honestidade não é um luxo, mas uma força.»

Cookies


É uma directiva europeia sobre o "cookies". Não os bolinhos conhecidos, de aveia, sim aquele utensílio usado por certos sites para recuperarem informação sobre quem passou por lá e porquê. Directiva que obriga a legislação, neste caso editada em Inglaterra ver aqui], o País com menos leis [mais, aqui]. Alguém sabe de algo semelhante por aqui?

Na mão direita a espada...

Na mão esquerda a balança, símbolo da Justiça, na mão esquerda a espada, símbolo do Direito. Este a impor aquela. A partir desta imagem, Francesco Galgano constrói, pela iconografia, o seu estudo sobre a metáfora no Direito. Mas não se fica por aí. Esse é precisamente o último capítulo, no qual, continuando a sua análise sobre as representações gráficas em meio forense, surpreende nos anos quarenta o positivismo jurídico a substituir a balança pelas tábuas da lei, assim se assumindo o primado da Lei escrita, mantendo-se sempre a espada, agora em homenagem a hipertrofia do Estado. Todo o demais é dedicado precisamente ao que dá tema à obra, a presença das metáforas no universo jurídico, desde logo a metáfora da pessoa colectiva. Parte do sentido do próprio termo "metáfora", no qual se dá a translação do "como se" para o "sendo". Ainda não tive mais tempo do que para folhear, passeando pelas folhas onde no campo do Direito das Pessoas e ante as colectivas o autor dá conta de, após terem sido tratadas como se pessoas humanas fossem assumiram depois o estatuto de pessoas em si.
Muito interessante este Le insidie del inguaggio giuridico, publicado pela Il Mulino. Italiano, claro, e por isso riquíssimo de sensibilidade e de profundidade filosófica. O assunto é o tópico da sua vida, a extensa auto-bibliografia demonstra-o.

Assédio sexual: lei (francesa) e circular ministerial

Foi publicada em França uma lei sobre o assédio sexual, substituindo a legislação anteriormente vigente em virtude da declaração de inconstitucionalidade a que havia sido sujeita vista a imprecisão do enunciado típico. A notícia e demais informações podem encontrar-se aqui.
Citando para que se entenda: «La loi du 6 août 2012 relative au harcèlement sexuel, adoptée à l’unanimité par le Parlement, a été publiée au Journal Officiel du 7 août 2012. Elle a pour objectif principal de rétablir dans le code pénal l’incrimination de harcèlement sexuel prévue par l’article 222-33 de ce code, qui avait été abrogée par le Conseil constitutionnel dans sa décision n° 2012-240 QPC du 4 mai 2012 en raison de l’imprécision de sa rédaction qui résultait de la loi du 17 janvier 2002, et de tirer toutes les conséquences législatives de ce rétablissement».
 Interessante é que, na sequência da lei, o ministro da Justiça daquele País emitiu uma circular sobre a sua interpretação e aplicação dirigida a todas as estruturas do Ministério Público. Aqui seria considerada uma gravíssima intervenção do poder político no âmbito da função das magistraturas. Ali faz parte da cultura aceite. O texto da circular pode ler-se aqui. Interessante do ponto de vista da interpretação, não é irrelevante o seu conhecimento até por serem olhos com os quais se pode olhar o nosso sistema legal.

O direito a compreender

É uma reforma contra a opacidade do Direito, o carácter denso, confuso, contraditório, vetusto da sua linguagem. Em nome da regra segundo a qual a ignorância do Direito a ninguém aproveita e não pode ser invocada para se deixar de cumprir aquilo que a lei manda. Em Espanha, como se pode ler aqui. É a manifestação de um direito essencial de cidadania, o direito a compreender, as leis e as decisões processuais. Contra o hermetismo.

Bom senso e bom gosto

Olha-se para o site do Ministério da Justiça português, aqui. Compara-se com os sites dos Ministérios da Justiça de outros países. A diferença salta à vista: pouca actividade relatada. Quer isto dizer que não se trabalhe? Não quer necessariamente. Quer isto dizer que se esconde informação? Não quer por definição. Mas quer isto dizer seguramente que não há o cuidado de informar. E em democracia a partilha de informação é uma condição de transparência. Mais: a existir um site ele tem de ser um lugar dinâmico, em que as questões na ordem do dia encontrem espaço de expressão. 
Não quer isto dizer que o Ministério entre na polémica, que arregimenta barricadas, com a dança de nomes e contra-nome, quanto a saber quem deve ser o próximo PGR. Por uma questão de bom senso e bom gosto.

Matrimónio canónico

Não sou dos fanáticos da qualidade do ensino jurídico antes do 25 de Abril se isso pode servir como marco miliário. Como tudo, dependia. 
Lembro-me de quando me tentaram ensinar Direito de Família: o Professor porque nutria sentimentos próprios contra o divórcio, não ensinava essa matéria, sim as causas de anulação do matrimónio segundo o Direito Canónico. Assunto que interessava quase a ninguém. Era o triunfo da ideologia sobre a ciência, mesmo num pensador inteligente. Feita a cadeira tive de estudar por mim o que haveria para saber.
Lembrei isso esta manhã ao ver anunciado que «a Associação Portuguesa de Canonistas organiza entre 6 a 8 de Setembro um curso sobre “Questões controvertidas sobre o Matrimónio Canónico”, entre 5 e 8 de Setembro, em Fátima, com o objectivo de proporcionar aos advogados e outros licenciados em Direito um aprofundamento no Direito matrimonial canónico». Pode saber-se mais aqui ou aqui. Quanto ao portal da Associação, veja-se aqui.

Make Love, not Law


Houve quem com graça dissesse da análise freudiana que ela pressupunha que as pessoas caminhavam não em cima dos pés mas sim do sexo o que, além do mais - e aqui a ironia - deveria ser particularmente doloroso.
Na sua ânsia regulador ao Direito não escapou o sexo, por razões compreensíveis e pelas outras. Ler este livro talvez ajude a encontrar a posição exacta. O que neste caso marca toda a diferença...