Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Taxa sancionatória: natureza e alcance

Interessante o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.12.2019 [proferido no processo n.º 136/13.8JDLSB.L2-A.S1, relator Manuel Augusto Matos, texto integral aqui] sobre a natureza e alcance da taxa sancionatória.

Está prevista no n.º 1 do artigo 531º do CPC, segundo o qual :

«Por decisão fundamentada do juiz, pode ser excepcionalmente aplicada uma taxa sancionatória quando a acção, oposição, requerimento, recurso, reclamação ou incidente seja manifestamente improcedente e a parte não tenha agido com a prudência ou diligência devida».

Por força do artigo 521º do CPP aplica-se ao processo penal, porquanto, de acordo com aquele preceito legal:

«À prática de quaisquer actos em processo penal é aplicável o disposto no Código de Processo Civil quanto à condenação no pagamento de taxa sancionatória especial.».

Regulamentando o artigo 10º do Regulamento das Custas Processuais, subsidiariamente aplicável por disposição expressa no artigo 524.º do CPP, determina que:

«A taxa sancionatória é fixada pelo juiz entre 2 UC e 15 UC».

Ora historiando a sua origem, o aresto citado remete para um acórdão antecedente do mesmo tribunal:

«Como se dá nota no acórdão deste Supremo Tribunal de 05-09-2019, proferido no processo n.º 222/18.8YUSTR.L1-A.S1 – 5.ª Secção[2], a taxa sancionatória excepcional prevista no citado artigo 531º do CPC «corresponde à que estava já em vigor no art. 447º-B do anterior CPC, aditado pelo Decreto-Lei nº 34/2008, de 26 de Fevereiro, que aprovou o Regulamento das Custas Processuais, e em cujo preâmbulo se esclarecia tratar-se de “um mecanismo de penalização dos intervenientes processuais que, por motivos dilatórios, “bloqueiam” os tribunais com recursos e requerimentos manifestamente infundados. Para estes casos, o juiz do processo poderá fixar uma taxa sancionatória especial com carácter penalizador”.»

Trata-se, pois de um das situações em que a lei processual penal revê uma taxa com tal natureza, porquanto, segundo o acórdão que vimos citando: «Outras taxas sancionatórias estão previstas no CPP, como nos arts. 223º, nº 6, 420º, nº 3, e 456º, punindo também atos manifestamente infundados ou temerários.»

Circunscrevendo o âmbito da referida taxa [e ressalvando que com esta taxa «não se pretende sancionar erros técnico-jurídicos, pois estes são sancionados através do pagamento de custas»], louva-se o acórdão no sentenciado em outras decisões do Supremo Tribunal de Justiça que expressamente refere:

«Assim, deverá o processado revelar a presença de pretensões formuladas por um sujeito processual que sejam manifestamente infundadas, abusivas e reveladoras de violação do dever de diligência que dêem azo a assinalável actividade processual. Mas para fazer essa avaliação é de exigir ao juiz muito rigor e critério na utilização desta medida sancionatória de modo a salvaguardar o direito das partes à defesa dos seus interesses pela via processual limitando o seu uso a situações que tenham efectivamente, algum relevo na normal marcha processual [[3]].

«Somente em situações excepcionais em que o sujeito aja de forma patológica no desenrolar normal da instância, ao tentar contrariar ostensivamente a legalidade da sua marcha ou a eficácia da decisão praticando acto processual manifestamente improcedente é que se justifica a aplicação da taxa sancionatória – por isso chamada – excepcional. O sujeito processual que não tenha agido com a prudência ou diligência devida é o que agiu contra disposição de lei expressa ou sem fundamento legal de forma imperceptível na sua pretensão, ou actuando com fins meramente dilatórios [[4]].

«É que, além do mais, à criação da sanção não são de todo estranhas razões de celeridade processual e bem assim de gestão útil dos fundos postos ao serviço da Justiça e suportados por todos os cidadãos contribuintes para as receitas fiscais. E à sua utilização deverá subjazer a patente falta de prudência a respeito da prática de certo acto e a falta de utilidade de que esse dito acto se revestiria importando um acrescido e injustificado atraso no desfecho do processo [[5]].

«Se é certo que com a taxa sancionatória excepcional se não pretende sancionar erros técnicos pois a sanção para estes sempre adveio do pagamento de custas, não é menos certo também que com a sua imposição se pretende reagir contra uma atitude claramente abusiva de utilização do processo sancionando o sujeito que intencionalmente o perverte com uma actuação imprudente, desprovida da diligência exigível e como tal censurável [[6]]».


[2] Disponível nas Bases Jurídico-Documentais do IGFEJ, em www.dgsi.pt, como os demais acórdãos que se citarem sem outra menção.
[3] Ac STJ de 2017.01.04, proc 149/05.3PULSB.L1-B.S1 como os demais citados infra consultável em www.dgsi.pt.
[4] Ac STJ de 2017.05.10, proc 12806/04.7DLSB.L2-A.S1.
[5] Ac STJ de 2017.06.08, proc 1246/05.0TASNT.L1-B.S2. 

[6] Ac STJ de 2019.05.09, proc 565/12.4TATVR-C.E1-A.S1.