O Acórdão já é conhecido: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 9/2011: «Verificada a condição do segmento final do artigo 80.º, n.º 1, do Código Penal - de o facto por que o arguido for condenado em pena de prisão num processo ser anterior à decisão final de outro processo, no âmbito do qual o arguido foi sujeito a detenção, a prisão preventiva ou a obrigação de permanência na habitação -, o desconto dessas medidas no cumprimento da pena deve ser ordenado sem aguardar que, no processo no âmbito do qual as medidas foram aplicadas, seja proferida decisão final ou esta se torne definitiva» [sublinhado meu, pois é o sentido essencial do aresto].
O que penso vale a pena acrescentar à sua aliás exaustiva fundamentação são três notas. Porque podendo parecer um problema técnico-jurídico traz no seu bojo uma questão de filosofia cívica, que se traduz numa ideia de sociedade.
Primeira, a acentuar o carácter polémico da questão, pois que esta corrente da liberdade está baseada numa ideia de que é a ideia de justiça que exige desconto de pena proferida em processo ainda não findo.
Segunda, a fazer notar porque se convocam reversíveis argumentos de celeridade e economia processual, quando se fundamenta o decidido com base na afirmação segundo a qual «o retardamento do desconto até ao momento em que se verifique, no processo em que o arguido a elas foi sujeito, a prolação da decisão final incrementa as situações de «desperdício» do tempo de privação de liberdade, em razão de medidas processuais, quer dizer, de esse tempo não aproveitar ou não aproveitar, por inteiro, ao arguido».
Enfim, como elemento de reflexão comparativa quanto ao que poderá ser a amplitude problemática da questão, a previsão pretendida para a matéria no Projecto [de 1963, Eduardo Correia] de Código Penal: «a prisão preventiva ou outra privação de liberdade sofrida pelo arguido, por causa de um facto por que venha a ser condenado, será tomada em conta na respectiva decisão de forma equitativa», prevendo o respectivo § 1.º que «se a condenação for, porém, em prisão, descontar -se -á nela o tempo que a prisão preventiva ou privação de liberdade sofrida tiver durado, salvo se isto beneficiar de forma injusta o réu».