Há na escolha de Joana Marques Vidal para o cargo de Procuradora-Geral da República o notável de ter-se aberto excepção ao previsível e derrogação ao previsto.
De há muito que a dança dos nomes tinha palco certo na comunicação social, os prós e os contras faziam da nomeação uma espécie de deve e haver do cálculo político.
Houve quem se prestasse a declarações ambíguas mas suficientemente interpretáveis como significando uma caução de boa conduta para o lugar. Houve quem desde há anos tivesse assumido pose de mando como se em ensaio geral de tiques para as cortesias palacianas que da função fabulava. Houve silêncios sem desmentidos de ambição.
A degradação começou quando já se dava como assente que iria ser escolhido alguém porque assim era certo poder financeiro com seguro garantido através do cargo, ou outro alguém porque a familiaridade com quem pode sugerir a escolha quando não é motivo é critério. O nojo chegou quando se punha em agenda o que seria conveniente através da escolha para os partidos no poder ou para os indivíduos que servem os círculos políticos que em Belém se concentram.
Enfim, surgiu quem ninguém esperava.
Não vou comentar da designada as virtudes nem sublinhar defeitos. Quanto aos segundos pois não conheço algum, quanto às primeiras porque fiz-me na escola dos que não elogiam magistrados, evitei na advocacia as alegações laudatórias, as que, incensando o espírito de quem as ouve, tentam obter complacência de quem a tal se presta. Não o faria aqui.
Conheço-a, e tenho com ela uma relação amistosa de há muitos anos, dentro dos limites da distância com que sempre privei com quem desempenha funções na Justiça e por respeito a esta.
Veremos ante os actos, quando eles surgirem o que poderei dizer.
Para já fica aqui uma palavra de profunda esperança e votos de boa sorte.
É que os tempos são de tal modo duros, o poder está de tal pulverizado, o desprestígio da Justiça é de tal modo grave que, ter aceite o cargo, é risco, inclusivamente vindo de alguns dos desapontados.
O problema do Procurador-Geral da República não é o Ministério Público, sim o que gira em torno do Palácio de Palmela.