Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Reclamação sobre extemporaneidade de recurso

«I – Deve ordenar-se a tramitação como reclamação para o presidente do tribunal superior da impugnação, por meio de recurso, de decisão que considera extemporâneo requerimento e motivação de recurso, desde que aquela impugnação seja apresentada no prazo de 10 dias previsto no artº 405º nº 2 do C.P.P.. II – Com efeito, nos termos do artº 688º nº 5 do C.P.Civil, aplicável ao processo penal por força do artº 4º do C.P.P., se, em vez de se reclamar de despacho que não admitir ou que retiver recurso, for apresentada impugnação recursória, mandar-se-á seguir os termos da própria reclamação, o que é de todo recomendável por razões de economia processual». Eis o que se decidiu no processo n.º 10645/05 3ª Secção, relator Vasques Diniz.

Cheque sem data: criminalização

Segundo o Acórdão da Relação de Lisboa de 12.01.06 [proferido no processo n.º 11331/05 9ª Secção, relator Almeida Cabral «Um cheque emitido sem data - ainda que verificados os demais requisitos constantes da Lei Uiforme relativa ao Cheque - e pese embora haver acordo quanto ao seu preenchimento posterior, não goza de tutela penal, nos termos do artº 11º do DL 454/91, de 28/12, na redacção introduzida pelo DL 316/97, de 19/11. II- Isto di-lo a própria LU no seu artº 2º:- ' o título a que faltar qualquer dos requisitos enumerados no artigo precedente não produz efeito como cheque, salvo nos casos determinados nas alíneas seguintes' (onde se não subsume nem enquadra o caso de entrega de cheque sem data). III- A falta de tutela penal para o cheque emitido sem data constitui um propósito do legislador - o que se extrai do preâmbulo do diploma (DL 316/97) - e que diz:- ' deixa de ser tutelado penalmente o cheque que não se destine ao pagamento imediato de quantia superior a (...) Pretende-se excluir da tutela penal os denominados cheques garantia, os pós-datados e todos os que se não destinem ao pagamento imediato de uma obrigação subjacente.' IV- Por isso, não obstante a conduta dolosa do arguido, ao impedir o pagamento do cheque, através de informação sobre o seu extravio dada à instituição bancária, certo é que o título creditício foi entregue pelo sacador sem data e não visava o pagamento imediato da importância nele titulada, pelo que não se mostra preenchido aquele tipo de crime (cheque sem provisão).»

Prescrição de processos crime

Segundo o site da Procuradoria Distrital de Lisboa, no ano de 2005: «1º Foram 91 os processos findos por prescrição, no Distrito Judicial de Lisboa, no ano de 2005, indicando-se 111 causas de prescrição. 2º Foi no DIAP de Lisboa que ocorreu o maior número de processos prescritos (cerca de 65% do total), seguindo-se em ordem decrescente os círculos judiciais de Almada e Sintra (cerca de 8%). Nos outros círculos, vai-se do zero (Círculos de Caldas da Rainha e Vila Franca de Xira), a 4 processos (Círculo de Loures). 3º A causa de prescrição mais mencionada foi a participação tardia (cerca de 56% do total das causas), a que se seguem, em ordem decrescente, outras causas (cerca de 27%) e atrasos nos órgãos de polícia criminal (cerca de 6%). 4º Os atrasos em magistrado do M.ºP.º são referidos quatro vezes, três delas no DIAP de Lisboa e uma no Círculo Judicial de Ponta Delgada. Fazendo-se aqui exercício comparativo dos últimos cinco anos, consigna-se que em 2001, foram 159 os inquéritos prescritos, com 221 causas mencionadas; em 2002 os inquéritos foram 104 e as causas mencionadas 133; em 2003 os inquéritos e as causas foram respectivamente 115 e 156; em 2004 os valores respectivos foram de 123 e 148».
Extraindo conclusões sobre os dados, diz-se ali: «1º - O fenómeno das prescrições do procedimento criminal, em processos de inquérito, situa-se em valores aceitáveis. 2º - Para um universo de mais de 200.000 inquéritos iniciados por ano, no Distrito Judicial de Lisboa, constatar que tão só em 91 ocorreu prescrição do procedimento criminal, consente evidenciar que o Sistema de Justiça dá bastante boa resposta. 3º - A causa de prescrição de maior referência é a participação tardia, causa esta que está além da possibilidade de resposta do Sistema de Justiça. 4º - No âmbito do tema em análise, o Distrito Judicial de Lisboa, sem dever afirmar que tudo corre na perfeição, evidencia evolução positiva e sustentada».

Prazo das escutas

O Acórdão n.º 4/2006 do Tribunal Constitucional [proferido no process. n.º 665/2005, relator Mário Torres], proferido em 3 de Janeiro de 2006 «não julga inconstitucional a interpretação conjugada das normas dos artigos 126.º, n.º 3, 187.º, n.º 1, 188.º, n.ºs 1 a 4, e 189.º do Código de Processo Penal, no sentido de que – desde que adequadamente assegurado o acompanhamento judicial da efectivação da operação – o prazo de duração das intercepções se conta a partir da data do início da sua efectivação, não é exigível a imediata elaboração de autos de início de gravação, nem de auto de gravação das intercepções após a gravação de cada uma das conversações interceptadas, nem a fixação de um prazo máximo rígido entre o fim da gravação (ou de fases dela) e a apresentação ao juiz do respectivo auto, e de que não é imposta a imediata desmagnetização das gravações das intercepções consideradas sem interesse pelo juiz; e não julga inconstitucional a interpretação das disposições conjugadas dos artigos 6.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro, e 187.º a 190.º do Código de Processo Penal, que não considera ferida de nulidade a recolha de imagens e voz que, apesar de ter sido judicialmente autorizada sem fixação expressa do prazo de duração, se processou e terminou sempre com efectivo e atempado controlo judicial da execução da operação».
Segundo o sumário deste aresto «I – O n.º 4 do artigo 34.º da Constituição permite, embora com carácter de excepcionalidade, a ingerência das autoridades públicas nas telecomunicações, impondo directamente como limitação tratar‑se de matéria de processo criminal e submetendo‑a a reserva de lei (mas não a sujeitando explicitamente a reserva de decisão judicial, como fizera no precedente n.º 2 quanto à entrada no domicílio dos cidadãos).II – Representando a intercepção e gravação de conversações telefónicas uma restrição a um direito fundamental, esta restrição deve limitar‑se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, sem jamais diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais (artigo 18.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição).III – No presente caso, não se questionando o respeito dos requisitos elencados no n.º 4 do artigo 34.º da Constituição (as intercepções foram determinadas no âmbito de um processo criminal visando a investigação de ilícitos que constam da enumeração legal dos crimes relativamente aos quais é lícito o uso deste meio de obtenção de prova, e todas elas foram, aliás, previamente objecto de autorização judicial), a eventual inconstitucionalidade das interpretações normativas impugnadas, todas elas reportadas aos termos em que se terá processado o acompanhamento judicial da execução da operação, apenas pode assentar em violação do princípio da propor­cionalidade aplicável às restrições dos direitos, liberdades e garantias.IV – Tem o Tribunal Constitucional entendido que a especial dano­sidade da intromissão traduzida pela intercepção telefónica impõe uma intervenção subs­tancial do juiz no decurso da mesma, através de um acompanhamento contínuo e próximo temporal e materialmente da fonte, acompanhamento esse que comporte a possibilidade real de, em função do decurso da escuta, ser mantida ou alterada a decisão que a determinou, subli­nhando, contudo, que o exigente critério assumido não significa que toda a operação de escuta tenha de ser materialmente realizada pelo juiz, posição que corresponderia a uma visão maximalista, que o Tribunal não subscreve. O que se exige é, pois, um acompanhamento próximo e um controlo do conteúdo das conversações, com uma dupla finalidade: (i) fazer cessar, tão depressa quanto possível, escutas que se venham a reve­lar injustificadas ou desnecessárias; e (ii) submeter a um “crivo” judicial prévio a aquisi­ção processual das provas obtidas por esse meio.V – Não é inconstitucional a interpretação conjugada das normas dos artigos 126.º, n.º 3, 187.º, n.º 1, 188.º, n.ºs 1 a 4, e 189.º do Código de Processo Penal, no sentido de que:a) o prazo de duração das intercepções se conta a partir da data do início da sua efectivação, e não da data do despacho judicial que as autorizou, mostrando‑se a dilação entre as duas datas justificada por dificuldades técnicas e de comunicação entre as diversas entidades envolvidas;b) não é imposta a imediata elaboração de autos de início de gravação, acrescendo que, no caso em análise, estes autos (aliás, legalmente não previstos) foram elaborados com dilações, justificadas por razões de ordem técnica, que não afectaram o acompanhamento judicial da operação;c) não é imposta a imediata elaboração de auto de gravação das intercepções após a gravação de cada uma das conversações interceptadas, não se podendo considerar como implicando um intolerável descontrolo judicial da operação a fixação em 60 dias da duração máxima dos períodos de escuta autorizados, mesmo que acoplada ao entendimento de que, se nada for judicialmente determinado em sentido contrário, é no termo de cada período de escuta, e não logo a seguir a cada conversação interceptada, que deve ser elaborado o auto de gravação;d) não é exigível a fixação de um prazo máximo rígido entre o fim da gravação (ou de fases dela) e a apresentação ao juiz do respectivo auto (cuja elaboração, após as alterações introduzidas pelo Decreto‑Lei n.º 320‑C/2000, de 15 de Dezembro, por ter de conter a indicação, pelo órgão de polícia criminal, das passagens consideradas relevantes para a prova, se tornou mais complexa e morosa), desde que os sucessivos prazos, quer entre os pe­ríodos de intercepções e as datas de elaboração dos correspondentes autos, quer entre estas datas e as datas de apresentação ao juízes de instrução criminal, quer entre estas últimas e as audições pessoais a que estes juízes procederam não se mostrem de tal forma di­latados que se possa questionar o respeito pela exigência do referido acompanhamento judi­cial, constitucionalmente exigível;e) não é imposta a imediata desmagnetização das gravações das intercepções consideradas sem interesse pelo juiz, devendo, pelo contrário, considerar‑se constitucionalmente inadmissível a privação da possibilidade de o arguido, as pessoas escutadas e a acusação virem a requerer a transcrição de passagens das gravações não seleccionadas pelo juiz, quer por entenderem que as mesmas assumem relevância própria, quer por se revelarem úteis para esclarecer ou contextualizar o sentido de passagens anteriormente seleccionadas.VI – Não é inconstitucional a interpretação das disposições conjugadas dos artigos 6.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro, e 187.º a 190.º do Código de Processo Penal, que não considera ferida de nulidade a recolha de imagens e voz que, apesar de ter sido judicialmente autorizada sem fixação expressa do prazo de duração, se processou e terminou sempre com efectivo e atempado controlo judicial da execução da operação».

Irrecorribilidade e os 8 anos: inconstitucionalidade

O Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 2/2006 [proferido no processo n.º 954/2005, relator Mário Tores] proferido em 3 de Janeiro de 2006 decidiu que «não impondo a Constituição um triplo grau de jurisdição (nem no artigo 20.º, n.º 1, para a generalidade dos processos, nem no artigo 32.º, n.º 1, especificamente para o processo criminal), não é inconstitucional a interpretação da norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, no sentido de que é inadmissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão condenatório proferido, em recurso, pelas Relações, que con­firmem (ainda que parcialmente, desde que in melius) decisão da 1.ª instância, quando, em caso de concurso de infracções, o limite máximo da moldura penal dos crimes, individualmente considerados, por que o arguido foi condenado não ultrapasse 8 anos de prisão».

Prazo para recurso penal: ainda sem as gravações

O Acórdão do TRibunal Constitucional n.º 17/2006 [proferido no processo n.º 383/2004, relator Mário Torres] de 6 de Janeiro de 2006 decidiu que «não julga inconstitucionais as normas constantes dos artigos 411.º, n.º 1, e 412.º, n.º 4, do Código de Processo Penal, interpretados no sentido de que o prazo de interpo­sição de recurso penal em que se questione a decisão da matéria de facto e em que se proce­deu a gravação da prova produzida em audiência se conta da data em que o arguido, agindo com a diligência devida, podia ter acesso ao suporte material da prova gravada, e não da data em que foi disponibilizada a transcrição dessa gravação».
Segundo o sumário desse aresto: «I – O critério seguido na jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a constitucionalidade de normas relativas ao início do prazo para apresentação do reque­rimento de interposição de recurso em processo penal, que deve, por regra, conter a respectiva motivação (ou ao início do prazo para apresentação da motivação do recurso, quando esta possa ser posterior à interposição, como sucede no caso de interposição, por simples declaração na acta, de recurso de decisão proferida em audiência), tem sido o de que tal prazo só se pode iniciar quando o arguido (assistido pelo seu defensor), actuando com a diligência devida, fi­cou em condições de ter acesso ao teor, completo e inteligível, da decisão impugnanda, e, nos casos em que pretenda recorrer também da decisão da matéria de facto e tenha havido registo da prova produzida em audiência, a partir do momento em que teve (ou podia ter tido, ac­tuando diligentemente) acesso aos respectivos suportes, consoante o método de registo utili­zado (escrita comum, meios estenográficos ou estenotípicos, gravação magnetofónica ou au­dio‑visual).II – Não viola o direito ao recurso em processo penal, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, o entendimento de que o prazo de interpo­sição de recurso em que se questione a decisão da matéria de facto e em que se proce­deu a gravação magnetofónica da prova produzida em audiência se conta da data em que o arguido, agindo com a diligência devida, podia ter acesso ao suporte material da prova gravada, e não da data em que foi disponibilizada a transcrição dessa gravação; na verdade, a transcrição tem por finalidade facilitar ao tribunal superior a apreciação, nos limites do recurso, da prova documentada, e já não habilitar o recorrente a elaborar a sua motivação, pois para este efeito lhe basta, para lá da assistência e intervenção em toda a audiência de julgamento e do conhecimento do teor integral da decisão condenatória, o acesso às gravações da prova produzida, sendo, aliás, em relação a estes suportes técnicos, e não à sua posterior transcrição, que devem ser feitas as especificações exigidas nas alínea b) e c) do n.º 3 do artigo 412.º do Código de Processo Penal». Como se vê, a diferença específica aqui é entre o ter acesso e o poder ter acesso. Claro que a linha de separação fica reportada ao caso concreto e aí é que nem sempre haverá uniformidade de critério.

Jurisprudência clandestina?

Como noticial o blog «Verbo Jurídico»: «Como pode ser constatado, nomeadamente por via da consulta à base de dados de jurisprudência do STJ no sítio do ITIJ, à excepção dos acórdãos de um Juiz Conselheiro, nenhum aresto das secções criminais do STJ ali deu entrada desde Julho de 2005». Segundo ali se noticia há uma razão para o facto: «os Juízes Conselheiros do STJ, das secções criminais, cansados de serem rotulados com tantos «privilégios» - decidiram deixar de sumariar e preparar os textos respectivos para ingresso naquela base e subsequente aproveitamento pelo Ministério da Justiça de trabalho alheio produzido de graça e nas horas de lazer dos respectivos autores». Eis a situação: acabou o Boletim do Ministério da Justiça, alguns acórdãos surgem em blogs privados, a louvável «Colectânea de Jurisprudência» é fruto de uma associação profissional, «os «sites» públicos estão à míngua de informação sobre jurisprudencial. Qualquer dia advoga-se, promove-se e julga-se às cegas: o que os tribunais decidem passa a ser um segredo bem guardado.

Abuso sexual com adolescentes, em livro

No dia 17 de Fevereiro de 2006, às 15 horas, na Sala de Convívio do Centro de Estudos Judiciários, realiza-se a apresentação pública do livro «Crimes Sexuais com Adolescentes. Particularidades dos artigos 174 e 175 do Código Penal», de que é autora a Dra. Maria do Carmo Silva Dias, juiz de direito, mestre em ciências jurídico-criminais e docente do Centro de Estudos Judiciários. O livro, publicado pela Almedina, é apresentado pelo Professor Doutor Manuel da Costa Andrade.

Advogado para PGR?

Um futuro PGR, quando tiver de ser escolhido, não deve ser um advogado, tem de ser um procurador. Ele é o vértice do Ministério Público. A política de camas separadas ainda é um grande princípio. Quando se não vive em comunhão de habitação, é higiénico não haver comunhão de leito.

Sonetos frios

Eu tinha dezanove anos e escrevia num jornal chamado «Comércio do Funchal». E por ter dezanove anos dei comigo, atrevido, a fazer um artigo para aquele aguerrido jornalinho sobre «A Justiça dos Pobres», a propósito do que se chamava então a «assistência judiciária». E não é que, por sugestão do advogado Ângelo de Almeida Ribeiro, fui para isso entrevistar o então desembargador Hernâni de Lencastre! Eu tinha dezanove anos e já entristecido com o que adivinhava ser o Direito, fiquei comovido pela grandeza sensível daquela alma, que me recebeu na sua casa, afável e disponível. Agora, morreu o advogado, morreu o juiz, eu já não tenho dezanove anos. O artigo lá anda amarelecido entre os caixotes dos meus papéis velhos, os que já nem leio. E não é que hoje, ao vadiar pelo Chiado, eu vi um livro de sonetos chamado «Reassumida Memória»!. Escreveu-o Hernâni de Lencastre. Dentro, alguém, guardou um recorte de jornal, com a notícia sobre a morte do seu autor. Estava ali tudo, numa banca de alfarrábios: o que fui, o que vi, o que já não volta, sonetos frios de uma memória reassumida, na forma de um poeta que era juiz.