Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Assentos e uniformização de jurisprudência: uma questão em aberto


Decisão judicial ou lei? Este era o núcleo problemático do instituto dos Assentos, sobre cuja natureza António Castanheira Neves escreveu a sua decisiva dissertação. Problema que de algum modo parecia reposto em novos termos antes os acórdãos uniformizadores de jurisprudência que tanto o processo civil como o penal acolheram. Mas é questão, afinal, em aberto.

Tirado em matéria cível, este, do Supremo Tribunal de Justiça, de 11.09.2014 [agora publicado na íntegra aqui] veio retomar o problema sentenciando que: «Não basta não se concordar com o entendimento de um acórdão uniformizador. Para decidir em sentido contrário é necessário trazer uma argumentação nova e ponderosa, quer pela via da evolução doutrinal posterior, quer pela via da actualização interpretativa.

Eis o passo essencial do raciocínio:

«Entre a rigidez interpretativa obrigatória dos antigos assentos e a mera natureza indicativa da jurisprudência em geral, está a jurisprudência uniformizada. Esta tem de ter um valor próprio que não se pode ficar pela mera sugestão (ainda que reforçada), hipótese em que perderia a razão de ser.
A regra só pode ser a de que a jurisprudência uniformizada não deve ser afastada pela mera discordância doutrinal do julgador, caso que não se distinguiria da restante jurisprudência.
A citação do conselheiro Abrantes Geraldes feita no acórdão em apreço resolve de forma lapidar a questão: “o respeito pela qualidade e pelo valor intrínseco da jurisprudência uniformizada do STJ conduzirá a que só razões muito ponderosas poderão justificar desvios de interpretação das normas jurídicas em causa (v.g. violação de determinados princípios que firam a consciência jurídica ou manifesta desactualização da jurisprudência face à evolução da sociedade)”. (...)  “a discordância, a existir, deve ser antecedida de fundamentação convincente, baseada em critérios rigorosos, em alguma diferença relevante entre as situações de facto, em contributos da doutrina, em novos argumentos trazidos pelas partes e numa profunda e serena reflexão interior” Ou seja, não basta não se concordar com o entendimento do acórdão uniformizador. Essa é uma questão ultrapassada. É necessário trazer uma argumentação nova e ponderosa, quer pela via da evolução doutrinal posterior, quer pela via da actualização interpretativa.

[...]
«Citando novamente Abrantes Geraldes – Recursos no Novo Código de Processo Civil, 379 – :

“Ou seja, a divergência ( com a jurisprudência uniformizada) não se justifica por si mesma, antes devendo ser encarada como um objectivo cujo alcance exige um percurso que, sem hiatos, tenha como ponto de partida a letra da lei e percorra todas as etapas intermédias.
Em suma, para contrariar a doutrina uniformizada pelo Supremo devem valer fortes razões ou outras especiais circunstâncias que porventura ainda não tenham sido suficientemente ponderadas.”»

Injustamente desimpedido!



Vivam todos quantos se preocuparam com a minha gripe, forma amável de se preocuparem com a minha pessoa! Pois o malvado bicho lá retornou às catacumbas da minha carcaça, soterrado a um cocktail explosivo de comprimidos que penso devem ter expurgado tudo quanto é ser vivo nas entranhas de mim. 

Semi-refeito cá estou agarrado ao remo da profissão. E sabem porquê? Passo a explicar citando a pertinente jurisprudência:


-» Acórdão da Relação do Porto de 01.06.2011 [texto integral aqui]: «As doenças dos mandatários só em casos limite em que sejam manifesta e absolutamente impeditivas da prática de determinado acto e, além disso, tenham sobrevindo de surpresa, inviabilizando quaisquer disposições para se ultrapassar a dificuldade, podem ser constitutivas de justo impedimento.»

-» 13.05.2008 [texto integral aqui]: «1. A notificação efectivamente expedida para o patrono da parte, ainda que comprovadamente após o falecimento desse patrono, é, todavia operante, face ao disposto no artigo 254.º , nº 4, ª parte do CPC.2. Constatado o decesso do patrono dos RR. antes da expedição da notificação do acto passível de recurso, impor-se-ia que o respectivo escritório diligenciasse pela imediata informação - e comprovação - do referido evento no processo, visando não apenas a suspensão da instância e inutilização do prazo, como a substituição do falecido advogado.
3. Não o tendo feito, e tendo a parte realizado a comunicação do facto para além do decurso do prazo do recurso, quando se demonstrou que o poderia ter efectuado antes desse momento, assim beneficiando do efeito mencionado na parte final do nº 2 do artigo 283 do CPC, o direito de recorrer foi precludido, sem que possa invocar o justo impedimento.»

Por isso, já que nem morto me livraria, cá estou. 

P. S. A propósito, o CITIUS ainda mexe?





O CITIUS e a máquina do tempo...

Enfim, foi achada a solução para o problema do CITIUS. A Senhora ministra tinha dado o mote: o regresso ao "antigamente". Bom fim-de-semana e haja humor, o possível.



Já nem a Vera...


Uma das maravilhas tecnológicas que o CITIUS prometia era a VERA. Rezava assim o anúncio:

«A Vera é a operadora virtual do GRAL. Ela ajuda a perceber qual o meio de resolução alternativa de litigios mais adequado ao seu caso concreto. Não se trata de um motor de busca em que pode procurar palavras. A Vera ainda está em aprendizagem (versão beta), pelo que a interacção com a mesma melhora a sua prestação. Além disso, todas as sugestões que nos queira enviar são importantes para o seu desempenho. Agradecemos a vossa compreensão e utilização.»

Pois, agora, clica-se e aparece, como uma chapada de despontamento, esta mensagem:

Not Found

The requested URL was not found on the server.

Juízes de número...



Comecei agora a receber notíficações e percebo que os juízes são numerados. Os tribunais são identificados por uma frase estranhíssima que culmina com um "J" a que se acrescenta um número.
É mais uma das realidades inauditas. Nem os juízes de linha! 
O magistrado que for o J7 poderá almejar a ser como o R7, o Cristiano Ronaldo, ou temer ser o R4, a carripana da Renault, Ele há coisas!

Espanha: a questão séria das vítimas


Convenhamos, até por se tratar do portal oficial do Ministério da Justiça de Espanha, que, pelo tom de pose galhofeira e de festa, não é propriamente a mais adequada imagem para dar conta da comissão de elaboração do novo Estatuto das Vítimas de Delito, cujos princípios gerais se podem ler aqui, com menção a outros documentos relevantes sobre a matéria.
Citando:

«El proyecto constituye un catálogo general de los derechos procesales y extraprocesales de las víctimas
Se considera víctima a toda persona que sufra un perjuicio físico, moral o económico a consecuencia de un delito, y también a sus familiares
El objetivo es dar una respuesta jurídica y sobre todo social a través de un trato individualizado a todas las víctimas, que serán evaluadas para atender las circunstancias de su caso
Derechos de las víctimas:
Podrán recurrir la libertad condicional aunque no estén personadas en el procedimiento si la pena del delito es superior a cinco años de prisión
Se les comunicará cómo acceder a asesoramiento legal y si lo solicitan se les informará sobre todo el proceso penal (fecha de celebración del juicio, notificación de sentencias y sobreseimientos, etc.)
Podrán requerir medidas de control para garantizar su seguridad cuando el reo quede en libertad condicional
Se reducirán al máximo las declaraciones, se procurará que sea siempre la misma persona quien hable con la víctima y que esta sea de su mismo sexo
Durante el juicio se evitarán preguntas innecesarias y el contacto visual con el infractor
Las víctimas de violencia de género serán informadas de la puesta en libertad de su agresor sin que lo soliciten, salvo que manifiesten expresamente su deseo de no ser notificadas
Se protege a los menores y personas con discapacidad necesitadas de especial protección con medidas específicas encaminadas a evitar una victimización secundaria:
Se suprimirán las declaraciones que no sean imprescindibles y podrán ser grabadas para reproducirlas en el juicio
Tendrá un representante legal cuando exista conflicto de intereses con los progenitores o representantes legales
Los hijos de la pareja fallecida o desaparecida se considerarán también víctimas.»

Continua o estado de Citius...


São 14:54, daqui a pouco mais de uma hora encerram os tribunais e termina o primeiro dia do novo mapa judiciário com as novas tecnologias, o epígono da desmaterialização. Era de prever. E aconteceu: clica-se e surge a mensagem:

Página temporariamente indisponível

Deu-se início ao processo de arranque do Citius nas 23 comarcas. Estima-se que nas próximas horas o sistema esteja operacional. O Portal Citius será disponibilizado durante o dia de hoje.

Comentários para quê? Tribunais há ainda carregados de obras, de lixo, de processos amontoados, de funcionários que nem sabem para onde ir, onde sentar nem o que fazer. 

Brasil: associação criminosa


Só agora é que o Direito Criminal Brasileiro tipificou enquanto tal e de forma específica o crime de associação criminosa. Segundo se noticia no mês de Julho «foi aprovado, na madrugada desta quinta-feira (11), no Senado, o PLS 150/2006, que vai tornar mais eficaz o enfrentamento às organizações criminosas com penas de três a oito anos. Antes, apenas os crimes de quadrilha ou bando, grupos constituídos por mais três pessoas, eram tipificados com penas de até três anos.»

Em rigor dizendo, até aqui a previsão legal naquele País distinguia a organização criminosa da associação criminosa, mas esta exigia para a sua caracterização a pertença de um número mínimo de três pessoas.


De facto, o § 1º, do art. , da Lei 12.850/2013 [ver o texto integral aqui] previa que: «Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.»

Enquanto isso, o artigo 288 do CP (alterado pela Lei 12.850/2013, art. 24) trata do tipo penal da “Associação Criminosa”, onde o mínimo para a sua configuração é de 3 pessoas ou mais e é aplicado às infrações penais cujas penas máximas sejam inferiores a 4 (quatro) anos. 

Transcrevendo: «Art. 288. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes: (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013) (Vigência)
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013) (Vigência)
Parágrafo único. A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de criança ou adolescente. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013) (Vigência)»

"Escuta" a Advogados


Com o Tribunal de Estrasburgo, defensor, diga-se, dos Direitos do Homem, a viabilizar a escuta num caso de terrorismo [ver aqui], também no Brasil a questão da licitude da intercepção telefónica da conversa entre o advogado e o seu constituinte está em aberto, agora no domínio do Direito Criminal Comum. Citando:

«Recentemente, tem se observado o vazamento dessas conversas gravadas, especialmente aquelas havidas entre o investigado e seu advogado, visando macular essa relação profissional de desconfiança pela sociedade em geral. Ainda que tal prática seja extremamente imoral, esse artigo se voltará para questão correlata de maior importância: Pode a conversa gravada entre cliente e advogado ser utilizada como meio de prova no processo penal?
Recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, datado de 27 de maio de 2014, nos autos do RMS 33.677 – SP, negou provimento ao recurso interposto por um escritório de advocacia que postulava pelo desentranhamento de interceptação telefônica onde foram captados diálogos havidos entre advogados daquele escritório com um investigado, tendo o tribunal justificado a manutenção daquela interceptação nos autos do processo sob o fundamento de que “não é porque o advogado defendia o investigado que sua comunicação com eles foi interceptada, mas tão somente porque era um dos interlocutores, não havendo, assim, nenhuma violação ao sigilo profissional”.Com a devida vênia, ousamos discordar da decisão proferida por aquela Egrégia Corte, uma vez que (...) [ler o texto integral aqui]

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