De que serve a hermenêutica para decifrar leis vindas de um legislador as escreve quantas vezes não sabendo escrever, entre conceitos vagos e imprestáveis e palavras que sendo as mesmas se contradizem, legislador de um enredado labirinto de previsões que se anulam e sobrepõem, revogam e abrogam e no tempo se aplicam em conflito permanente e são a porta aberta à taberna da discussão, à navalhada infame e aleivosa da interpretação em contrário, que surpreende de emboscada, do entendimento que numa penada modifica o sentir do que era tido por dominante opinião, trazendo insegurança ao pouco seguro, incerteza ao já incerto?
De que serve a dogmática como exercício mental para edificações abstractas e compendiais, monumentais torres davídicas de vaidade doutoral tão bacoca de barroca, a que falham fundações, edificadas sobre a lama da vida e suas palhotas, palácios exibicionistas sob palafitas em risco de desmoronar permanente?
De que serve a jurisprudência sem jurisprudentes, a legística de leis sem normas, o ordenamento jurídico num mundo sem ordem?
De que serve, na repartição pública da praxística, no salão forense onde se acumulam amanuenses copistas do já decidido mesmo que não decida, seguidores com idêntico como se fosse igual, eu estar para aqui a ruminar estas imprecações, sem moral que tenha nem exemplo que dê?
De que servem as poucas excepções, os desiludidos, a meia dúzia de optimistas, desejosos de um qualquer milagre que lhes devolva humanidade e lhes retire este mundo feio, sem lei nem rei?
De que serve o Homem ter inventado o primeiro dever para proteger o seu primeiro ter?