Está publicado o n.º 34 da revista Julgar, órgão da Associação Sindical dos Juízes Portugueses. O anúncio está aqui no portal da Associação. Os que, não sendo assinantes, estejam interessados na respectiva compra podem adquiri-la aqui. Nela publica-se o texto da ninha intervenção que já mereceu esta minha declaração de interesses aqui, o que não impediu que um determinado órgão de comunicação social, referindo-se ao evento e sem distinguir, amalgamasse as diversas ideias nele defendidas como se uma só se tratasse e ao serviço de uma determinada estratégia concertada. Sem comentários porque, por uma questão editorial, não comento neste espaço, temas que estejam no espaço mediático, com o devido respeito pelo mesmo, quando é devido.
«A Revista ultrapassa, neste número 34, os onze anos completos de vida. “Vida” em mais do que um sentido, porque não lhe tem bastado a sobrevivência, só encontrando sentido como espaço vivo de discussão jurídica, aberto e plural. Como, recentemente, se ouviu (na conferência organizada pela Revista, em 24 de novembro de 2017, na Casa do Juiz, sobre Direito da Insolvência), “a curiosidade jurídica não tem horizonte final e alimenta-se perpetuamente. Todos (…) temos uma vontade de aperfeiçoamento. A Revista JULGAR não é uma peça especial na complexa engrenagem pessoal e institucional que responde a esta necessidade. É apenas mais uma. Mas, como qualquer outro projeto semelhante, existe porque acreditamos que também ela pode contribuir com a sua parcela de luz”.
Alimentando esta ideia, propõem-se temas de grande interesse prático no caderno JULGAR, orientados para a sua dimensão de instrumento de trabalho. Mariana Coimbra Piçarra analisa o direito de retenção do promitente-comprador, um dos temas que maior discussão têm suscitado, na sequência da interpretação fixada no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência (STJ) n.º 4/2014. Ana Carolina Cardoso trata da mediação como um meio alternativo para a resolução dos litígios, deixando o seu olhar crítico sobre o papel ativo do juiz na tentativa de conciliação e apresentando um conjunto de propostas que visam proporcionar maior celeridade processual, designadamente a introdução da mediação no seio dos tribunais. Sofia Marques e Fernando Vieira trazem-nos um olhar médico sobre o sistema de interdição e de inabilitação, incluindo as suas limitações como resposta a uma situação de incapacidade, referindo os principais problemas do atual regime jurídico português nesta matéria e apontando, para futuro, o caminho da alternativa menos restritiva e da criação de novas medidas.
Publicam‑se, no caderno DEBATER, algumas das intervenções da conferência internacional “Tribunais Constitucionais: entre o Político e o Jurídico”, organizada no passado dia 30 de junho de 2017 pela Associação Sindical dos Juízes Portugueses e pela MEDEL – Magistrats Européens pour la Démocratie et les Libertés, com a colaboração da Escola de Direito do Porto da Universidade Católica Portuguesa e da ANESC – Academic Network on European Social Charter and Social Rights.
A especial natureza e papel dos tribunais constitucionais – órgãos a quem cabe apreciar atos políticos de acordo com critérios estritamente jurídicos – coloca‑os na linha da frente do combate pela independência do Poder Judicial. Muitas vezes olhados pelos demais tribunais como órgãos “politizados” (pela forma como os seus juízes são escolhidos) e pelo poder político como “força de bloqueio” sem legitimidade democrática (atenta a não eleição dos seus juízes), é especialmente nos momentos de crise que a independência dos tribunais constitucionais se revela essencial e mais é posta à prova.
No passado recente, em Portugal, esteve o Tribunal Constitucional na linha de mira quando foi chamado a pronunciar-se sobre as medidas de austeridade aprovadas pelo governo em cumprimento do programa de auxílio financeiro da chamada Troika e também aí foi alvo de críticas de todos os quadrantes: de um lado, aqueles que reclamavam uma maior intervenção e defesa intransigente do texto da Constituição; de outro, os que exigiam mais neutralidade e a ponderação de critérios de oportunidade e conjunturais na apreciação das medidas de austeridade económica. A intervenção do Tribunal Constitucional nesse período é analisada no texto do Mestre Pedro Coutinho (o qual, numa exceção à regra editorial desta revista, se opta por publicar também na sua versão original inglesa, por ter sido a língua na qual originalmente foi escrito, uma vez que se destinava aos participantes estrangeiros da conferência), que faz uma resenha dos principais acórdãos proferidos durante o período da austeridade económico‑financeira.
Os Professores Doutores Joaquim Sousa Ribeiro (que exerceu funções de Presidente do Tribunal Constitucional precisamente durante o período de austeridade) e Catarina Santos Botelho analisam seguidamente qual o lugar de um tribunal constitucional numa sociedade democrática e o papel que nela deve desempenhar, analisando e tentando traçar os limites da sua atuação no confronto dos demais tribunais e também dos restantes poderes do Estado, bem como as garantias que devem estar consagradas para a sua efetiva independência.
Antonio Narváez Rodríguez, juiz do Tribunal Constitucional de Espanha, procura depois definir com precisão, partindo da experiência daquele Tribunal Constitucional e da realidade espanhola, a natureza dos tribunais constitucionais – se órgãos judiciais ou políticos. É precisamente esta – a natureza dos tribunais constitucionais – a questão sobre a qual se debruça Guilherme Fonseca, apontando o seu papel central no funcionamento institucional do Estado e traçando o desígnio fundamental da jurisdição constitucional.
Como nos recorda a Professora Catarina Botelho no seu texto, vivemos numa época em que os textos constitucionais se tornaram crescentemente politizados, criando “expectativas constitucionais”, o que levou, nas palavras de Michel Rosenfeld, “a constitucionalizar o político e a politizar a Constituição”. Ora, numa altura em que se assiste a uma deriva autoritária e antidemocrática em alguns países do leste europeu que fazem parte da União Europeia – fenómeno até há bem pouco tempo inimaginável – e que tem passado precisamente pela tentativa de controlo dos tribunais constitucionais pelo poder político, é fulcral fazer o debate sobre as garantias de independência destes órgãos que estão no vértice da separação de poderes.
No caderno DIVULGAR, abrem-se as portas a um assunto da maior importância e atualidade do direito processual penal: o da natureza dos prazos de duração da fase de inquérito.
No n.º 32 da Revista, Cláudia Cruz Santos trouxe-nos um artigo intitulado “O controlo judicial da violação dos prazos de duração máxima do inquérito”, marcando uma posição muito clara a esse respeito. O debate é anterior, posterior e mais amplo do que aquela edição, claro está, tendo lugar em outras arenas. Em 19 de outubro de 2017, realizou-se, em Coimbra, uma conferência organizada pela Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados sobre a mesma matéria. Para além da autora já referida, participaram outros oradores de referência do direito processual penal, incluindo Germano Marques da Silva, José António Barreiros e Paulo Dá Mesquita, que enriqueceram o debate com diferentes percursos argumentativos e pontos de vista. Com grande generosidade, estes autores também aceitaram partilhar com a Revista o seu pensamento, permitindo um continuum enriquecedor entre os números 32 e 34, em tema de prazos de inquérito.»