Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




As contraordenações e a violência legal

 


Fico grato ao Forum Penal pela oportunidade de ter participado na passada sexta-feira, em Coimbra, no Congresso da Advocacia Penal. 

Incumbi-me do tema do ilícito contraordenacional, categoria em nome do qual se aplicam sanções punitivas de uma severidade que, tantas vezes, o Direito Criminal não atinge, isto apesar de aquele ter sido criado na forma de ilícito de "mera" ordenação social.

Durante o debate veio a tema a medida em que o legislador, ao qualificar como contraordenação o que assim evita denominar como crime, e ao relegar o respectivo conhecimento para um procedimento administrativo sem controlo judicial que respeite os princípios gerais que o Direito Penal e o Direito do Processo Penal garantiriam, ao fiar-se em que - e a expressão proveio há anos de um Conselheiro do Tribunal Constitucional - tudo está sujeito de um «controlo de constitucionalidade de baixa intensidade», tem assim nas mãos um sistema expedito e rentável que perpetuará sem o modificar. Os tribunais toleraram-no e servirem-no até aqui sem dúvida de consciência, tem uma medida suplementar de legitimação do esquema.

Mais: o Executivo que com tal beneficia em matéria regulatória, manterá, também porque aqui útil, um sistema normativo confuso, estruturado em normas de dupla remissão, uma delas para o processo das transgressões e contravenções - as quais era suposto terem sido banidas em 1979, mas que se mantêm, bem sabendo e não podendo ignorar quanta violência legal se comete através de tal expediente de cobrança reditícia.

O resto é o cortejo de ignomínias legalizadas que conhecemos: processo judicial em que o advogado é dispensável, discricionariedade judicial quanto à prova admissível, ameaça da "reformatio in pejus" para desencorajar quem deseje recorrer, recurso para a segunda instância sem que seja viável pôr em causa a matéria de facto, e tanto mais.

Sugeri uma lei quadro, que desse regulação e regulamentação efectiva ao corpo de questões substantivas e processuais que as exigem, e impedisse que, no âmbito sectorial, se violassem os seus princípios basilares, como até aqui tem sucedido, sempre na lógica do odiosa amplianda.

Dizem-me que os tempos não estão de molde a uma tal iniciativa. E eu que, vivi os anos de chumbo de um regime autoritário, cuja fisionomia pressinto regressar, acobertado no panfletário populismo justicialista, suponho que nada fazer é permitir que, por sobre o silêncio dos inertes, tudo seja feito.