Uma pessoa vai a um julgamento. A imprensa relata o que acha que lá se passou. Se às vezes não é assim, outras vezes não é bem assim e muitas vezes não é sequer mesmo assim. Isto quando as audiências são públicas e há testemunhas que podem ler o jornal e compararem atónitas o lido com aquilo a que assistiram.
As causa dessa disfunção mediática são conhecidas: desatenção, impreparação, vontade de fazer notícia aquilo que muitas vezes é o lado menor do que foi julgado e coisas piores que são a alma e o motivo de certas «fontes».
Nasce daí a chamada «opinião pública».
A concorrência feroz nos media lança-os na caça ao escândalo, nivelando-os pelo sensacionalismo! Os partidos da governação já não se distinguem, a comunicação social já se confunde. Mesmo alguma imprensa económica, que deveria ser uma referência de rigor e distância, segue na onda.
Ora os blogs, e falo dos jurídicos, ganharam o hábito de copiar o que vem proclamado nos jormais, raramente os desanimados desmentidos, muitos menos os que saem encafuados desprezivelmente como cartas dos leitores. Os seus fiéis, que são juristas na sua esmagadora maioria, tomam como referência o «post», como se o ter afixado a notícia num tal sítio a torne mais credível.
Chega então a vez dos comentadores, quantos anónimos. A coberto dessa máscara, tomando como certezas o que leram, largam a opinar quase sempre agrestes, reprovadores, ásperos no adjectivo, impantes no julgar dos outros.
Seguem-se os que opinam sobre os que opinam. O tom sobe de ardor e a linguagem desce de nível. Chegam quase a vias de facto, num ridículo pugilato de cegos, sem nome, sem referência, luta de pseudónimos virtuais.
Passadas umas horas muda-se de asunto. Passou o jornal da manhã, veio a notícia on line da tarde, mais logo é o zapping na televisão: o matadouro prossegue, em busca de sangue fresco e de mais cadávares.
Uma pessoa vai a um julgamento e corre o risco de ver-se maltratada na praça pública pelo que fez e pelo que não fez, por uma caricatura de si.
Quando o processo ainda é secreto para os interessados e esburacado para certos meios, é o que se imagina.
Mandam as regras que, ante o que se diz nos media sobre processos pendentes se fique de bico calado. A mesma lei que impõe o dever de reserva aos profissionais forenses, abre as goelas aos que propalam, aos que especulam, aos que caluniam.
É um sistema magnífico este, apto a achincalhar impunemente.
Chama-se a liberdade de expressão e a publicidade das audiências e é isto um dos pilares da democracia. Magnífico sistema que a democracia inventou para rebentar de vez com a democracia!