Apresentação



O presente blog foi criado em Janeiro de 2005. Está em actualização permanente, tal como o seu autor, que decidiu agora regressar ao estudo do Direito. Tem como linha de orientação não comentar processos ou casos concretos, menos ainda o que tenha a ver com a minha profissão, estando o meu site de Advogado aqui, nele se mantendo o mesmo critério. Estou presente também na rede social Linkedin e no Twitter.

José António Barreiros




Biblioteca Digital da Justiça

Deviam ser mais, muitos, mais acessíveis, os motores de pesquisa na área jurídica. A dgsi já é uma ajuda. Na lateral deste blog coloquei, além desse, um link para outros instrumentos de pesquisa. Através do Blog de Informação, do juiz Jorge Langweg soube desta Biblioteca Digital da Justiça. Aqui. Um dia se dirá: com este click vencerás.

A prova penal do interdito civil não é interdita!

A doutrina era controversa, e foi preciso ser o Tribunal Constitucional intervir para que definisse ser «inconstitucional a norma constante do artigo 131.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, aplicável por remissão do artigo 145.º, n.º 3, do mesmo Código, quando interpretada no sentido de determinar a incapacidade para prestar declarações em audiência de julgamento da pessoa que, tendo no processo a condição de ofendido, constituído assistente, está interdita por anomalia psíquica». Eis o que resulta do Acórdão n.º 359/2011 [D.R. n.º 190, II série de 30.10.11].
O núcleo problemático da questão tem a ver com a compatibilização da medida em que pudesse estar em causa a denegação do acesso ao Direito em função de um critério que - porque de aplicação mecânica já que automática - poderia não oferecer garantias suficientes de rigor. 
Um leigo terá dificuldade em compreender que um interdito - e o aresto, de que foi relator Cura Mariano contém uma longa explanação sobre o instituto da interdição - não esteja por isso mesmo e automaticamente privado de capacidade para intervir no processo penal, prestando nele declarações de ofendido. E um jurista terá tendência a aceitar que como lógica correlação de uma declaração de interdição não surja a incapacitação para testemunhar ou declarar. Eis onde o TC encontrou o problema: na insegurança desse automatismo. Ao limite como que tem afirma que um interdito por anomalia psíquica pode não estar, afinal, psiquicamente incapaz para depor com credibilidade, fazendo prova.
É daquelas sentenças de que, com todo o respeito, se dirá  - parafraseando Fernando Pessoa sobre a Coca Cola,  - que «primeiro estranha-se, depois entranha-se». Leia o texto aqui e tente alcançar porque é que, segundo os juízes do Palácio de Ratton «a proibição do ofendido em processo penal, constituído assistente, prestar declarações em audiência sobre a factualidade em julgamento  livremente valoráveis pelo julgador, quando se encontre interdito por anomalia psíquica, não encontra uma justificação bastante nas vantagens da adopção de um método objectivo de determinação das pessoas que, sofrendo de anomalia psíquica, podem prestar depoimentos credíveis em audiência, uma vez que, pelas razões acima explicadas, o critério adoptado revela -se inadequado para se obter uma escolha com o mínimo de rigor. Assim, a circunstância da vítima de um crime que sofra de anomalia psíquica ter sido objecto de uma medida judicial de interdição, que tem por finalidade a sua protecção, não pode servir como fundamento para lhe retirar direitos de intervenção no processo criminal. Seria acentuar a desprotecção da vítima, que já se encontra numa situação de especial vulnerabilidade pela sua deficiência, paradoxalmente justificada por esta ter sido colocada, por decisão judicial, sob um determinado regime destinado a assegurar a sua protecção. Daí que a limitação probatória resultante da norma sindicada se  revele desproporcionada, sacrificando injustificadamente o direito à prova e o direito a um processo orientado para a justiça material. Por esse motivo, se entende que a norma sindicada além de infringir o princípio da igualdade, na vertente da proibição de descriminação, também viola o direito a um processo equitativo, consagrado no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, devendo, por isso ser julgado improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público».

Intervalo

[excesso de trabalho, mas regresso ainda hoje, acreditem; há por aí muito para ler e dizer]

Reforma do processo civil: a Justiça e as Finanças

O Ministério da Justiça por despacho que sintomaticamente também o é do ministro das Finanças «nomeia a comissão da reforma do processo civil».
Segundo o dito a comissão é «presidida pela Ministra da Justiça, com a coordenação de João José Garcia Correia, advogado; vogais: António Abrantes Geraldes, juiz desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa; Armindo Ribeiro Mendes, advogado; Carlos Francisco de Oliveira Lopes do Rego, juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça; João Pires Cardoso Alves, procurador -adjunto; Júlio de Lemos Castro Caldas, advogado; Maria Gabriela Abrantes Leal da Cunha Rodrigues, juíza de direito; Paulo José Reis Alves Pimenta, docente do Departamento de Direito da Universidade Portucalense Infante D. Henrique e advogado; João Paulo Fernandes Remédio Marques, professor auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra; Miguel Fernando Pessanha Teixeira de Sousa, professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e advogado; Secretário — Sérgio Nuno Coimbra Castanheira, adjunto da Ministra da Justiça. 
A comissão desenvolverá os seus trabalhos por um período de quatro meses, com início em 1 de Setembro e termo em 31 de Dezembro de 2011. 
A reforma a empreender visa: a) A consagração de novas regras de gestão e tramitação processual, tornando, em regra, obrigatória a audiência preliminar, com vista à fixação, após debate, dos «temas controvertidos segundo as várias soluções plausíveis de direito» e das «questões essenciais de facto carecidas de prova»; b) A programação das diligências de prova em audiência final; c) A criação de mecanismos que visem conferir maior eficácia à segunda instância para o exame da matéria de facto. 
Vem tudo no Diário da República, 2.ª série — N.º 184 — 23 de Setembro de 2011. É o Despacho n.º 12714/2011.

Surge et ambula!

Advogado, Paulo Alves, lança o seu blog Iuris e Tanto. Aqui. Saúdo-o e a quantos ressurjam, porque é sinal que a blogoesfera se está a revitalizar. Blogs que estavam em letargia ganham força e vigor.
Espaço de discussão, de formação de opinião pelo saber ouvir a opinião dos outros, local de partilha de informação que de outro modo o sistema mediático e os meios institucionais não consentiriam, eis aqui o cosmos da liberdade.
Nem sempre é fácil alimentar um blog. Sobretudo quando a vida profissional é pesada e queremos viver outras vidas. Mas, no final, compensa. Não nos sentimos sós.

Reserva

Aprendi uma regra de vida: não comento como cidadão os processos judiciais concretos por uma questão de respeito [absouto] para com a minha [muito relativa] inteligência, pois não os conheço e não sei o que neles se passou, não o faço como advogado porque há uma deontologia que o proíbe e mesmo que não houvesse cada um tem a ética a que se amarra, não comento o que se conta deles na comunicação social, porque na pressa da notícia contentam-se com a apressada opinião.
Não falo na base do «a partir, é evidente, do pressuposto que» nem com fundamento em «a situação poderá configurar-se, é claro, em várias alternativas», nem arrimado no «isto, claro, em geral e abstracto», porque não quero armar-me em douto sendo ignorante, nem erudito quando afinal, evasivo e muitos menos velhaco, fingindo ser teoria o que afinal é casuística.
Tento não fazer figuras tristes. Por mais que certos casos apeteçam e se prestem à demagogia de ficar bem na fotografia do comentário populista.
O princípio antes calado que "traga-malha", aprendi-o em pequenino. De vez em quando com uma chapada a ajudar a interiorizar a ideia. Agradeço a quem mas deu e as que a vida me aplicou na cara.
Vem isto a propósito do caso judicial que envolve o Presidente da Câmara de Oeiras e todos aqueles que envolvem os mais insignificantes casos de vizinhança, os mais escabrosos casos de intimidade familiar, os mais sensacionais escândalos financeiros, que tudo comenta em todo o lado, dos programas televisivos para donas de casa aos jornais ditos de "referência". Ainda não se sabe com rigor o que se passou, nem eu [limitado de neurónios que sou] compreendi onde esteve o quê e o porquê, e já é um "cafarnaum" de encartados comentadores.
Não tenho nada a ver com o caso, nem sou sequer munícipe, nem gosto da criatura. Sei só que os princípios são isso mesmo. Não têm fim. Um bom sábado para todos. Por falar em fim, é fim-de-semana. E eu a ter de trabalhar. Isso sim, sem comentários...

OLAF!

Pode a OLAF, a Polícia da UE, abrir uma investigação a suspeitas de corrupção no funcionamento das instituições europeias? No interior da mesma a questão foi discutida e a resposta é sim. Lê-se tudo aqui. Tudo começou com o The Sunday Times, em Março de 2011.
Se o critério pega, o organismo vai ter muito que trabalhar...

Factos no RAI, sempre!

A tese de que o requerimento de abertura de instrução é um sucedâneo lógico de uma acusação ou pelo menos um seu equivalente faz sentido quando se trata da imputação de factos. Mas estando em causa a mera discussão jurídica sobre o fundamento de um arquivamento? 
O Acórdão da Relação do Porto de 06.07.11 [proferido no processo n.º 6790/09.8TDPRT.P1 – 1ª Secção, relator Araújo de Barros] decidiu que «mesmo quando o requerimento para abertura da instrução [RAI] formulado pelo assistente vise tão só a discussão de divergência quanto à classificação jurídica dos factos operada no despacho de arquivamento, continua a ser de exigir, sob pena de rejeição, que naquele requerimento seja feita a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena, bem coma a indicação das disposições legais aplicáveis».
E porque faz sentido esta doutrina? Porque ao arquivar um processo o MP [ao invés do que se passa com a acusação] não tem de elencar os factos pelos quais arquiva. Ou seja o arquivamento nunca goza do benefício de se poder saber o que é que se arquiva! Ilógico, mas lei!

Prazo para a queixa: seu termo

É Acórdão da Relação do Porto de 13.07.11 [proferido no 773/08.2TAVRL.P1 – 1ª Secção, relatora Eduarda Lobo], a resolver a aflição dos prazos, esse pesadelo para os Advogados:

«I – O prazo para o exercício do direito de queixa [art.115.º, do CP] é um prazo de caducidade, de natureza
substantiva, uma vez que ainda não existe um processo.
II – Tal prazo está sujeito à contagem do art. 279.º, do CC, pelo que se o seu termo ocorrer em domingo ou feriado, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte [al. e)].
III – O mesmo acontece se o termo do prazo ocorrer em sábado.
IV – A forma de contagem de um prazo, ainda que de natureza substantiva, em nada contende com a forma
de entrega ou remessa a juízo de peças processuais [art. 150.º, do CPC].
V – Se a queixosa optou por praticar o acto [apresentação da queixa] em juízo e por escrito, através da remessa pelo correio, sob registo, vale como data da prática do acto a da efectivação do respectivo registo postal [art. 150.º, n.º 2, al. b)]».

D de desistiram?

Mais blogs que estão suspensos ou que já anão regressarão. Agora [alguns] os da letra D:
Defensor Oficioso, desde Dezembro de 2010
Desfecha Clavinas, desde Novembro de 2007
Disintelligenstia Juridica, desde Outubro de 2007
Cada um que encerra ou suspende é menos debate, menos contraditório, menos tentativa de partilhar ideias. Em matéria de ideias, com quantas não concordo, mas a todos desejo que se exprimam.

O auto de fé

São inaceitáveis as manobras dilatórias, a chicana processual, o advogar manifestamente contra lei expressa. A possibilidade legal de o juiz condenar a parte como litigante de má fé existe, mas os tribunais têm disso feito uso moderado.
Rui Andrade, que é advogado, recorda aqui que:

«No momento em que se discute a necessidade de mais uma reforma do processo civil, não podia ser mais pertinente o estudo levado a cabo pela Direcção-Geral da Política de Justiça, realizado durante o ano de 2010 e tornado público no passado dia 3 de Maio, no âmbito do qual foi produzido o relatório “Avaliação do Impacto do Regime Jurídico da Litigância de Má-Fé”. Conclui-se, no referido estudo, que o instituto tem pouca ou nenhuma aplicação prática e que só em casos muito excepcionais, gritantes mesmo, os nossos tribunais a ele recorrem e que, quando o fazem, as multas aplicadas são tão reduzidas que não se revelam suficientemente dissuasoras das condutas que o regime pretende combater. Conclui-se, ainda, no estudo, que, pese embora poucos vezes aplicado, o regime vigente enquanto instituto jurídico dá resposta adequada às situações de má-fé que visa evitar, não carecendo, por isso, de uma intervenção imediata do legislador, excepto na revisão do limite máximo da multa aplicável».

E propõe que haja mais endurecimento na punição, um sistema mais musculado. E, inspirado no modelo americano [em rigor diz anglo-americano], sugere:

«E, nesta matéria, muito ainda temos de apreender com os modelos norte-americano e anglo-saxónico, os quais se revelam muito mais adequados aos imperativos de prevenção geral que a situação requer. A parte que litiga de má-fé, e nomeadamente que falseia a verdade procurando nela sustentar uma lide, tem imediato decaimento na acção, com as inerentes consequências ao nível das custas judiciais e incorrendo em responsabilidade perante a contraparte pelas despesas legais incorridas. Certo é que a mentira se tem vindo a revelar uma realidade tolerada nos tribunais portugueses, situação geradora de um sentimento de impunidade para quem mente, que em muito contribui para o descrédito da justiça a que hoje assistimos. Por isso, todos teríamos a ganhar com uma intervenção musculada ao nível da punição dos comportamentos que visam falsear, entorpecer e ludibriar o sistema judicial e a acção da justiça. Não através do aumento da multazinha, mas através da consagração do decaimento imediato da acção».

O estudo para quem quiser aprofundar o enquadramento da questão está aqui.
Por alguma razão a moderação judicial existirá. E - penso no processo penal - ante a cultura dos que acham que pulula um "excesso de garantismo" e que o próprio acto de recorrer quantas vezes já é uma manobra dilatória e colocar questões de constitucionalidade uma acção entorpecente - salvo, diga-se, nos processos em que são parte interessada porque aí há que esgotar os meios de acção e dilação... - seria este um bom sistema, o do auto de fé incinerando processualmente todos quantos? Temo.

O Acórdão do TC sobre remunerações

Confesso que não posso deixar de exprimir o que penso. Tenho visto os comentários de alguns magistrados ante a decisão do Tribunal Constitucional que viabilizou o diploma pelo qual o Governo reduziu a sua remuneração. 
A decisão padecerá da maior crítica. Não quero pronunciar-me sobre ela. Pode considerar-se que foi proferida com prevalência de critérios jurídicos duvidosos. Agora o que me fere a sensibilidade é ver magistrados que a comentam na praça pública do modo agreste como o fazem, pondo em causa a essência do órgão que a proferiu e afinal a honorabilidade dos seus critérios.
Poderá dizer-se que quando o fazem não estão a agir como juízes, sim como cidadãos.
Mas é um mau exemplo. Um dia uma decisão que profiram virá ser comentada na praça pública nos mesmos termos. Como já aconteceu, como aliás tem sucedido. E ouvirem dizer que deram prevalência a critérios políticos sobre jurídicos, a que agiram por causa do medo e com receio de serem prejudicados nas suas carreiras. E outras infâmias.
Não quero dar lições de moral. Vou só contar uma história.
Há muitos anos fui discutir ao Tribunal Constitucional o facto de um certo diploma legal [o Decreto-Lei n.º 28/84] estar ferido de inconstitucionalidade orgânica, pois que, tendo sido legislado ao abrigo de uma autorização legislativa dada ao Governo pela Assembleia da República, aquele, não só não tinha logrado publicá-lo na folha oficial dentro do prazo de vigência da autorização para legislar, como não tinha conseguido, dentro desse mesmo prazo, obter duas - duas, repito - condições que a Constituição considera requisitos sem os quais nenhuma lei existe: a promulgação do Presidente da República e a referenda do primeiro-Ministro.
Sabem como é que o Tribunal Constitucional decidiu? Através da extraordinária doutrina segundo a qual quer a promulgação, quer a referenda, não fazem parte do processo legislativo, são actos puramente políticos e que, portanto, bastava o Governo ter aprovado o diploma em Conselho de Ministros dentro do prazo para tudo estar conforme a Lei Fundamental. Fantástico não é?
Um polícia, com o qual me cruzei na escadaria da PJ, perguntou-me então se era eu o tal advogado que tinha posto em causa a constitucionalidade do dito 28/84. Ao ouvir-me confirmar, replicou «não me diga que estava à espera de ganhar! É que se ganhasse lá ia "ao ar" o decreto que permite perseguir todos os crimes económicos, ora!».
Calei-me. Não vi ninguém gritar contra este critério político que salvou o diploma legal. Pelo contrário todos os magistrados o aplicam como se nada fosse.
Percebo que este decreto lhes afecta directamente a remuneração, como sacrifica todos os que trabalham para outrem.
Optaram por esperar que fosse aquele Tribunal discutir o assunto. Nisso conferiram-lhe legitimidade. Agora que a decisão é aquela, desfavorável, reagem de um modo e com uma linguagem que seguramente não seria a mesma se tivessem ganho.
Moderação, pois, reserva e sobretudo exemplo!
Está em causa a nobreza da Justiça, a dignidade do Estado. Os magistrados ainda são o pouco que resta.

Justiça americana

Frequentemente ressurge a polémica sobre a Justiça norte-americana. Talvez pela influência das séries da TV ela exerce uma certa perversa sedução em alguns intelectuais. Muitos que chegaram vindos de escolas filosóficas em que a última coisa que se esperava seria esta hipnose por tal modelo. Mas compreende-se: o justicialismo mediático exerce o seu fascínio e faz esquecer os horrores de um sistema baseado num critério de selectividade - o labelling approach pelo qual criminosos são os que o sistema elegeu serem-no  - de transacção permanente - o plea bargain - e de completa (des)judicialização do sistema prisional, para não falar da pena de morte e da brutalidade policial.
Já se percebeu que sou irremediavelmente contra. Disse-o neste blog, ocasionalmente, e mais extensamente aqui, em Coimbra, depois de ter escutado um juiz de um tribunal superior norte-americano.

O ABC da blogoesfera jurídica

Eu próprio ia deixando morrer este meu blog.
Este fim de tarde fui dar um passeio pelos blogs que animaram o nosso espaço jurídico. E um sentimento de nostalgia invadiu-me. Algo se perdeu a presumir desânimo, falta de tempo, alheamento, desistência. 
Ei-los aqui, só os cujo nome começava pelas três primeiras letras do alfabeto, e omissões haverá, os que estão inactivos:

Absurdus, desde Março de 2007.
Abutere, desde Novembro de 2010
Antígona, desde Dezembro de 2010
Aprender Direito, desde Março de 2007
Assembleia de Comarca, desde Maio de 2010
Atrocidades, desde Fevereiro de 2008
Blog do DIP, desde Maio de 2006
Constituição e Jusfilosofia, desde Junho de 2010
Cruz Advogados, desde Setembro de 2010

Vale a pena passar por eles [clicando nos nomes, abre-se a ligação]. São memórias, de problemas que subsistem, de combates que se travaram, arquivo da luta pelo Direito por causa da Justiça [prometo seguir, alfabeto fora...].

Enriquecimento ilícito

De preferência ir à fonte. Porque os relatos muitas vezes são equívocos, erróneos, parcelares quando não distorcidos. Eis os documentos discutidos na sessão parlamentar sobre o enriquecimento ilícito, aqui. Quanto à discussão parlamentar, veja-se o vídeo aqui [procurar em «arquivo», no dia 23 de Setembro].
É que ao menos se discutam factos não impressões. Sobretudo entre juristas, em matéria de Direito.

Muito custam as custas...

Seria interessante termos dados sobre o volume de custas por cobrar. Eu, pelo menos, não os conheço. Uma coisa já se adivinhava é que iam ser aumentadas. Eis.
O Ministério da Justiça, no quadro da sua política de primado ao lado financeiro da Justiça, decidiu uniformizar o regime de custas. Que era um caos, sendo quase preciso tirar um curso superior para funcionar com o que estava em vigor.
Segundo o citado comunicado do Conselho de Ministros [que não vou comentar pois o que importa é o que sairá em concreto na lei não estes anúncios publicitários]: «propõe-se a aplicação das mesmas regras a todos os processos, para tornar o regime de custas mais simples e eficiente, contribuindo para a celeridade e transparência dos processos judiciais. Um regime uniforme permitirá a simplificação do trabalho daqueles que diariamente o aplicam nos tribunais, nomeadamente magistrados e, em especial, funcionários judiciais e advogados, permitindo ainda a sua compreensão por parte dos cidadãos e empresas que recorrem ao Sistema de Justiça».
Ao menos que acabe a confusão. Bom seria que o mesmo sucedesse em relação ao processo civil. E em todos os casos em que o legislador vai sobrepondo leis que vigoram em regime de concorrência no tempo, consoante a data de início dos processos. 
O comunicado refere o que a novidade significa acabar com a perda de tempo para quem tem de trabalhar com tais leis. Devia acrescentar e eliminar os erros que levam às anulações dos processos. É que esse ainda é o prejuízo maior. 
Li também algures que iam aumentar o custo das fotocópias dos processos! O comunicado do Conselho de Ministros não o refere. Por essas e por outras é que digo: só vendo a lei, porque de comunicados do Governo só vivem os jornais.
Já agora em matéria de fotocópias de processo, duas notas.
Primeira: veja-se o preço usurário a que se "vendem" cópias dos processos [falo do processo penal pois é o que conheço], aplicando a lei, claro, para que um advogado possa defender o seu constituinte, isto quando o Ministério Público as tem gratuitas. E a Constituição da República a falar pomposamente em «igualdade de armas entre o acusador e o acusado»!
Segunda: um certo organismo de que vou poupar o nome para dar ao sujeito em cujo escritório tinham apreendido documentos preparava-se para as cobrar ao preço de certidão! Imagina-se o custo com o qual o Estado lucrava com documento que, apreendidos apenas que estavam, não lhe pertenciam!
P.S. Um terceiro apontamento de que me esquecia: um organismo simpático em matéria de fotocópias do que apreendera sugeriu: tragam a fotocopiadora e umas resmas, porque [como se vivessem na retrete, perdoem, mas é o que isto merece] «já não há papel!

O Ministério da Justiça como agência financeira

Em regra fala-se mas não se lê; quando se lê é o que se escreve em segunda mão. Em vez de se ler informação lê-se comentários sobre informação que são, por vezes, desinformação. Eis o que a missão da troika consignou sobre a Justiça no relatório da sua última visita a Portugal, documento que pode ser lido na íntegra aqui.

«Judicial system. Recognizing the adverse impact of backlog cases, targeted measures are being developed on the basis of a June audit to resolve the backlog within two years. Implementation of the initial set of judicial reform measures is under way. However, the authorities indicated that the current financial and staff constraints may delay implementation of some measures. Understanding was reached that the authorities would focus on implementation of the measures critical to the efficiency of the judicial reform, including reforms to establish a more cost-efficient and effective enforcement regime, putting in place a sustainable court budget, promoting the use of alternative dispute resolution, and expediting resolution of backlog cases».

A única questão prioritária para a troika em matéria de Justiça resume-se numa palavra: que a Justiça renda dinheiro, custe menos dinheiro e permita que quem a ela recorra recupere dinheiro. O mais são problemas domésticos, a nível da segurança interna, casos de polícia. O Ministério da Justiça transformou-se numa Agência de Gestão Financeira da Justiça. Ponto final. A relação custo/benefício é o novo paradigma para o sistema.

Ofensa por publicitação da dívida

O administrador do condomínio afixou em lugar visível que o titular de uma certa fracção, cujo nome não individualizou, devia uma determinada quantia à administração do prédio. Agiu assim como forma de, por este meio, determinar o devedor ao cumprimento. O Acórdão da Relação do Porto, de 13 Julho 2011 [proferido no processo 6622/10, relator Luís Teixeira, divulgado pelo Jus Jornal] considerou que isso poderia integrar crime, de injúria e/ou difamação e recebeu a acusação. «Exigindo uma dívida através de um meio em que para além de se pretender cobrar a quantia devida se expõe o devedor publicamente numa situação vexatória, de humilhação, desnecessárias à boa cobrança da dívida, com certeza que se pode estar perante uma ofensa ao bom nome e honra da pessoa logo, pode estar em causa a prática de um crime», justificou..
Pergunto: e o Estado não afixa aqui a relação nominal dos devedores fiscais? Estará a difamar, impunemente?

Da oportunidade ao oportunismo

Vi e não queria acreditar. Os agentes de segurança vão, como medida de "indignação" «fechar os olhos às multas», ou o mesmo é dizer às infracções! O princípio da oportunidade que os juristas discutem se deve existir nomeadamente no Direito Criminal, permitindo às autoridades judiciárias a opção entre o que será perseguido e a gestão dos tempos da Justiça, como forma de adequar o resultado ao melhor efeito da política criminal, e que tantas polémica gera em torno de si, como excepção que é à regra da obrigatoriedade, que mais não é do que uma manifestação das bandeiras constitucionais da legalidade e da igualdade, esse princípio da oportunidade que é regra afinal comum a todo o Direito punitivo, dizia, é agora transformado boçalmente no princípio do oportunismo sindical. Creio que neste blog deveria ter uma palavra fria de análise técnica, pois foi para isso que o criei, mas só me ocorre esta: uma vergonha, a bandalheira feita regra!

A pedra

Aprendi que não se atiram pedras e se esconde a mão. A vida ensinou-me a insensatez de se generalizar. 
Em todas as profissões há bons e maus, sérios e desonestos. 
Ao ler esta notícia e mais esta pensei que talvez tivesse sido preferível antes de certas pessoas com responsabilidades terem lançado campanhas contra as profissões dos outros pensado um pouco melhor em ver especificadamente e com o propósito de agir no concreto o que se passava nas suas próprios casas.
Sou Advogado, filho de um solicitador. Respeito-me respeitando. Que se apure o que houver para apurar e puna quem tiver de ser punido. Para que os que lutam com honradez pela dignidade da sua profissão e tributam respeito a todos quantos trabalham na Justiça sintam o conforto de saberem que vale a pena continuar.

Sem lei nem rei

Num Estado de Direito um País governa-se através do Governo mediante o que se determina em leis. São elas que dão o sentido à política, definem os seus princípios, denotam a transparência do que se administra, permitem discutir nos tribunais o que for ilícito, demonstram se há igualdade ou favoritismo.
Portugal é uma República, pois não tem Rei, diz-se um Estado de Direito, porque é suposto viver sob a bandeira da legalidade.
Olhem, porém, para o Diário da República. Vejam o que saiu como legislação desde que este Governo é Governo. De verdadeiramente importante nada! Será que o Governo, que já não estará a banhos, governa com as leis dos outros do Governo anterior? Será que eram assim tão más mas não há que modificá-las? Ou será que se governa administrando fora da lei? Ou será que, fartos de leis, de sermos governados pelo "engenheiro", agora somos governados pelos regulamentos europeus, suas directivas, e memorandos da "troika", espécie nova a propor nas Faculdades, estas em crise de matéria, desde o seu encurtamento a  três anos, sob Bolonha: o Direito troikês?

FB no Estado, nein!

A proibição de os sites oficiais inserirem links para o Facebook começa a ganhar força política e corpo de lei. Tudo na Alemanha. A discussão jurídica levanta voo. Sobretudo em Itália.
Segundo uma circular ministerial, depois de um aprofundado estudo jurídicos chegou-se a conclusão que é absolutamente inoportuno que o FB seja utilizável por nenhum dos nossos sites governamentais pois podem pôr em causa a privacidade das pessoas e serem utilizados para fins comerciais e publicitários.
Ler toda a história, aqui, depois de uma notícia que a revista alemã Spiegel divulgou [ver aqui] e da qual a imprensa italiana se fez eco, como se vê aqui.

Difamação eucarística

Sinal dos tempos, o facto: «O anúncio, durante a eucaristía, de que o assistente não contribuiu financieramente para a Comissão festas, encerrando claramente um juízo de valor depreciativo acerca do carácter do assistente, é ofensivo da sua honra e consideração», sentenciou a Relação de Guimarães no seu Acórdão de 01.06.11 [relator Kuís Ramos], revela o JusJornal, citando o aresto na íntegra para os seus assinantes.

Justiça à venda

Para os que acham que os juízes deviam ser eleitos, para os que julgam que os interesses instalados não tentam contaminar o judiciário, para os entusiastas vendedores da Justiça à americana, com as suas oportunidades de acordo, é só ir desfolhando, ter paciência e ler em inglês. Tudo aqui. Interactivo.

O Ministério da Justiça em lipo-aspiração

Houve tempos em que me permiti, com ironia, escrever que o Ministério da Justiça era uma espécie de Ministério dos Equipamentos Judiciários e dos Monumentos Legislativos: construía e mobilava tribunais e encomendava Códigos a professores.
O ministro dito da Justiça respondia ante o Parlamento e nos jornais face a uma Justiça com a qual nada tinha a ver. O PGR de então, esse sim, era o vértice de todo o poder e condicionava a real Justiça que existia. Com inteligência de cabeça e frieza de alma. Um verdadeiro estadista.
Claro que houve tempos em que o Ministério da Justiça foi o Ministério das Leis e suas vírgulas, responsável pela coordenação da qualidade jurídica dos diplomas. Depois, o Dr. Santana Lopes, levou esse poder para a Presidência do Conselho de Ministros, com os resultados à vista.
Tendo sido o Ministério da Graça quando de um bem humorado ministro que jogava com a ironia verbal como malabarista com bolas e arcos, acabou por se transformar num lugar sombrio e soturno. 
Conheceu um momento de fama quando um ministro, que surgiu qual pato coxo chinês, fez o que quis dos magistrados e rematou o cargo tentando transformar a Boa Hora num hotel, negócio garantido como o Senhor Stanley Ho com o seu Hotel Lisboa em Macau, onde a casa nunca perde.
Entretanto, o Ministério apagou-se, perdendo importância. Tornou-se no chamado "Ministério que ninguém quer". Dali só "chatices".
Sujeito hoje à lei seca que a "troika" impôs à Nação para sustentar o Estado, teve de tratar da sua massa corporal. E eis o resultado: o Governo publicou hoje no seu site a lista dos organismos que vão ser extintos ou fundidos no quadro do programa de reforma do Estado.
No Ministério da Justiça, os organismos a extinguir são os seguintes: Direcção-Geral de Reinserção Social, Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, Controlador financeiro, Gabinete para a Resolução Alternativa de Litígios, Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça, Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça. Os organismos a criar são os seguintes: Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e Reinserção Social Instituto de Gestão do Ministério da Justiça.

A honra do "onoverole" Capo

É sentença da Corte Civil de Roma que absolveu o grupo editorial Espresso da acção que havia sido proposta por difamação, em 2009, por Silvio Berlusconi. Todo o texto aqui
Em causa um artigo publicado no jornal La Repubblica. O fundamento a defesa da liberdade de imprensa, do interesse público da satisfação do dever de informação, a liberdade de crítica e de crónica. Exemplar.

Só em caso de intempérie, e que assole...

Eu sei que não tem a ver com o Direito Criminal, matéria a que se dedica este blog, mas é só para que se perceba o andar sobre calhaus e em terreno pantanoso que significa advogar. Eis o que foi preciso ter sido decidido pelo Supremo Tribunal Administrativo, no seu Acórdão de 13 de Julho: «O prazo que termina quando o serviço de finanças competente se encontra encerrado, pela intempérie que assolou a Madeira, transfere-se para o primeiro dia útil em que reabriram os serviços».
Para o caso de a réplica do terramoto de 1775 arrasar todo o sistema judiciário, fiquem a saber quantos que o prazo se transfere para o dia que se seguir, nem que seja dia de defuntos!

Os insuportáveis recursos sem suporte

«Quando o recorrente pretende impugnar a prova, no âmbito do recurso que interpusera, finda a leitura do acórdão, requerendo, de imediato e com a devida diligência, cópia do respectivo registo fonográfico (conforme o artº 7º do DL nº 39/95, de 15 de Fevereiro), a contagem do prazo (30 dias) deve ser contado a partir da data da disponibilização das cópias da documentação do julgamento e não sobre o momento em que ocorreu o depósito da sentença» [Despacho de 09.09.11 do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 21/10.5PEALM-B.L1 9ª Secção].
E o que foi preciso batalhar para que se esteja a impor uma regra que pareceria, afinal, o bom senso em acção! É que havia quem entendesse que os advogados podiam recorrer sem ter com quê!

Magistrados abreviados

Vi ontem aqui no Cum Grano Salis a notícia de que o Conselho de Ministros haveria aprovado um diploma a prever a redução do tempo de formação dos magistrados que se encontram actualmente no CEJ. Pensei durante a noite se deveria comentar a notícia. Porquê a dúvida?
. Porque tenho receio de me adiantar em comentários a notícias que chegam assim por comunicados à imprensa, ainda que sejam do Conselho de Ministros. Já assistimos todos a a "notícias" e "informações" que geraram ondas de paixão e tudo terminou em vagas de desalento, porque, afinal, como diria o Alexandre O'Neill as coisas não eram em forma de assim...
. Porque ainda estou à espera [se calhar sentado---] que a ministra da Justiça venha explicar com detalhe do que se trata e porquê nesta do encurtamento judiciário, pois eu não vi nada referido que me permita saber o como e o porquê e acreditem que procurei.
3º. Porque não se percebe de facto porquê estes contemplados com a rifa da "passagem administrativa", e porquê "excepcionalmente". E já agora se serão os do "copianço", que tão expeditos se mostraram.
4º. E porque, enfim, há muito que estamos à espera que o Ministério da Justiça anuncie grandes medidas para os grandes problemas e afinal a primeira que surge é esta a dos magistrados "abreviados". 
Vou esperar pelas cenas dos próximos capítulos, mudo e quedo.
Na terra onde nasci nos intervalos de haver juiz "encartado" o Meritíssimo era o Senhor Relvas. Comerciante homem bom. E porque não seguir o exemplo? O Terreiro do Paço vai ali à Rua do Coliseu, à Associação Comercial, e com os lojistas desocupados da falida Rua dos Fanqueiros resolve o problema...

Pelas terras da Lei do Lynch

Já aqui alguém referiu as cantatas de elogio dos seduzidos pelas supostas virtudes do sistema de justiça penal dos Estados Unidos. Acho que basta ser espectador de TV - e eu de há muito que sou um muito relapso telepasmado - para se ficar com dúvidas de moralidade e certezas de inteligência. Num outro blog [aqui], onde guardo leituras de viagens por outros mundos, arquivei a recensão a um livro que os seduzidos devem ler, antes que sejam mentalmente estuprados na sua convicção.